O Direito Penal do Inimigo
Por: Rodrigo.Claudino • 16/2/2018 • 1.687 Palavras (7 Páginas) • 443 Visualizações
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Por outro lado, o autor define algumas condutas que possuem um caráter irreparável, logo, estes indivíduos seriam considerados inimigos. Cita-se como exemplo os casos de crimes sexuais, terrorismo e crimes econômicos. Ao ser caracterizado como inimigo, consequentemente o indivíduo não se adaptou ao comportamento exigido socialmente e será classificado como um não-humano, consequentemente, ao inimigo não é garantido as normas de direitos humanos.
Dessa forma, o inimigo por não interagir com o direito penal, e de certa maneira agir como em um direito natural (ius naturale) próprio, perde o seu status de cidadão e as garantias fundamentais do ser humano. Nessa toada, com o objetivo de tentar ilustrar a ocorrência da referida teoria no mundo prático, embora não seja implementada de maneira oficial, relembramos do início do nosso trabalho e toda a questão que envolveu e ainda envolve o terrorismo no mundo, nos debruçamos na análise dos crimes de tortura que são praticados em situações como esta e toda as estratégias argumentativas que poderiam legitimar a sua ocorrência guardando relação com a tese do direito penal do inimigo, direito este que é flexível e não pressupõe garantias processuais ou legais.
III – Estratégias argumentativas para legitimar a tortura
Reconhece La Torre quatro estratégias argumentativas dirigidas a legitimação da prática da tortura.
A primeira se baseia no poder soberano do chefe do Executivo, não há que se submeter a nenhuma prescrição exterior, sejam normas e tratados internacionais, sejam às próprias deliberações dos legisladores internos. Obviamente tal entendimento não se sustenta no Estado Democrático de Direito, vez que cabe ao Legislativo a função de controle e fiscalização dos atos do Chefe do Executivo, conforme a própria limitação da autoridade pública sobre os direitos e as garantias dos cidadãos, e dos mecanismos de controle como Checks and balances.
A segunda estratégia consiste em assumir aparentemente uma atitude descritiva, considerando a tortura como um mal necessário, um mal menor, e que já é realizada comumente. Assim, ao invés de sermos hipócritas ao não reconhecê-la, deveríamos criar mecanismos capazes de controlar o seu uso de maneira transparente e responsável. Aqui o caso seria simples porque mesmo que admitíssemos que a prática seja usual, o que particularmente não acredito, não devemos legaliza-la sob a argumentação de que seja natural, sem levarmos em conta o próprio ato em si, caso contrário poderíamos chegar a absurdos incomensuráveis, como a legalização de uma prática delituosa sob o pretexto de que rotineiramente ela é perpetrada.
A próxima estratégia se utiliza da filosofia utilitarista tendo como base o caso denominado de “ticking bomb”, isto é, situação na qual uma bomba pode detonar em pouco tempo, e no qual foi preso o terrorista responsável por prepara-la, sendo a única maneira de lhe obrigar a contar onde a bomba está implantada é por meio da tortura. Aqui se está diante da clássica ideia utilitarista de Bentham, que foi alvo de críticas ao longo do tempo, valendo citar apenas John S. Mill, o que significa em aceitar o próprio sacrifício de valores fundamentais como o da integridade e da dignidade.
Por fim, se apela weberianamente a ética da responsabilidade, se utilizando do mesmo problema do caso “ticking bomb”, mas agora o político é o responsável pela decisão e assume a reponsabilidade da mesma. Ora, a responsabilidade do político não pode ser outra que não sua submissão a moralidade e a legalidade a que qualquer outro cidadão se encontra obrigado. Não há motivo para a diferenciação pretendida entre o político e o cidadão.
IV – Conclusão
Os meios de legalização da tortura, prática que nem é preciso tecer maiores comentários usurpa e fragiliza qualquer garantia necessária ao Estado de Direito, vai desde através da pretensa definição débil do que é tortura, o que foi realizado conforme Massimo La Torre pela política do Departamento de Justiça dos Estados Unidos ( para quem somente se configura tortura quando há “ameaça iminência de morte” e de “dano psíquico prolongado”), até a própria extensão dos sujeitos detentores de direitos, e os que não fazem jus a gozar desses “benefícios”, conforme a Teoria defendida por Gunther Jakobs.
Querem, os que defendem essa prática, negar aos inimigos (declarados assim pelo poder Soberano) as garantias e direitos inerentes a todos os indivíduos da comunidade. Imediatamente podemos identificar, ao menos, dois problemas relacionados a legitimação dessa conduta.
A primeira é que após mais de um século de construção filosófica limitando o poder do soberano perante os cidadãos, o que construiu uma sociedade baseada na liberdade como respeito às leis não mais impostas por um soberano, mas fruto da própria representação dos cidadãos, pilares de instituições modernas como a República e a democracia, seria um retrocesso ao modelo no qual o Soberano poderá indicar àqueles que fazem jus ou não às garantias do Estado de Direito, se é que poderíamos assim chama-lo ainda, vez que há qualquer momento e sob qualquer pretexto ser alvo dessas arbitrariedades.
A segunda é a legitimação de prática visivelmente atentatória à dignidade humana perpetrada por agentes estatais sob o pretexto de a utilizarem como meio a consecução de um fim maior. Como ensina La Torre, tortura é por si só abuso e excesso. Não é possível que se coadune com o Estado de Direito e nem com o princípio da legalidade, não há controle possível, pois não é capaz de haver um “abuso de tortura”, ela por si só já
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