Prova Penal e Sistema de Controles Epistêmicos: a cadeia de custódia das provas obtidas por Métodos
Por: Rodrigo.Claudino • 30/3/2018 • 1.407 Palavras (6 Páginas) • 474 Visualizações
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Já no quarto capítulo, Geraldo Prado traz a luz uma discussão sobre os métodos ocultos da investigação. Ele comenta que, em um cenário de tensão entre a liberdade e segurança e sob a inspiração da retórica do risco, os Estados produzem normativas que acossam os direitos fundamentais visando ampliar os recursos a disposição da repressão penal. Diante disso, as pesquisas policiais são incrementadas com o emprego de métodos ocultos de investigação, autorizados judicialmente, com a interceptação telefônica e de e-mails, as escutas domiciliares e a infiltração de agentes, convertendo-se a prática em modelo de atuação preliminar. Em concordância com alguns autores citados por Prado, esta realidade cada vez mais presente debilita progressivamente o princípio de nemo tenetur (grifo meu) , já que praticas penais desse gênero tendem a violar o âmbito essencial da configuração da vida privada.
Ainda no quarto capítulo, Prado faz menção sobre a necessidade de deixar claro que a legalidade processual penal instaura um nexo funcional, no campo processual, equivalente ao que se verifica no direito material, evidenciando o fato das proibições penais terem como destinatárias a sociedade, enquanto a tipicidade processual penal dirige-se, na enorme maioria dos casos, aos agentes públicos responsáveis pela persecução criminal. O autor afirma ainda que esta simetria consiste em haurir os elementos constitutivos da legalidade penal para ambientá-los ao processo. Porém, concordo com Prado quando ele ressalta que o controle da legalidade que o juiz exercita sobre os métodos ocultos de investigação se estende a execução concreta das medidas deferidas judicialmente, não podendo ficar restrito ao exclusivo exame da legalidade da própria decisão.
Arantes (2006) apud Prado defende a idéia de que as técnicas especiais de investigação constituem medidas cautelares que tem por objetivo colher informações relevantes acerca da existência dos meios de provas dos fatos penalmente relevantes, protegendo-os contra o risco do desaparecimento em virtude do tempo. Prado complementa dizendo que as redes de garantias constitucionais formadas para assegurar o axioma nulla poena sina probatione (grifo meu) estaria em risco se desconsiderasse a possibilidade de manutenção de suportes, em regras digitais, que recepcionam o resultado das diligências executadas com base nas interceptações telefônicas, de e-mails, ambientais, infiltração de policiais e colaboração premiada. O autor ressalta ainda que a preservação de provas é concebida com remédio jurídico-processual contra o desequilíbrio inquisitório, caracterizado pela seleção e uso arbitrário de elementos pelas agências repressivas.
Por fim e evidentemente, essa resenha não teve a pretensão de esgotar a discussão que propõe, dada sua extensão e complexidade. Apenas procurou demonstrar que as iniciativas processuais conferidas ao juiz no processo - de um modo específico o poder instrutório - não comprometem sua imparcialidade, e portanto não são incompatíveis com um devido processo legal de índole acusatória, tampouco podem ser cunhadas, fundamentadamente, como anacronismo inquisitorial. Portanto, uma correta concepção do sistema processual penal exige uma perspectiva ampla e integradora: da Constituição escrita e da Constituição viva, real, que leve em conta tanto o ordenamento jurídico como a própria realidade social, enquanto experiência vivida e haurida da comunidade, visando não só evitar o grave inconveniente de um normativismo extremo e desconectado da nossa longa tradição forense e dos anseios da sociedade como um todo, bem como, de outra banda, servindo de necessário anteparo contra aqueles que exprimem ceticismo, senão negação, à efetividade da nossa Constituição, o que sempre importa em seu desprestígio, com graves danos para a proteção dos direitos humanas.
Somente essa compreensão política e jurídica, que leva em consideração a Constituição e a ambiência social em que estamos inseridos, poderá compor de forma mais harmoniosa as expectativas que estão em jogo quando da concreta aplicação da lei penal: a preservação dos princípios e regras que garantem os direitos fundamentais do indivíduo acusado; a situação da vítima, que, proibida pelo Estado de fazer justiça com as próprias mãos, tem a expectativa de ver uma efetiva resposta estatal à agressão sofrida; bem como a própria credibilidade na efetividade do Direito Penal, diante do anseio de todos por uma sociedade mais justa e segura.
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