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Fichamento: Edward Carr - O Historiador e seus fatos

Por:   •  9/11/2018  •  2.837 Palavras (12 Páginas)  •  710 Visualizações

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... processo pelo qual um mero fato do passado é transformado num fato da história ... O que decidirá qual das duas coisas vai acontecer? Dependerá, acho, da tese ou interpretação - em apoio da qual o Dr. Kitson Clark citou este incidente - ser aceita por outros historiadores como válida e significativa. Seu status como um fato histórico dependerá de um problema de interpretação. _

...“os registros da história antiga e medieval são semeados de lacunas”. A história tem sido vista como um enorme quebra-cabeças com muitas partes faltando. Mas o problema principal não consiste em lacunas. Nossa imagem da Grécia no século V a.C. é incompleta, não porque tantas partes se perderam por acaso, mas porque é, em grande parte, o retrato feito por um pequeno grupo de pessoas de Atenas. Nós bem sabemos como a Grécia do século V era vista por um cidadão ateniense; mas não sabemos de como era vista por um espartano, um corintiano, ou um tebano - um persa, ou um escravo ou outro não-cidadão residente em Atenas. Nossa imagem foi pré-selecionada e predeterminada para nós, não tanto por acaso, mas por pessoas que estavam consciente ou inconscientemente imbuídas de uma visão particular e que consideravam os fatos que sustentavam esta visão dignos de serem preservados. ... todos os fatos conhecidos ... foram pré-selecionados para nós por pessoas que acreditavam nisto, que queriam que outros acreditassem, e uma quantidade de outros fatos em que possivelmente teríamos encontrado evidências do contrário perdeu-se irrevogavelmente. A mão morta de gerações de historiadores que desapareceram, escribas e cronistas, determinou, sem possibilidade de apelação o padrão do passado. “A história que nós lemos, embora baseada em fatos, não é, para dizer a verdade, absolutamente factual, mas uma série de julgamentos aceitos”.

... o historiador face à história moderna. O especialista em história antiga ou medieval tem a seu favor o fato de poder contar com um conjunto de fatos históricos selecionados através de um longo processo. ... “a ignorância é o primeiro requisito do historiador, que simplifica e esclarece, que seleciona e omite”. ... O historiador dos tempos modernos ... deve cultivar para si mesmo esta ignorância necessária ... Ele tem a dupla tarefa de descobrir os poucos fatos importantes e transformá-los em fatos da história e de descartar os muitos fatos insignificantes como não históricos. Mas isto é exatamente o inverso da heresia do século XIX segundo a qual a história consiste na compilação de um número máximo de fatos irrefutáveis e objetivos. ... O que andou errado foi a convicção nesta acumulação de fatos difíceis como fundamento da história, a convicção de que os fatos falam por si mesmos e que nós não podemos ter fatos demais. ...

O fetichismo dos fatos do século XIX era completado e justificado por um fetichismo de documentos. Os documentos eram sacrário do templo dos fatos. ... (Nenhum documento pode nos dizer mais do que aquilo que o autor pensava ... Os fatos, mesmo se encontrados em documentos, ou não, ainda têm de ser processados pelo historiador antes que se possa fazer qualquer uso deles: o uso que se faz deles é o processo do processamento.

... O que nos dizem estes documentos? ... Os documentos não nos contam o que aconteceu, mas somente o que quem escreveu pensou que aconteceu, ou o que ele queria que outros pensassem, ou talvez o que ele próprio queria pensar que tivesse acontecido. ... Naturalmente, os fatos e os documentos são essenciais ao historiador. Mas que não se tornem fetiches. Eles por si mesmos não constituem a história; não fornecem em si mesmos respostas pronta a esta exaustiva pergunta: “Que é história?”

Neste ponto eu gostaria de dizer algumas palavras sobre porque os historiadores do século XIX eram em geral indiferentes à filosofia da história. ... O século XIX foi, para os intelectuais da Europa ocidental, um período confortável, transpirando confiança e otimismo. Os fatos eram em conjunto satisfatórios; a inclinação para perguntar e responder questões difíceis sobre eles era respectivamente fraca.

Nos últimos 50 anos muitos foram os trabalhos sérios feitos sobre a pergunta “Que é história?” Partiu da Alemanha, ... abalar o confortável reinado do liberalismo do século XIX à doutrina de fatos na história. ... Antes da passagem do século, prosperidade e confiança eram ainda grandes demais na Inglaterra para que qualquer atenção fosse prestada aos hereges que atacavam o culto dos fatos. Mas logo no princípio do novo século ... Itália, onde Croce começou a propor uma filosofia da História que obviamente devia muito aos mestres alemães. Toda história é “história contemporânea”, declarou Croce, querendo assim dizer que a história consiste essencialmente em ver o passado através dos olhos do presente e à luz de seus problemas, que o trabalho principal do historiador não é registrar mas avaliar; porque, se ele não avalia, como pode saber o que merece ser registrado? ... “os fatos da história não existem para qualquer historiador até que ele os crie”. _

A filosofia da história não é relacionada com “o passado em si” nem com “o pensamento do historiador sobre o passado em si mesmo”, mas com “as duas coisas em suas relações mútuas”. (Esta opinião reflete os dois significados correntes da palavra “história” -a pesquisa conduzida pelo historiador e as séries de acontecimentos passados em que ele investiga.) “O passado que o historiador estuda não é um passado morto mas um passo que, em algum sentido, está ainda vivo no presente.” Mas um ato passado está morto, isto é, sem significado para o historiador, a menos que ele possa apreender o pensamento que está por trás deste passado, desde que “toda história é a história do pensamento” e “a história é a revalidação da mente do historiador do pensamento cuja história ele está estudando”. A reconstituição do passado na mente do historiador está na dependência da evidência empírica. Mas não é em si mesmo um processo empírico e não pode consistir de uma mera narração de fatos. Ao contrário, o processo de reconstituição governa a seleção e interpretação dos fatos: isto, aliás, é o que faz deles fatos históricos. “História ... é a experiência do historiador. Ela não é ‘feita’ por ninguém exceto pelo historiador: escrever história é a única maneira de fazê-la ... Esta crítica aguda... revela certas verdades negligenciadas. ... Em primeiro lugar, os fatos da história nunca chegam a nós “puros”, desde que eles não existem nem podem existir numa forma pura: eles são sempre refratados através da mente do registrador. Como consequência,

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