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A DESCONSTUÇÃO DO SISTEMA PENAL DE DROGAS

Por:   •  6/5/2018  •  3.326 Palavras (14 Páginas)  •  288 Visualizações

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Rogério Greco, com a precisão que lhes é peculiar, aduz:

O processo de seleção surge desde o instante em que a lei penal é editada. Valores de determinados grupos sociais, tidos como dominantes, prevalecem em detrimento da classe dominada. Em seguida, já quando vigente a lei penal, surge novo processo de seleção. Quem deverá ser punido? A resposta a essa indagação deveria ser simples, ou seja, todos aqueles que descumprirem a lei penal, afrontando a autoridade do Estado/ Administração. Contudo, sabemos que isso não acontece. O Direito Penal tem cheiro, cor, raça,classe social; enfim, há um grupo de escolhidos, sobre os quais haverá a manifestação da força do Estado (GRECO, 2016, p. 157)

Portanto, a seletividade penal nada mais é do que a consagração de que o Direito Penal não foi feito para todos. Mas para uma minoria que atende um estereótipo por ele proposto, ou seja, o Direito Penal escolhe quem ele quer punir, das quais geralmente são selecionados negros, pobres e favelados.

A partir disto, vamos voltar à lei 11.343/06 em seus artigos 28, caput e 33, caput respectivamente. Veja:

“Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I – advertência sobre os efeitos das drogas; II – prestação de serviços a comunidade; III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.”

(art. 28, caput, da Lei 11.343/06)

“Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar adquirir, vender, expor á venda, oferecer, ter em depósito, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.” (art. 33, caput, da Lei 11.343\06)

A observação inicial que se diz respeito às condutas típicas ora em negrito, percebemos que os verbos são idênticos, porém em relação à sanção perfaz uma grande diferença. Enquanto a conduta típica do artigo 28, caput referente ao usuário de drogas, temos uma mera pena restritiva de direitos (admoestação verbal, prestação de serviços e medida educativa); a imputação ao artigo 33, caput referente ao traficante de drogas, perfaz uma pena privativa de liberdade de 5 a 15 anos.

Por outro lado, em relação às conseqüências jurídicas as diferenças, ficam ainda mais gritantes. A nova Lei de drogas vedou qualquer possibilidade de prisão ao usuário de drogas (art. 28, caput), enquanto ao traficante de drogas (art.33, caput) sua conduta possui equiparação constitucional aos crimes Hediondos, das quais a pena passa a ser cumprida inicialmente em regime fechado.

Diante o exposto, podemos perceber que a Lei 11.343/06 oferece um tratamento bem mais brando em relação ao usuário de drogas (art. 28, caput) e enquanto ao traficante de drogas (art.33, caput) o tratamento é bem mais rigoroso talvez um dos mais rigorosos de todo nosso Sistema Penal.

A lei 11.343/06, segundo uma análise de orientação garantista, apresenta sérios problemas que não se restringem apenas ao texto legal, mas atingem a lógica que a fundamenta. Apresenta dois tipos básicos de criminosos: o usuário (artigo 28) e o traficante (artigo 30). Cada um caracterizado, no texto legal, com suas penas – o primeiro tendo que se submeter a uma série de atividades para “pagar” pelo seu erro; o segundo, submetendo-se ao cárcere, de preferência em regime inicial.

Cabe a nós, depois de tudo que foi explanado fazermos algumas reflexões.

Em um primeiro momento, percebemos que estamos diante de duas figuras típicas, na quais seus núcleos do tipo são praticamente idênticos, devido a isso como será o critério de diferenciação para a aplicação de uma conduta ou a outra? Essa diferenciação será justa? Quem será o responsável por este critério de diferenciação terá competência suficiente para tal?

A resposta será respondida, mediante mais uma reflexão.

Imaginemos o seguinte, duas pessoas A e B. O jovem A usuário de drogas, não trabalha, vive para estudar numa das faculdades mais caras da capital de São Paulo, o mesmo vem de uma família de classe média alta, na qual seus pais são empresários de renome na capital. Diferentemente vive a situação do jovem B usuário de drogas, morador da favela do Mangueiras no Rio de Janeiro, negro, pobre, trabalhador, todos os dias pega seu ônibus às 5 da manhã para pegar serviço às 8 da manhã no centro do Rio de Janeiro.

O jovem A está de férias na faculdade. Irá passar este período no litoral de São Paulo durante três meses o presente dos seus pais pelo bom desempenho nos estudos. Escolhe um dos carros de luxo de seu pai para fazer esta viagem, trazendo consigo a quantidade suficiente de maconha para curtir suas férias. Porém o mesmo e pego numa blitz policial rumo ao litoral. Pois bem, a sua conduta encaixa perfeitamente ao estereótipo do usuário de drogas presente no art. 28, caput, ou seja, possui escolaridade, não possui necessidade de traficar, além de uma invejável condição financeira.

Diferentemente é a situação vivida pelo jovem B, que passará o fim de semana na casa de seu primo na favela da Rocinha. Trazendo consigo a mesma quantidade de maconha do que o jovem A. Chegando a seu destino seu primo ainda não está em casa, porém ali estão presente os seus amigos da época de escola cumprimenta um por um indagando-os a que horas seu primo irá chegar. Seu comportamento observado por um policial militar, provavelmente irá induzir a sua classificação a traficante de drogas – estaria oferecendo drogas a eventuais consumidores.

A quantidade de drogas é a mesma, mas pouco importa para o Direito Penal que irá selecionar quem punir e pela visão estereotipada do mesmo certamente o jovem B, não terá igual sorte em relação ao jovem A. Advêm que o próprio Código Penal fortalece essa idéia de seleção, deixando a um critério subjetivo do Juiz a fixação da pena. Veja e reflita o artigo 59, caput do Código Penal:

Art.59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme

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