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Processo penal I

Por:   •  9/11/2017  •  1.953 Palavras (8 Páginas)  •  534 Visualizações

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Nem vem com essa de: ‘Ah coitadinho dele’, ‘Nossa que triste’.. Nada disso! Isso tudo aí só significa que com o passar dos anos minha memória conhece alguém melhor que eu e dá o fora de mim. Droga de memória! Mas eu só quero ver se essa merda de Huntington será capaz algum dia de apagar aquele sorriso de mim, nunca! Jamais! E é aí que Sofia entra nessa história toda, aí que a droga de um sorriso que tinha tudo pra ser um sorriso qualquer transforma a minha vida para sempre!

É uma terça-feira fria, ao olhar pro lado percebo que Sofia cruza os braços meio que se dando um abraço, tentando inutilmente vencer a luta contra o vento gelado. Sinceramente não me recordo muito bem do que aconteceu nos segundos posteriores, só sei que agora o meu casaco está em volta dela e um sorriso bobo insiste em se instalar em meu rosto. Sorriso esse que por anos fora afastado de mim, mas isso é uma coisa que não se esquece e ele ainda estava lá, bem no fundo, um pouco mais abaixo da caixa de decepções, eu ainda sabia sorrir. São sete e dezoito da manhã e o fato de eu estar atrasado não me preocupa tanto mais. Pelos meus cálculos virando a próxima esquina a esquerda, do lado da Biblioteca Municipal, está o velho prédio cinzento onde passo oito cansativas horas do meu dia. Estou perto de ter que me despedir de Sofia, gostaria de estar errado nisso.

- Você é feliz?

Caramba! Ela poderia me perguntar sobre o trabalho, sobre minha história de vida, sobre minha música favorita ou então o que penso sobre a economia atual. Mas daí ela me faz a única pergunta no mundo do qual eu não saberia responder ou talvez não quisesse responder.

Nasci de uma família humilde do interior, mesmo tendo que ajudar meu pai no campo desde criança, ele nunca abriu mão dos meus estudos, ‘depois de colher o tomate vá fazer seus exercícios!’ - dizia ele, e lá ia eu cansado, já com os olhos fechando sozinhos, resolver uma equação sei lá das quantas que não vejo onde usar hoje em dia. Com dezessete anos entrei na Universidade pra cursar Administração, um tanto quanto contra minha vontade, mas quando se tratava das ordens de minha mãe eu deveria cumprir. Não que eu fosse inteligente, mas minhas médias eram satisfatórias e com isso já no meu quarto período fui chamado pra fazer um estágio numa empresa de RH local. E é quando você pensa que sua vida está boa e que você é feliz, que as coisas começam a tomar um rumo diferente. Naquele mesmo ano, em julho pra ser mais exato, um degrau de minha escada se quebra, minha mãe se vai, droga de câncer! Tive que trancar a faculdade pra ajudar a renda de meu pai, pois logo após a morte da mãe fiquei sabendo que eles fizeram um empréstimo no banco pra pagar meus estudos e com o dinheiro do estágio não seria suficiente, estávamos perto de perder a casa, droga de banco! Mas com o tempo conseguimos nos restabelecer eu e o pai, fazíamos o que podíamos e o que não podíamos pra manter a dívida quitada e estávamos indo bem, consegui retornar a faculdade até, mas lembre-se: quando você pensa que sua vida está boa e que você está feliz? Pois é, as coisas tomam um rumo diferente e tomou! Um ano e dois meses depois uma peste veio para nossa região e devastou toda nossa lavoura, por meses não conseguimos colher nada além de alguns poucos quilos de cenoura e algumas dúzias de espigas de milho, resultado? Faculdade trancada, droga de peste! Mais meses se passaram e nada de colheita, perdemos a casa, droga de banco! Alugamos uma coisa que prefiro chamar de barraco num bairro pobre, mas o valor compensava, aliás era a única coisa que compensava melhor dizendo. Meu pai conseguiu um biscate como ajudante numa construção civil e ía nos mantendo. Gabriel, um grande amigo que fiz no estágio ficou sabendo de nossas condições e me ofereceu uma vaga em uma rede de supermercados, não era grandes coisas mas com isso consegui pagar e me formar na faculdade. Aos vinte e três anos fui chamado pra multinacional onde estou. Feliz? Com vinte e cinco perco meu pai, o único super herói tangível que conhecia, droga de infelicidade! Me pego agora lembrando disso tudo com vinte e seis anos, sozinho e com uma doença bomba relógio que pode a qualquer momento levar tudo o que sou embora. Qual era mesmo a pergunta que ela me fez? Droga de memória!

- Então Lorenzo? Você é feliz?

- Eu tenho medos Sofia, muitas das vezes me sinto só, sou impaciente, minha imunidade contra a tristeza é baixa, ou pelo menos era até seu sorriso entrar em minha vida, droga de sorriso perfeito! Talvez a vida não me tenha trago a oportunidade de saber o significado da felicidade, talvez Deus não tenha sido tão justo assim comigo. Seja o que for, aonde for e quando for, minha felicidade só será conceituada se a pergunta ‘com quem?’ vier acompanhada da resposta ‘com a droga de um sorriso qualquer… da Sofia’.

Nesse momento ela estava tentando entender o que tinha acabado de ouvir. Como uma pessoa que nunca havia visto você antes poderia dizer essas coisas? É simples! Equações matemáticas tem respostas, sentimentos não! Percebi que seus olhos piscavam numa velocidade maior do que o normal, acho que vi suas mãos tremerem, não, na verdade eu não devo ter visto, porque elas estavam se afastando de mim na mesma proporção em que o restante do corpo estava. Ela me deu as costas e partiu. Sim partiu e droga eu não pude me despedir ou ao menos me desculpar. Pera aí, me desculpar pelo o que?

- Hey Sofia, por favor me permita ser feliz!? (Em vão).

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