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Os Negócios jurídicos processuais

Por:   •  11/12/2018  •  5.090 Palavras (21 Páginas)  •  247 Visualizações

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Em outras palavras, se o processo civil fosse um restaurante, estaríamos vivendo a mudança do consagrado sistema à la carte para um modelo de escolhas self service. Essa analogia é importante, sobretudo, quando se considera que num sistema self service o indivíduo não pode se servir do que bem entender. Ao contrário, as opções, ainda que variadas, se limitam àquilo que está posto ao alcance dos consumidores. Se há apenas rapadura no cardápio, não se pode exigir pé-de-moleque.

Nesse ponto reside o problema a ser enfrentado: em se tratando do tema negócios jurídicos processuais, quais são as opções ao alcance das partes? Que critérios podem ser usados para aferir uma manifesta situação de vulnerabilidade? Há relação entre a autonomia da vontade e os chamados direitos indisponíveis? As partes podem invocar o art. 190 para optar pela colheita de prova oral mesmo quando o juiz tenha decidido que tal prova é desnecessária[4]? Possivelmente as respostas dessas e de outras questões estão insertas - e também incertas – na atividade hermenêutica sobre o conteúdo da norma, demandando séria elucubração do assunto.

Sobre a importância de extrair o significado da norma, desta-se relevante trecho da obra dos professores Marinoni, Arenhart e Mitidiero:

Interpretar significa adscrever sentido a um texto ou a elementos não textuais da ordem jurídica, o que implica necessariamente o reconhecimento de sentidos mínimos com que as palavras são utilizadas, a valoração das razões que militam a favor e contra a adoção de determinados sentidos e a efetiva decisão entre significados concorrentes. A norma jurídica é o resultado da interpretação, não o seu objeto. Isso quer dizer que o empreendimento normativo é um empreendimento interpretativo que depende de reconstrução de significados a partir do trabalho do legislador, do juiz e da doutrina. (…) Aplicar o direito significa retirar consequências jurídicas da incidência de normas jurídicas em uma determinada situação jurídica – vale dizer, retirar consequências práticas no mundo normativo normalmente a partir de um caso concreto.

A adequada interpretação da norma, além de ser relevante para o direito como um todo, possui extrema importância para o tema em análise, porque somente assim será possível extrair boas respostas para as questões que surgirão a partir da cláusula geral de negociação (art. 190, CPC), como certamente será visto no decorrer dos próximos anos.

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3. JUSTIFICATIVA

É nítida a dificuldade da aplicação prática dos negócios jurídicos processuais na atividade forense. Tal fato se deve, de um modo geral, ao desconhecimento generalizado dos operadores do direito sobre esse instituto. A tendência, porém, é de que seja visto nos próximos anos uma utilização maior desse instituto, em razão da positivação da cláusula geral de negociação, prevista no art. 190 do Código de Processo Civil. Assim, com a nova regra, os particulares envolvidos poderão, desde que em consenso e observados os demais óbices legais, alterar o rito do procedimento com uma ampla margem de liberdade, determinando efeitos diversos, bem como estipular alterações no calendário processual e até mesmo modificar seus direitos e obrigações dentro do processo. Deste modo, é válido pensar que em algumas situações as partes possam, inclusive, afastar a própria vontade do juiz que dirige o processo, sendo este um dos motivos que demonstra a carência do amadurecimento do operador do Direito com relação à cláusula geral dos negócios processuais, exigindo dele um talento negocial para buscar novas e melhores soluções para o processo.

Talvez os negócios jurídicos processuais atípicos tenham uma maior dificuldade de aceitação na prática e na doutrina em razão da falta de critérios limitadores bem definidos, situação que causa estranheza às partes do processo, pois obriga os operadores do direito a pensar fora da caixinha, prática pouco comum na história do pensamento jurídico brasileiro, fortemente atrelado à ideia de legalidade em sentido estrito. Por isso, torna-se necessário que o direito também evolua, para que seja mais criativo e consiga lidar com diversas situações do cotidiano que reinvindicam uma solução jurisdicional. Se é verdade que o Direito Civil é a vida como ela é[5], o Processo Civil é o campo do Direito que busca resolver os problemas da vida. Mas isso não é tarefa fácil, demanda esforço e reflexão, observando a relação entre teoria e prática, entre ideias contidas nas obras doutrinárias e aquelas expostas nas fundamentações dos juízes em um intrincado sistema que se desenvolve aos poucos, com a contribuição de muitos. Marco significativo desse desenvolvimento ocorreu com a promulgação do novo Código de Processo Civil, que, apesar de ter criado alguns problemas procedimentais[6], trouxe muitas melhorias em relação ao Código Buzaid (Lei 5.869/1975). Destaca-se, como exemplo, a consolidação dos negócios jurídicos processuais atípicos, novidade que demonstra uma maior preocupação com a participação efetiva dos litigantes na condução do processo e visa à efetivação do princípio da cooperação, possibilitando às partes que formatem o processo em busca de meios mais eficazes do que aqueles contidos nas regras gerais previstas em lei. A proposta em análise se mostra muito relevante, tanto que na I Jornada de Direito Processual Civil, realizada pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ) em agosto de 2017 no Distrito Federal, foi objeto de três enunciados que tratam de importantes questões, como a aplicabilidade dos negócios jurídicos processuais no âmbito dos juizados especiais[7] e a possibilidade de sua realização por parte da Fazenda Pública[8]. Não há dúvidas de que a realização da dissertação pretendida se justifica pela sua relevância, sobretudo a partir da promulgação do novo Código de Processo Civil, afinal toda mudança de paradigma reclama, também, uma mudança de mentalidade. O atual diploma processual está vigente há apenas um ano e meio, e já apresenta várias questões potencialmente complexas a serem respondidas pela doutrina e jurisprudência.

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4. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A realização de negócios jurídicos cujo objeto sejam as normas processuais pode causar estranheza em um primeiro momento. Pela primeira vez a legislação processual civil concebeu uma

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