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O Impeachment da Presidente Dilma e o Direito Financeiro

Por:   •  1/11/2018  •  2.475 Palavras (10 Páginas)  •  279 Visualizações

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Se assim não fosse, as dificuldades econômicas supervenientes à elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias não poderiam ser enfrentadas pelo Governo, pois, justamente em um quadro de escassez de recursos, é que se mostra preciso rever as prioridades entre fazer o superávit primário ou atender as despesas previstas em outras rubricas orçamentárias, que, provavelmente, deverão ter que sofrer uma equalização, à luz da nova situação fiscal. De todo modo, essa é uma decisão que pertence ao Parlamento, e isso foi preservado no caso concreto.

Ao contrário, a hipótese de condenar a Administração Pública à meta de superávit prevista em outro cenário, sem que o Poder Legislativo possa apreciar o tema à luz da nova realidade, significa subordinar o Estado brasileiro ao pagamento de juros ao setor financeiro, o que, parece óbvio, não é uma decisão que possa ser extraída automaticamente do ordenamento jurídico vigente sem a possibilidade de manifestação do Congresso Nacional para dar uma solução diferente para o problema.

Por fim, cumpre esclarecer que o fato de os decretos não terem sido numerados é juridicamente irrelevante, sendo prática há muito utilizada em relação a normas de fins concretos, e não normativos, como as que autorizam a abertura de créditos suplementares ao orçamento.

Por outro lado, ainda que assim não fosse, é preciso destacar que o Tribunal de Contas da União vinha admitindo o efeito retroativo da aprovação da norma que altera a meta primária, o que exige que a alteração da sua jurisprudência nesse sentido tenha efeitos prospectivos em nome da segurança jurídica.

É claro que os órgãos que analisam e julgam as condutas orçamentárias podem mudar a sua jurisprudência, recrudescendo a interpretação de normas e fatos em nome do maior controle das contas públicas. Tal fenômeno, denominado virada jurisprudencial, é também muito comum nos tribunais judiciais.

De outro lado, é preciso afastar a caracterização do crime de responsabilidade pela tomada de decisões para problemas difíceis que poderiam receber de cada um de nós, outro tratamento. Se não houvesse a modificação da meta primária, e a realocação de recursos em rubricas orçamentárias a partir da abertura de créditos suplementares, uma série de despesas legalmente autorizadas deixariam de ser pagas? Não sabemos. Mas as consequências dessas medidas são de responsabilidade da Presidente da República, que, em um juízo que lhe cabe, juntamente com o Congresso Nacional, de forma certa ou errada do ponto de vista político ou econômico, adotou iniciativas para prevenir esses riscos. Porém, é forçoso reconhecer que tais medidas encontraram amparo jurídico em precedentes adotados pelo TCU e pelo Congresso Nacional.

Cumpre ressaltar ainda que a decisão do Presidente da Mesa não aponta qualquer traço ou indício de favorecimento pessoal, ou de terceiros, nas condutas imputadas à Presidente da República, o que também dificulta sobremaneira a caracterização do crime de responsabilidade.

Maquiagem do orçamento colocando a despesa primaria como superávit nominal

A contabilidade pública, e também a contabilidade nacional, em um país de dimensões continentais como o nosso, com uma economia que cresce e já está entre as maiores do mundo, não é simples. Sejamos claros: é complexa. Extremamente complexa.

As restrições fiscais impostas pelas novas normas, associadas ao rigor da legislação, que contém sanções por vezes bastante severas para o seu descumprimento, bem como a crescente busca por maior transparência, acabaram por intensificar o uso da chamada “contabilidade criativa” no setor público. Na ânsia de cumprir as normas de finanças públicas, ainda que os números não sejam favoráveis, por vezes indicando em sentido oposto ao que se pretende, os operadores da contabilidade pública passaram a se aproveitar das brechas da lei, divergências na interpretação dos textos normativos, lacunas, flexibilidades e toda sorte de possibilidades, para “ajustar” os números aos interesses dos governantes, de modo a “fazer de conta” que os resultados foram alcançados tal como planejados. O que, constata-se, não é de grande dificuldade quando se trata de números gigantescos.

No sistema de planejamento da ação governamental brasileiro compete à Lei de Diretrizes Orçamentárias estabelecer as metas e prioridades da administração pública federal para o exercício financeiro subsequente (Constituição federal, art. 165, § 2º).

Vislumbrada a impossibilidade de cumprir a meta, realizaram-se, segundo as informações divulgadas pela imprensa, uma série de manobras contábeis, com a realocação de recursos entre as diversas rubricas orçamentárias, bem como operações contábeis e financeiras, de modo a fazer constar nos demonstrativos orçamentários o cumprimento da meta. Utilização de empresas públicas, bancos públicos de fomento, recursos do recém-criado Fundo Soberano, e até pedido para postergar aumento de preços de passagens de ônibus. Um verdadeiro arsenal de medidas paliativas que não resolvem o problema de fundo, mas apenas tentam contornar, adiar e alterar dados que não interessam ao governo divulgar.

Fato que chegou ao conhecimento público, especialmente a partir da divulgação, pelo Financial Times, do “Brazil’s monetary jeitinho”, denunciando as diversas medidas tomadas pelo governo com a finalidade de ajustar dados de crescimento do PIB, controle de inflação, cumprimento de metas de superávit e outras voltadas a “maquiar” os números da economia brasileira, de modo a torná-los mais palatáveis perante o mercado financeiro internacional.

Medidas como essa comprometem um dos mais — se não o mais — importante “ativo” de um país, que é sua credibilidade. Mais do que isso, a divulgação de informações imprecisas afronta o princípio da publicidade da administração pública, claramente expresso no artigo 37 de nossa Constituição. E o da transparência fiscal, que os artigos 48 e 49 da Lei de Responsabilidade Fiscal se esmeraram em especificar de modo preciso, detalhando a forma e os meios de divulgação de todos os demonstrativos e relatórios orçamentários e financeiros, tudo para tornar essas informações públicas, transparentes e confiáveis.

Todo esse esforço pode se tornar inútil com a concretização dessas manobras contábeis, pondo a perder, num único ato, a credibilidade que levou anos, talvez décadas, para ser construída, e poderá levar outro tanto para ser recuperada.

Operações de crédito em bancos

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