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Foucault em a ‘’ A pele que habito’’ de Pedro Almodóvar.

Por:   •  17/4/2018  •  2.627 Palavras (11 Páginas)  •  382 Visualizações

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Hermenêutica do Sujeito

Na primeira aula do curso "A Hermenêutica do Sujeito", proferido por Foucault, a principal questão levantada refere-se ao próprio nascimento da filosofia. Partindo do estudo de uma nova possibilidade de interpretação do preceito délfico "gnôthi seautón" (conhece-te a ti mesmo) à sombra de um preceito mais abrangente, a saber, a "epiméleia heautoû" cuidado de si, Foucault faz uma genealogia das relações entre sujeito e verdade. Apropriando-se do cuidado de si e usando-o como parâmetro, o gnôthi seautón é visto como uma questão fundadora na filosofia, mas seu significado não possuiria o valor que lhe conferimos, ou seja, o "conhece-te a ti mesmo" no sentido filosófico do termo. A concepção de que a filosofia não é algo exclusivamente do campo cognitivo é, então, ressaltada.

Segundo Foucault, "o que estava prescrito nesta fórmula não era o conhecimento de si, nem como fundamento da moral, nem como princípio de uma relação com os deuses". A filosofia seria, antes de tudo, um modo de vida mais brilhante, mais feliz. O pensamento filosófico "serviria" como uma terapia diante do sofrimento, da angústia e da infelicidade. A razão pela qual a epiméleia heautoûfoi desvalorizada na tradição filosófica será um dos alvos instigantes desse curso de Foucault e para isso fará um levantamento histórico, visitando perspectivas que fugirão das interpretações tradicionais. Roscher e Defradas trouxeram novas propostas de interpretação do terceiro preceito délfico (o gnôthi seautón, ou "conhece-te a ti mesmo") que foram muito relevantes para a pesquisa foucaultiana, pois representam, de certa maneira, um contraponto à exaltação do caráter cognitivo de tal preceito.

Segundo Roscher (1901), o gnôthi seautón significa: "no momento em que vens colocar questões ao oráculo, examina bem em ti mesmo as questões que tens a colocar, que queres colocar; e, posto que deves reduzir ao máximo o número delas e não as colocar em demasia, cuida de ver em ti mesmo o que tens precisão de saber". Para Defradas (1954), o "conhece-te a ti mesmo" seria o preceito segundo o qual é preciso continuamente lembrar-se de que, afinal, é-se somente um mortal e não um deus, devendo-se, pois, não contar demais com sua própria força nem afrontar-se com as potências que são as da divindade". Ambas as interpretações exigem um auto-exame, uma reflexão acerca de maneiras, de ações que tomamos no mundo e austeridade. Encontramos "um esforço de vigilância que intensifica a imanência a si mesmo". Isso porque conhecer-se não é se dividir e fazer de si um objeto separado que seria preciso descrever e estudar, pois o sujeito é mais amplo que o conhecimento.

Foucault pensa a filosofia vinculada à espiritualidade, pois aquela possuí heranças das chamadas “tecnologias de si” ou “artes da existência”. Na introdução de sua História da Sexualidade - o uso dos prazeres, diz Foucault: “deve-se entender, com isso, práticas refletidas e voluntárias através das quais os homens não somente se fixam regras de conduta, como também procuram se transformar, modificar-se em seu ser singular e fazer de sua vida uma obra que seja portadora de certos valores estéticos e responda a certos critérios de estilo”.

Entende-se aqui por espiritualidade como o conjunto de buscas, práticas e experiências. Assim completa Foucault na citada introdução: “essas ‘artes da existência’, essas ‘técnicas de si’, perderam, sem dúvida, uma certa parte de sua importância e de sua autonomia quando, com o cristianismo, foram integradas no exercício do poder pastoral e, mais tarde, em práticas de tipo educativo, médico ou psicológico.

A pele que habito (Pedro Almodóvar 2011).

O filme A pele que habito inicia apresentando os dois personagens principais, o cirurgião plástico Robert Ledgard, vivido por Antonio Banderas, e Vera uma jovem que é mantida trancada em um quarto, usando uma roupa colante parecida com a cor de sua pele. Há alguns anos, a esposa de Robert teve o corpo completamente queimado após envolver-se em um acidente de carro. Robert se sentia um inútil, pois como profissional da área pouco pode fazer para contornar o problema estético de sua esposa. Após o ocorrido sua esposa era mantida dentro de um quarto escuro, pois não suportava a claridade. Numa manhã, ao se deixar levar pela musica que vinha do jardim, cantada pela sua filha Norma, ela abre as cortinas e se depara com a sua imagem refletida no vidro e isso a choca bastante e acontece a primeira tragédia do filme, ela se joga pela janela. O fato abalou todos, principalmente sua filha Norma que presenciou o ocorrido. Passa o tempo e Norma, que agora vive a base de medicamentos controlados é afastada da sociedade. Ao ser convidada para uma festa de casamento de amigos de seu pai, acreditando ou não que todo rapaz é boa gente, ela conhece Vicente e se deixa levar. Eles vão até o jardim da mansão, onde Vicente a estupra. A situação gera um grande trauma em Norma, que passa a acreditar que seu pai a violentou, já que foi ele quem a encontrou desacordada. A partir de então Roberto elabora um plano para se vingar do estuprador. Robert fica transtornado e vai atrás do rapaz que saiu da festa com a sua filha, o Vicente e o transforma em Vera. Passa o tempo e Robert vive realizando experiências não muito ortodoxas na tentativa de criar um tecido, uma pela que seja mais resistente que a pele humana. Para isso ele mantém enclausurada em sua casa/clínica Vera, uma paciente com quem ele vive uma relação amor/ódio. O médico figura como possuidor de um saber que te como objeto o homem constituída na modernidade, concebido, por sua vez, como sujeito, amo mesmo tempo um modo de ser a uma promessa inventada. No entanto, também está inserido na produção de subjetividades regulada por tecnologias inerentes e certos regimes de produção de verdade. O médico, enquanto sujeito moderno, sujeito nos dois sentidos do termo: como ser autocentrado autoidentitário e presente a si, e como assujeitamento as construções do conhecimento. Reflete a loucura de soerguer no centro do pensamento que caracteriza a modernidade, esse duplo empírico transcendental que chamou-se homem, classificando clinicamente, inclusive como loucura e perversão tudo aquilo que se desvia dessa forma de vida instituída por um poder instituinte do que conta como vida humana. Muitos desses binarismos foram produzidos e fomentados por um saber médico científico que ganhou força no século XIX, mas se insere em um discurso que desde muito tempo, nas sociedades ocidentais,

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