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Corrupção crise política e Direito Penal as lições que o Brasil ainda precisa aprender

Por:   •  14/11/2018  •  2.400 Palavras (10 Páginas)  •  360 Visualizações

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à demanda pelo efetivo controle da corrupção, e também como mecanismo de blindagem do processo penal contra eventuais tentativas escusas de seu comprometimento.

Também os órgãos e agentes públicos envolvidos na persecução penal parecem distanciar-se do papel então desempenhado por seus pares no caso Mensalão, assumindo em um contexto atual, mais politizado, um nítido protagonismo na tentativa de controle da corrupção, inclusive na esfera legislativa, por meio da propositura de normas de conteúdo eminentemente penal. Tem-se, assim, a proposta formal pelo Ministério Público Federal das denominadas “Dez medidas contra a corrupção”, que contaram com o apoio manifesto do julgador e de delegados responsáveis pela Operação Lava Jato e a adesão expressa

de mais de 2 milhões de cidadãos brasileiros, embora grande parte destes últimos não tenha chegado a ler ou não esteja apta a compreender o conteúdo técnico do texto proposto.

Diante dos dois procedimentos penais mencionados – Mensalão e Operação Lava Jato –, não há dúvidas de que houve uma importante alteração da percepção social sobre as práticas relacionadas à corrupção, evidenciando-se a necessidade de pôr fim ao “jeitinho brasileiro”, expressão que consolidou a corrupção como fenômeno cultural ínsito à nossa sociedade.(1) Independentemente de tal efeito positivo, cabe indagar, porém, que outras lições podem ser extraídas de ambos os casos e que, aparentemente, ainda não foram apreendidas pelo Brasil.

É possível identificar historicamente uma tolerância social da corrupção no Brasil, devida, em boa parte, à desigualdade e ao individualismo com o qual o Estado educou seus cidadãos e conformou o próprio interesse público. Tais fatores levaram à justificação aparente de uma cultura de burla, no âmbito de uma sociedade em que o direito era visto como favor, resultando em uma atitude de aceitação e impotência que permitiu, durante muito tempo, a conveniente estabilização social nesses moldes.(2) Nesse sentido, o próprio sistema jurídico funcionou historicamente mais como meio de proteção do Estado contra o ataque de particulares do que como instrumento de regulação estatal a serviço destes. A partir da década de 1980, porém, a divulgação pela imprensa de inúmeros casos envolvendo crimes cometidos por agentes públicos fez com que a sociedade deixasse de lado o mero conformismo em relação a práticas ilícitas antes tidas como inevitáveis na esfera da Administração para refletir criticamente sobre o sentido de cidadania e de gestão pública no âmbito democrático.(3) Finalmente, começou-se a perceber a concreta gravidade das implicações da corrupção, apta a prejudicar o desenvolvimento dos cidadãos, no que concerne às possibilidades de participação social efetiva e, assim, à própria manutenção das bases democráticas do Estado.

Nesse sentido, observa-se que, nas duas últimas décadas, o Brasil buscou aprimorar-se no estabelecimento de mecanismos de controle da corrupção, o que se coaduna, aliás, com o destaque econômico e social que o país vem assumindo no cenário internacional. A despeito dos merecidos elogios à evolução da estratégia político-criminal brasileira, verifica-se ainda nessa matéria a prevalência do Direito Penal, sob o prisma de um ideal de repressão cada vez mais rigorosa e, assim, pretensamente eficaz. Na prática, porém, os resultados de tal política criminal se apresentam pouco frutíferos, principalmente em razão da falta de coordenação com as outras esferas formais envolvidas. De fato, a média geral de condenações criminais por corrupção em todo o mundo varia entre 4% a 10% dos processos julgados, o que representa um porcentual bastante reduzido, mormente se for também considerada a enorme quantidade de casos que sequer chegam ao conhecimento formal do Estado, permitindo afirmar que o Direito Penal não representa um mecanismo eficaz no controle de tais crimes. Assim, embora a divulgação dos casos Mensalão e Operação Lava Jato seja pedagogicamente importante, no sentido de conscientizar a sociedade quanto à intolerância da corrupção, a comunicação social do desvalor das condutas corruptas a partir da aplicação do Direito Penal revela-se em geral muito pouco eficiente. Extrai-se daí uma primeira lição: Não cabe pretender transformar a realidade social em matéria de corrupção por meio do Direito Penal. Tal objetivo promocional, além de ser irreal, conforme demonstram as estatísticas, é apto a levar a um perverso quadro de demagogia político-social.

Sob tal perspectiva, no âmbito dos casos Mensalão e Operação Lava Jato chama atenção a especial notoriedade conquistada pelos magistrados envolvidos, alguns inclusive convertidos em ídolos nacionais. Tal fenômeno deriva do desencanto social frente à política, que acaba por levar a uma politização do Poder Judiciário e, assim, à cobrança de uma responsabilidade excessiva do juiz de Direito, de quem se passam a exigir respostas eficazes a questões que na verdade deveriam ser debatidas e solucionadas, a partir da mobilização social, no âmbito da política. Evidentemente, a despeito de ostentarem uma imagem heroica na percepção social, os representantes do Poder Judiciário não conseguem atender, por meio da mera aplicação do Direito Penal, a demanda por um maior controle de crimes complexos – como já afirmou o próprio julgador da Operação Lava Jato –, já que estes advêm em grande medida dos graves problemas presentes na estrutura da Administração Pública. E a essa conclusão já tinha chegado de forma intuitiva a sociedade brasileira, que embora tenha sido atendida em seu imediato desejo punitivo no caso Mensalão, permaneceu frustrada em suas expectativas concretas, restando patente que a repressão dos envolvidos na esfera penal não implica, por si, mudanças sistêmicas que previnam a ocorrência de novos episódios de corrupção.

Embora a intervenção penal se afirme tradicionalmente como meio por excelência no combate à corrupção, justamente em razão de sua simbologia – aos olhos da sociedade, um indivíduo exposto pela imprensa algemado, sofrendo privação de sua liberdade, soa mais adequadamente punido do que se lhe fossem aplicadas sanções de outros ramos do Direito –, é importante ressaltar que sempre o Direito Penal chega de forma deficiente e tarde demais, lidando com o fracasso: o dano já causado pela conduta criminosa à sociedade. Por isso, a chave para o efetivo enfrentamento da corrupção não está na punição (embora esta deva também existir), mas sim na prevenção. Sob a perspectiva preventiva, há que se abandonar a análise da corrupção exclusivamente sob a perspectiva individual do agente corrupto, considerado a partir de um estereótipo

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