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O Direito Processual Penal

Por:   •  19/6/2018  •  14.803 Palavras (60 Páginas)  •  282 Visualizações

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pg.19 Processo Penal 19

dica para um caso concreto e individuado, objetivou a Justiça (ou, ao menos, procurou solucionar o problema com justeza)? Pode fazer-se uma tentativa de dissolução problemática se o ra-ciocínio for desenvolvido exatamente a partir da oposição do caráter me-tafísico da categoria Justiça ao aspecto de (sempre potencial) concreção que encontramos na ideia do Direito. Servem a este propósito, segundo entendemos, as reflexões do filósofo estruturalista Jacques Derrida, en-contradas em seu ensaio Do Direito à Justiça13. Numa primeira aproximação à questão, Derrida alerta-nos para o erro do raciocínio de equivalência entre as duas categorias, pois, en-quanto o Direito é expressão de força, violência e forma, a Justiça é algo absolutamente inextrincável14. O Direito é um imperativo que se cumpre, sendo o caso, pelo uso da coerção e, não raras vezes, pela substantivação de atos de violência15, que não serão, no entanto, arbitrários, ilegítimos ou abusivos se forem cumpridos, de acordo com uma perspectiva puramente formal em que se examine o caso concreto, seguindo-se o que as regras positivadas na Lei dispõem para seu cabimento. Assim, o cumprimento de busca e apreensão dependerá de uma ordem emanada de autoridade judicial competente, que deverá decidir fundamentadamente objetivando os fins determinados pelo art. 240, do CPP; e, ainda, assim, delimitado por um juízo de adequação, necessidade e proporcionalidade, para que o ato não implique em indevida supressão de bens jurídico-constitucionalmente pro-tegidos. Quanto à Justiça, diz o filósofo franco-argelino, não pode ser objetivada ou tematizada por simples enunciados que traduzam o justo, sem se correr o risco de “trair imediatamente a justiça, senão o direito

pg20 Isaac SABBÁ GUIMARÃES 20

Sua condição, na ordem das ideias, é a de alta abstração e, certamente, os conceitos de justo que elaboramos no curso normal de nossa vida não encontram uma determinação unívoca, quer quanto aos nossos interlocu-tores, quer quanto aos diferentes momentos em que os pronunciamos: ao invés, a concretização de um ato jurídico pode, consoante a circunstância em que for analisado, ser depreendida tanto como injusta quanto como justa. Mas, então, deveremos considerar Direito e Justiça duas categorias com órbitas que jamais se cruzam? Derrida alicerça uma solução para o problema na ideia de des-construção, afirmando que o Direito é desconstruível porque suas cama-das textuais passam por interpretações e transformações17, que se imbri-cam, podemos assim dizer, com a constans et perpetuam voluntas da Justiça, cuja autenticidade, nela mesma, já não será desconstruível18. O Direito desconstrói-se a cada caso concreto, em que o Juiz atravessa o ambiente de normas jurídico-positivas, em forma de regras e princípios jurídicos de caráter geral e abstrato, pelos métodos interpretativos, e constrói, em sua decisão, uma nova norma jurídico-positiva para um casoconcreto e determinado. Nesta operação, a circum-stantia do caso deci-dendo, ou seja, tudo o que anda à volta do problema jurídico, incluindo não só a subsunção do fato às regras do Direito pelo método silogístico (um equacionamento formal do Direito), mas, também, sua atestação por elementos metajurídicos (como os que apontam para a eficácia da norma, localizáveis na economia, na história, na tecnologia, na sociologia etc.), invoca a construção de uma norma adequada para o caso concreto, variá-vel segundo os estalões do fenômeno jurídico. Essa desconstrução do Direito guiada por aquele continuum,já será a substantivação da Justiça. Essa linha de raciocínio conduz Derrida a uma das assertivas dedissolução problemática, segundo a qual “O Direito não é justiça”, mas é elemento calculável, ao passo que a Justiça, incalculável, exige que se a calcule19. É o que se verifica ao investigar-se a justeza de uma decisão, para a qual o Juiz deve seguir uma regra de Direito, além de “assumi-la, aprová-la, confirmar seu valor, por um ato de interpretação reinstaura-dor, como se a lei não existisse anteriormente, como se o juiz a inventas-se ele mesmo em cada caso”20; resultando, portanto, numa norma que se produz dentro de margens de segurança estabelecidas pela práxis forense e pela hermenêutica.

Pg 21 Processo Penal 21

Daqui extrai-se uma nota de todo em todo característica às duascategorias que estamos aqui a escrutinar: a de que só se perceberá o Di-reito e o errado, o justo e o injusto, no mundo dos fatos – fatos com im-portância jurídica, que é naturalmente erigida em razão de valores con-sensualmente aceitos, ou já positivados no corpus iuris –, em que as situa-ções de conflito são evidenciadas, e as autoridades instituídas, exercendo o monopólio de realização do Direito, passam a atuar. Não é outra, aliás, a lição de Del Vecchio quando refere não ser possível pensar nos “predi-cados dejustoou deinjusto, deDireitoou detorto(o antijurídico), delícitoou deilícitoa menos que se os aplique a uma atividade”21. 1.1 DIREITO PROCESSUAL PENAL: A REALIZAÇÃO DA JUSTIÇA E DO DIREITO PENAL E A VIRAGEM PROBLEMÁTICA PROVOCADA PELO NEOCONSTITUCIONALISMO As inter-relações entre Direito e Justiça não são facilmente de-preendidas das positivações jurídicas (estabelecidas em normas legais ou nas decisões judiciais), de maneira que a fórmula de Derrida, segundo a qual o processo de desconstrução e reconstrução do Direito é já a expres-são de um continuum de formação da Justiça, parece ser a que mais razoa-velmente as explicam. Principalmente porque não exclui a vinculação ou a dependência entre as duas categorias. Mas a ideia de Justiça (vista aqui como categoria autônoma e contrastável) permanece inextrincável, de maneira que a aspiração de concretizá-la por meio do Direito parece ser mais plausível no plano das conjecturas metafísicas, restando, portanto, fadada a permanecer presa à densa teia do subjetivismo ou das asserções propostas pela philosophia perenis, enquanto a visão estruturalista do Direito está mais ao alcance do estudioso. E, de fato, não se pode pensar o Direito senão que lastreado por fundamentos que autorizam sua estrutu-ração positiva. Dessa forma, se a Justiça é uma ideia etérea, o Direito estará conformado em um ambiente social, equilibrando-se nos costumes profundamente arraigados na sociedade, em normas morais, no conjunto de valores éticos. Já será entendido, em razão disso, como uma instituição cultural que visa à realização de fins práticos, que se devem verificar na sociedade e em razão dela. O que justifica considerar suas manifestações

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