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Sociologia no Ensino Médio

Por:   •  6/5/2018  •  3.092 Palavras (13 Páginas)  •  350 Visualizações

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a fazer o menor número de tarefas possível.

Foi somente mais tarde, quando comecei a execução do planejamento das aulas de sociologia que havia construído que reconheci a existência e pude perceber a dificuldade de relacionar e contemplar os três tempos/rimos (professor, escola e aluno). Quando o plano elaborado para uma aula necessitou de três vezes o tempo previsto para se realizar reavaliei minhas observações da aula de inglês e comecei a compreender as escolhas de uma professora experiente acostumada ainda que inconscientemente a lidar com essas referências temporais.

Mais que isso, identifiquei a tendência nas escolas que pude observar na minha trajetória escolar e de formação, de organizarem-se a partir da referência a um único tempo/ritmo: o da própria instituição. Há uma invisibilidade dos tempos/ritmos que atinge, sobretudo, o reconhecimento da condição existencial do jovem-aluno, anulando-a ou, pelo menos, construindo uma distância abismal entre ela e a lógica escolar. Isto pode ser observado em Freitas e Filho (2013) quando apontam que nas escolas públicas brasileiras

“existe um descompasso entre os anseios dos jovens e as lógicas institucionais que enquadram as escolas. (...) De um lado, jovens que desejam reconhecimento e espaço para a expressão das suas pertenças e gostos no ambiente escolar. De outro, escolas que teimam em fechar os olhos para os jovens que existem por trás da farda dos alunos” (p. 122).

No mesmo sentido, Camacho (2004) refere que os sujeitos focalizados, além de alunos, são, acima de tudo, jovens. Vivem, portanto, um período de permissividade e legitimidade (moratório social) e sensação de imortalidade, falta de temeridade, exposição a excessos e superdoses (moratória vital).

Claudia Fonseca (1994), referindo-se a adolescência, observa a distinção entre as classes médias e populares na definição dessa fase da vida. Em seus estudos, constatou que enquanto nas classes médias esse período é concebido como fase transitória em que as falhas poderão ser recuperadas posteriormente, nas classes populares os erros da juventude são tomados como irremediáveis. Para jovens de classes populares “trata-se de um tempo desvalorizado e não legitimado socialmente que empurra o jovem para a marginalidade, para a exclusão e exposto aos agentes de limpeza social” (CAMACHO, 2004, p.333). Essa negação da moratória constitui a condição juvenil (ontologicamente). Diante dessa falta de uma definição clara, esse jovem aluno está sendo entendido como um ser desprovido de identidade. Segundo a autora,

“a escola, ao não ter a capacidade de construir relações condizentes com as características, interesses, expectativas, linguagens dos seus jovens alunos, termina por criar rupturas, às vezes irreversíveis, entre o mundo escolar e o mundo juvenil do aluno. A consequência pode ser o afastamento não apenas simbólico mas real desses jovens da escola” (CAMACHO, 2004, p.338)

O reconhecimento que a condição juvenil antecedente à condição de aluno como estratégia para ruptura com a invisibilidade do jovem aluno perpassa, a nosso ver, pela percepção do tempo/ritmo deste sujeito, considerando sua singularidade e distinção dos demais atores presentes na escola.

Freitas (2006), apoiando-se na concepção de Marguilis e Urresti (1998), refere que a juventude atual “reflete uma certa ‘classe de outros’; aqueles que nos rodeiam quotidianamente mas que estão, muitas vezes, separados de nós por barreiras cognitivas, abismos culturais e singularidades no modo de perceber o mundo ao redor” (2006, p. 9). Para este autor, apesar de ocuparmos o mesmo espaço, não estamos conseguindo nos encontrar. Embora considerando como “nativos do presente”, em função da fugacidade de seu tempo, observa-se o risco de expropriação do hoje e do amanhã do jovem. O processo de aceleração imposto pela sociedade de mercado, diferenciado pela desigualdade social, reforçado pela distância dos diagnósticos e prognósticos produzidos a seu respeito, contribuem para esse desencontro que se não se dá no espaço é porque está relacionado ao tempo e a velocidade. Trata-se de uma incompatibilidade de tempo/ritmo entre jovens e adultos.

Para Bourdieu (1983) a “divisão entre as idades são arbitrárias (...) são divisões de poder” – esses aspectos revelam que a juventude é uma construção social, a qual, acrescentaríamos, também se constitui a partir da construção do seu tempo/ritmo. Pensar a reprodução (noção tão cara a este sociólogo) é também pensar a valorização (reforço) de “um” tempo/ritmo em detrimento de outros. Aos corpos docilizados (expectativas de controle e disciplinamento) acrescemos seus tempos/ritmos coordenados para adaptação do movimento do relógio hegemônico. Trata-se, portanto, de outro aspecto que concorre para o fracasso. O conjunto de capitais acumulados pelo jovem que diverge dos atributos valorizados pela instituição escolar, colidindo com suas “intenções pedagógicas”, é também formador de um tempo/ritmo que não se permite realizar neste espaço.

Bourdieu explica o conflito de gerações pela defasagem causada pelos sistemas de aspirações constituídos em épocas diferentes. No entanto, parece mais profícuo pensar no conceito de habitus para compreender a distinção do tempo/ritmo internalizado pelos diferentes sujeitos na escola. O habitus, enquanto sistema de disposições ou esquemas de percepção e produção de práticas e representações que exprime a posição social e, por extensão, a condição geracional, permite-nos inferir que há um processo de internalização e estruturação de um tempo/ritmo constitutivos da condição juvenil.

Complementando, é plausível - ainda que coloquemos em termos de hipótese para reflexão - que o próprio tempo/ritmo apresenta-se não apenas estruturado, mas, sobretudo, enquanto estrutura estruturante, atravessando a composição do habitus como uma de suas dimensões essenciais. Uma vez considerado como tal dimensão, o tempo/ritmo difere-se entre as gerações a ponto de influenciar não apenas as motivações e necessidades como a forma de atribuir sentido ao conteúdo na sala de aula. Não há disposição para esperar por tal sentido. Uma espera que não se realiza tanto a partir do significado de “aguardar” quanto de “ansiar” pelo outro.

Nessa mesma direção, Santos (s/d) refere-se à presença da perspectiva cientificista, para a qual na escola “o tempo é dividido em dias letivos, bimestres, semestres, séries, etc, de acordo com as necessidades de estruturação dos conteúdos e não de acordo com as necessidades e ritmos de aprendizagem dos alunos. Como consequência dessa temporalidade etapista, aqueles

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