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A Responsabilidade Civil do Transportador Aéreo Quanto ao Extravio de Bagagem.

Por:   •  26/3/2018  •  14.706 Palavras (59 Páginas)  •  475 Visualizações

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Quando os europeus colonizaram a América, rezam os livros de história que as viagens marítimas duravam meses, muitas vezes custando à vida de boa parte da tripulação, por conta das precárias condições em que esse traslado era realizado. Não havia outro meio de cruzar oceanos e desbravar novas terras – e novos mercados – senão se aventurar em viagens que poderiam significar as mais diversas sortes de morte sem êxito.

Séculos depois, em questão de algumas horas podemos, de modo bastante confortável, passar de um continente a outro, sem que isso nos custe nada além de algum punhado de dinheiro. O que seria impensável até pouco tempo, e não precisamos ir a épocas tão longínquas quanto a citada para fazermos esta comparação, hoje é plenamente possível, graças à globalização, que atingiu graus extremamente elevados em todos os setores. O segmento dos transportes não se furtaria a acompanhar a evolução da humanidade nesta nova era.

Com a multiplicação das facilidades, no entanto, tendem a surgir novos problemas, como reflexo indesejado do progresso humano. Há, também, aspectos negativos da massificação dos transportes e viagens pelo mundo: com o aumento da oferta e demanda de viajantes, aumentam também as relações jurídicas entre transportadores e transportados, e, como consequência lógica, muito maior passa a ser também o número de conflitos entre esses dois sujeitos. Conforme os contratos e relações vão ficando cada dia mais complexos, é fácil a constatação de que as lides vão aumentando, e a necessidade de que a legislação as acompanhe é latente, sob pena de se instalar grave insegurança jurídica.

Um desses problemas, que, embora não seja o mais grave deles, acaba por ser um dos mais recorrentes, é o do extravio de bagagem. A logística das empresas aéreas, até os dias de hoje, acaba sendo falha em propiciar ao passageiro que sua bagagem o acompanhe e seja descarregada no mesmo destino de seu desembarque. A situação se mostra corriqueira, e capaz de ensejar diversos tipos de danos, em ocasiões de ordem variada.

O objeto do presente estudo é o de analisar a questão do extravio de bagagem sob a ótica da responsabilidade civil do transportador. Para tal, foi percorrida a doutrina acerca da responsabilidade civil, traçando um histórico do instituto, enumerando os tipos de responsabilidade civil e promovendo a análise da evolução da aplicação desta teoria, assim como foram buscados seus pressupostos e extensões.

Aprofundando nosso estudo, observamos que a legislação concernente ao transporte aéreo não acompanhou o fluxo do sociedade. É sabido que a lei é estática, ao passo que a sociedade está sempre evoluindo, o que demanda uma rápida atuação legislativa no sentido de dar efetividade às normas, para que elas sejam sentidas pelo corpo social, correspondendo à realidade. Em um segmento como o do transporte aéreo, esse mister do poder legislativo se torna ainda mais importante, pois a dinâmica se torna acelerada de tal forma que, em questão de alguns anos, o cenário das relações entre os sujeitos muda completamente.

Por isso, verificamos os diferentes regimes jurídicos que, ao longo dos anos, foram se acumulando no sentido de submeterem os transportadores aéreos a determinadas responsabilidades – Convenção de Varsóvia, Código Brasileiro de Aeronáutica e Código de Defesa do Consumidor – e percorreremos seu texto para perquirir, em cada um deles, quais são os direitos assegurados aos transportados.

Por fim, analisamos quais são as causas, principais e incidentais, que rodeiam a questão da análise de danos morais e patrimoniais decorrentes do extravio de bagagem, especialmente no que concerne à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

CAPÍTULO I - RESPONSABILIDADE CIVIL

- Contexto Histórico e Conceitos

- Abordagem Filosófica

Antes de iniciarmos qualquer discussão histórica sobre institutos jurídicos, é de grande utilidade perpassar pelos debates acerca do direito e da moral. Afinal, ambos os conceitos guardam correlação entre si, mas de forma alguma podemos encará-los como sinônimos. Trata-se de questão inerente à filosofia do direito, consubstanciando, por isso mesmo, uma de suas tarefas mais trabalhosas: estabelecer na mente do intérprete a diferenciação entre os institutos, ao mesmo tempo em que se deve impedir, contudo, que sejam enxergados de forma separada.

São questões relativas à ética, à forma pela qual os indivíduos agem, pelos comportamentos possíveis a serem tomados pelos sujeitos quando colocados perante uns aos outros. O ponto de partida para a dissecação do assunto, segundo Miguel Reale (2004), reside na chamada Teoria do Mínimo Ético, que é assim conceituada pelo autor:

A teoria do “mínimo ético” consiste em dizer que o Direito representa apenas o mínimo de Moral declarado obrigatório para que a sociedade possa sobreviver. Como nem todos podem ou querem realizar de maneira espontânea as obrigações morais, é indispensável que se impeça, com mais vigor e rigor, a transgressão dos dispositivos que a comunidade considerar indispensável à paz social. Assim sendo, o Direito não é algo diverso da Moral, mas é uma parte desta, armada de garantias específica[1].

Por essa teoria, nem tudo o que é moral está gravado de juridicidade, mas tudo aquilo que é jurídico certamente se pautará pelos ditames da moral. No entanto, essa teoria acabou por receber críticas diversas. A mais impactante delas leva em conta que algo que não está no campo da moralidade nem sempre será contrário a ele, ou seja, nem sempre será imoral, podendo também ser amoral, é dizer, que não faz diferença alguma ao conceito de moral.

O próprio autor levanta o exemplo dos prazos. Quais são os critérios para definição de prazos processuais, por exemplo? É a moral que pauta a escolha do transcurso máximo de cinco dias para oposição de Embargos de Declaração, por exemplo? São os parâmetros da moralidade que guiaram o legislador a eleger o prazo de quinze dias para a resposta do réu? Certamente que não. São critérios estritamente técnicos, que levam em conta simplesmente a praticidade técnica do dia a dia forense, mas que nem por isso se contrapõem ao conceito de moral – apenas não o incomodam.

Além disso, podem existir situações imorais que acabam por ser endossadas pela lei por razões de segurança jurídica, por exemplo: basta mirarmos na situação da prescrição. Em muitas culturas, é tranquilamente possível se afirmar que é imoral

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