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A PSICOLOGIA E RELIGIÃO: UM DIÁLOGO (IM)POSSÍVEL

Por:   •  16/10/2018  •  1.896 Palavras (8 Páginas)  •  359 Visualizações

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Mas qual a diferença existente entre um sujeito religioso e outro espiritualizado? Como os dois conceitos podem interferir no bem estar e serem, ambos, recursos positivos para o tratamento de uma pessoa? Oliveira e Jungues (op cit, p.470), estudando as dimensões espiritual e religiosa da experiência humana na obra de Boff, destacam que:

“Todas as religiões têm como base a experiência com uma realidade misteriosa e fascinante que se apodera do ser humano, manifestando a presença de algo transcendente que é sentido no cotidiano da existência humana e com grande capacidade de transformar a vida. A espiritualidade refere-se a essa experiência de contato com algo que transcende as realidades normais da vida. Significa experimentar uma força interior que supera as próprias capacidades.”

Desta maneira, os autores explicam que a espiritualidade e a religiosidade caracterizam-se por seu aspecto basicamente experiencial, enquanto a religião está fundamentada na perspectiva institucional e doutrinária. Ou seja, ambas podem representar uma função reorganizadora da percepção de si e do mundo, ao passo que é pela experiência de SRP que o sujeito atribui um sentido para sua vida.

É provavelmente este caráter doutrinário e experiencial das SRP que provoca seu desinteresse no meio científico, ou estimulem a afirmação de que fé e ciência são incompatíveis. Como ressaltam Henning e Moré (2009), existe uma dificuldade metodológica para comprovar a existência de termos concretos da fé, inaceitável em uma cultura de conhecimentos, onde as relações precisam ser quantificadas. A religião/espiritualidade, de acordo com as autoras, representa um processo cultural, é constituída muitas vezes por mitos, rituais e comportamentos morais que definem padrões e atribuem significados a uma dada comunidade, realizando assim uma forte “sugestão” sobre ações e comportamentos, sobre o que “é certo e errado”. Com isso, não há como negar a influência da religiosidade no comportamento das pessoas, assim como seu caráter sócio-cultural. Contudo, além do aspecto comportamental e cultural do sujeito, a espiritualidade, religião e crenças pessoais adquirem

“(...) uma função re-ordenadora da percepção de si (auto-imagem e senso de identidade) e do mundo (sentido e opções de vida). A atitude religiosa não é apenas um sentimento de autopercepção ou uma valorização do objeto religioso, ela envolve a ação de afirmação ou de negação em relação a questões extremamente concretas que chega a modificar a personalidade do sujeito, sendo dela inseparável (op cit, p. 87).”

Essa busca por significados é vista pela ciência, muitas vezes, como “doutrinária” ou ideológica. Todavia, como aponta Amatuzzi (2003), é a experiência humana que possibilita a construção do sentido. Para o autor, sempre temos uma fé, ainda que não religiosa, pois a fé é justamente o sentido de vida: fé e ideologia são dimensões complementares da experiência humana. Porém apenas a fé não possibilita o ser humano agir, mas sim a ideologia, pois é ela quem constrói o percurso pelo qual passaremos para atingir um certo objetivo. Logo, “as ciências, que são conhecimentos objetivos, são ideológicas apesar da objetividade pretendida (porque elas sempre existem no contexto concreto de uma ação que é determinada por escolhas)” (op cit, p. 571). Assim, a ciência não é objetiva, pois acaba sendo pautada por ideologias. Cientistas e instituições de ensino seguem as regras de um paradigma vigente, o que não deixa de ser uma atitude dogmática, pois a realidade é vista de acordo com o olhar deste paradigma aceito pela comunidade científica. Com isso, a ciência entende o mundo pela perspectiva subjetiva do paradigma e não como o “mundo é, objetivamente”. Como estabelece Habermas (2013) no argumento de seu livro “Fé e Saber”, a raiz do conflito entre Fé e Ciência é as duas considerarem a secularização como um “jogo de soma zero”, onde um só pode ganhar às custas do outro: as forças produtivas da ciência “contra” os poderes conservadores da religião e da igreja. Para o autor, esse seria um encontro cognitivamente dissonante, visto que a religião possui um caráter de organicidade e a ciência não poderia ( ou deveria) sozinha, tentar explicar questões relacionadas à ética e valores sociais ou interferir na experiência pessoal do sujeito ou sua lógica interna.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Farias (2009) enfatiza a importância de manter as portas do diálogo entre ciência e religião abertas, haja vista a intensa discussão que podemos observar sobre o significado de sistemas de crenças religiosos, assim como dos seus possíveis benefícios e perigos. Contudo, não podemos negligenciar a multiplicidade de crenças (políticas, de gênero, metafísicas) que estruturam as nossas vidas. Assim, antes de tudo, é necessário o respeito à individualidade, sem censuras ou julgamentos. Enquanto psicólogos, devemos preocupar-nos com o bem estar completo de nossos clientes/pacientes, em reestabelecer a qualidade de vida daqueles que procuram ajuda psicológica, compreendendo que cada indivíduo possui uma bagagem e é fruto de suas experiências, valores e crenças. Assim, reconheceremos que a ciência não é a única forma de compreender o sujeito, e que, embora façamos parte de um processo de secularização, como expõe Habermas (op cit), esta secularização não pode apropriar-se do sentimento de religiosidade, pois cada indivíduo estabelecerá significados particulares, inevitavelmente, às suas experiências individuais. Cabe aí buscarmos, talvez, um equilíbrio que não ceda ao discurso autoritário das ciências nem ao fundamentalismo religioso, buscando desta forma um diálogo ao invés de confronto.

REFERÊNCIAS

AMATUZZI, M.M. (2003). Fé e ideologia na compreensão psicológica da pessoa. Psicologia, Reflexão e Crítica (UFRGS), 16 (3), 569-575. Disponível em: . Acessado em: 09/06/2015.

BRASIL. Ministério da Saúde (2015). Site da internet. Disponível em http://www.portal.anvisa.gov.br/. Acessado em: 09/06/2015.

FARIAS, Miguel (2013). Ter fé na ciência pode ser tão bom quanto acreditar em deus. Entrevista disponível em https://www.procob.com/ter-fe-na-ciencia-pode-ser-tao-bom-quanto-acreditar-em-deus/ Acessado em: 10/06/2015.

FARIAS, Miguel (2009). A dor e a crença religiosa: uma perspectiva neuropsicológica. Religare – Revista de Ciências das Religiões, nº 6, 09/2009. Disponível em: http://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/religare/article/view/8236/4664. Acessado em: 10/06/2015.

FLECK,

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