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Recurso de multa

Por:   •  28/11/2017  •  2.371 Palavras (10 Páginas)  •  478 Visualizações

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Observa-se que tal fato é sumamente importante para o exercício célere da atividade administrativa, que tem a possibilidade de executar seus atos sem necessidade de autorização judicial. A execução é imediata, denotando o poder de agir e criar obrigações ao particular, de modo a realizar as ações previstas na Constituição e demais diplomas legais e concretizar a defesa do interesse público. Desta atribuição decorrem as seguintes consequências: o ato deve ser cumprido até ser decretado ilegítimo e a nulidade só pode ser decretada pelo Poder Judiciário se provocado para este fim.

No entanto, essa presunção, como não poderia deixar de ser, é juris tantum, ou seja, admite prova em contrário. Não fosse isso, toda a tentativa histórica de equilibrar o poder estatal com a defesa dos direitos dos cidadãos desmoronaria, já que os administrados estariam eternamente subjugados ao arbítrio da Administração.

Apenas a presunção de legitimidade pura não poderia servir para formar a convicção do julgador: a administração, ao menos em juízo, também poderia ser concitada a produzir provas de que o cidadão incorreu em infração, como explica Maria Sylvia: “a parte que propôs a ação deverá, em princípio, provar que os fatos em que se fundamenta a sua pretensão são verdadeiros; porém isto não libera a Administração de provar a sua verdade, tanto assim que a própria lei prevê, em várias circunstâncias, a possibilidade de o juiz ou o promotor público requisitar da Administração documentos que comprovem as alegações necessárias à instrução do processo e à formação da convicção do juiz”.

Se for levado em conta a presunção de veracidade dos atos da Administração Pública, vê-se que o administrado, muitas vezes, é obrigado a provar algo impossível, como por exemplo, a inocorrência de um fato, como pondera Gasparini, e a administração termina por vencer a lide, já que, em tese, nada precisa demonstrar. Esse entendimento é reflexo de um estado autoritário e absolutista, cujas ações são praticamente inquestionáveis; “os atos que deveriam ter presunção relativa acabam tendo presunção absoluta, porque não são conferidos/ garantidos meios para que o administrado possa provar a suposta ilegalidade” (GASPARINI apud LORO, Carlos Eduardo Pezzette. Presunção de legitimidade dos atos administrativos. Jus Vigilantibus, 14 fev. 2008. Disponível em http://jusvi.com/colunas/31549).

No caso em tela, como pode a requerente provar que estava parada apenas para desembarque de passageiro? Por mais que haja a presunção de legitimidade, deve-se ao menos ser assegurado ao cidadão a oportunidade de fazer suas alegações e, caso entenda necessário o julgador, fazer com que a Administração demonstre a veracidade do que alegou inicialmente.

Sabe-se que é importante a presunção de legitimidade dos atos administrativos no estado de direito; isso confere maior celeridade e efetividade para realização dos atos administrativos, o que beneficia a própria sociedade. No entanto, deve haver um meio de coexistência harmônica entre esse atributo e os Direitos Fundamentais Processuais do cidadão (ampla defesa, contraditório e devido processo legal), para que o mesmo não tenha seu patrimônio tolhido sem nenhuma chance de defesa, mormente pela presunção relativa (e não absoluta) desses atos.

Essa situação é bem ilustrada na aplicação de multa de trânsito. Assim como pode registrar corretamente a infração, ele é um ser humano passível de erros: pode anotar a placa errada, agir de forma incorreta, observar de longe e inferir infração que não ocorreu. Mas mesmo que tenha havido um erro (o que jamais poderá ser demonstrado, já que a condutora não conseguirá prová-lo), a declaração unilateral do agente vale mais que a da motorista, que invariavelmente terá que pagar a multa. Como Gasparini afirmou, para defender-se da multa o administrado teria que provar algo impossível, se não vejamos: multado por dirigir sem cinto de segurança o motorista teria que provar que, naquele momento, havia sim colocado o cinto; ou que não estacionou em local proibido naquele dia; ou que não avançou o sinal vermelho naquele horário, em cruzamento sem radar etc. Como provar tal situação? É impossível! Essa é, sem dúvidas, uma supressão disfarçada do direito de defesa do indivíduo, que tem o direito assegurado de interpor recurso para o departamento de trânsito e para a JARI (Junta Administrativa de Recursos de Infrações), mas a possibilidade de provimento é quase nula pela falta de provas. É como se voltássemos à Idade Média, quando havia tribunais apenas para fingir que o acusado teria um julgamento justo, embora desde o início já estivesse condenado.

Existem jurisprudências que entendem que a presunção de legitimidade não pode ser o único meio de prova da administração e que o direito de defesa do cidadão deve ser observado, especialmente por sua proteção constitucional: O juiz Renato Luís Dresch, da 4ª Vara da Fazenda Pública Municipal de Belo Horizonte, cancelou uma multa aplicada pela Bhtrans porque considerou que a simples declaração unilateral do agente da Administração Pública é insuficiente para a validade do ato administrativo.

“Não negueis jamais ao Erário, à Administração, à União, os seus direitos. São tão invioláveis, como quaisquer outros. Mas o direito dos mais miseráveis dos homens, o direito do mendigo, do escravo, do criminoso, não é menos sagrado, perante a Justiça, que o do mais alto dos poderes”. Lembrando uma passagem de Rui Barbosa, o juiz frisou a importância de se preservar a garantia dos direitos individuais.

O magistrado ressaltou que é um equívoco comum a afirmação de que o ato praticado por agente da Administração Pública produz prova por si só, e que, em razão da fé pública que emana do mesmo, cabe ao administrado o ônus da prova para a sua desconstituição. “Não há como impor ao administrado a produção de prova negativa, devendo a Administração Pública provar o fato, não bastando a mera afirmação do agente de trânsito”, concluiu.

Ele ainda esclareceu que somente quando o ato questionado for afirmado ou declarado pelo próprio administrado cumpre a este o ônus da prova. Por isso, vem agora a requerente fazer este questionamento.

Além da necessidade constitucional de proteger os Direitos Fundamentais Processuais do cidadão outro ponto justifica uma nova abordagem no que concerne à aplicação de multas de trânsito. Ora, sabemos que o papel desse agente é extremamente importante na organização do trânsito; seu trabalho visa essencialmente o interesse público, evitando acidentes, desembaraçando

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