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A FUGA DE ESCRAVOS

Por:   •  20/10/2018  •  16.681 Palavras (67 Páginas)  •  276 Visualizações

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A introdução de imagens nos livros didáticos não é algo inovador, pois há mais de um século estão presentes nos livros didáticos de história como instrumentos fundamentais nos processo de ensino-aprendizagem da história e exploradas em pesquisas na área ensino de história. Já a inclusão da iconografia como objeto de pesquisa historiográfica remonta há muito mais tempo (BURKE, 2004: 13), em estudos que revelam uma variedade de abordagens e perspectivas.

Desde a implementação de políticas públicas educacionais, como a do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), que distribuem gratuitamente exemplares didáticos aos estudantes da rede pública de ensino, observa-se um aumento significativo no número de investigações voltadas para os conteúdos, métodos, condições de produção e saberes docentes em torno destes materiais. Boa parte destas investigações destaca a importância das fontes iconográficas e da necessidade de análises críticas em torno da inserção e relação dessas fontes com os textos escritos e atividades pedagógicas que as acompanham dentro dos livros didáticos. É o caso dos trabalhos desenvolvidos por Costa (2006), Zamboni e Terrazzan (2012).

Analisar as fontes iconográficas nos livros didáticos implica em considerar os seus sentidos, significados e finalidades para a época/lugar de sua produção e circulação. Nessa

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perspectiva, as imagens que constam nos livros didáticos devem ser interpretadas e abordadas criticamente enquanto fontes históricas e não como meras ilustrações que espelham a realidade. Além disso, as mudanças processadas nas últimas décadas em prol da inclusão da história dos afro-brasileiros nos livros didáticos, a partir da publicação das Leis 10.639/03 e 11.645/081, nos colocam também a necessidade de uma revisão das imagens que caracterizam os/as negros/as na sociedade brasileira. Este movimento nos coloca também a necessidade de

incluir imagens históricas que revelem o protagonismo político e social dos/as negros, a fim de questionar e combater imagens racistas e preconceituosas que por muito tempo marcaram essa população como escrava, subalterna, submissa e incapaz de resistência à servidão/escravidão.

As representações imagéticas dos/as negros/as no período colonial e imperial, especialmente no regime de escravidão, ganham destaque nos livros didáticos, e aparecem com muito mais frequência, colocando em relevo a associação dos/as negros/as apenas com a experiência traumática de violência, opressão e dominação que caracteriza a escravidão no Brasil. O predomínio dessas representações podem influenciar negativamente na construção das identidades e relações étnico-raciais dos/as estudantes brasileiros. Guiados por essa preocupação foi que começamos a observar as imagens da população negra nos livros didáticos de História para o segundo ano do Ensino Médio. Nesse trabalho, uma imagem em particular nos chamou atenção, pelo fato de aparecer em vários livros didáticos, especialmente nos conteúdos relacionados à abolição da escravatura no Brasil. Trata-se de uma charge

intitulada nos livros didáticos como “Fuga de Escravos”2, produzida por Ângelo Agostini e

publicada originalmente na Revista Illustrada, em setembro de 1887.

Nesta monografia apresentamos os resultados de uma pesquisa sobre os usos e apropriações dessa imagem em dois livros didáticos de História para o Ensino Médio: “Conexões com a História: da colonização da América ao século XIX”, volume dois, dos autores Alexandre Alves e Letícia Fagundes de Oliveira, publicado pela Editora Moderna, no ano de 2010; e “História: das cavernas ao terceiro milênio”, volume 2, também publicado pela Editora Moderna em 2013, com autoria de Patrícia Ramos Braick e Myriam Becho Mota.

[pic 2]

1 A lei 10639/03 altera o artigo 26 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96 e torna obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira na Educação Básica. No ano de 2008, por meio da Lei 11.645/2007 foi incluída também a perspectiva indígena.

2 Nos livros didáticos analisados a imagem recebe o título de “Fuga de escravos”. Porém, na publicação original,

que se encontra em anexo, não há menção a tal denominação.

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Nesse trabalho buscamos analisar a relação desta imagem com o texto (escrito) que a acompanha, a fim de identificar e discutir as representações iconográficas dos/as negros/as, bem como as perspectivas historiográficas, educativas e imagéticas que emergem nessa relação. Nesse caminho, buscamos também analisar o modo como a inclusão dessa imagem responde ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) E às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira (BRASIL, 2004).

Esta monografia está organizada em dois capítulos. No primeiro capítulo abordamos, de forma interdisciplinar, o conceito de representações sociais tendo como referência o pensamento de Lúcia Ponto Santiso Villas Bôas (2010), Roger Chartier (1991; 2011), Denise Jodelet (2001) e Sandra Jatahy Pesavento (2004). Os percursos entre a teoria das representações sociais e a história cultural nos ajudaram a identificar e compreender a influência e importância das representações que circulam na história escolar, na disseminação de estereótipos e na construção de identidades e relações sociais. Na primeira parte deste capítulo tratamos de algumas pesquisas sobre as representações da população negra nos livros didáticos, no intuito de refletir sobre as contribuições que elas podem oferecer ao nosso trabalho. Já na segunda parte, deste primeiro capítulo, discutimos também a importância pedagógica das imagens nos livros didáticos de História, destacando as características das charges e o seu uso no ensino de História.

No segundo capítulo apresentamos uma análise dos usos e apropriações da imagem “Fuga de escravos” nos dois livros didáticos selecionados, observando sua função didática e o modo como se articula com os textos na construção/difusão de sentidos para a atuação dos/as negro/as no processo de abolição da escravatura no Brasil. Este capítulo foi organizado em quatro partes: na primeira

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