Vicissitudes dos Direitos Reais
Por: Salezio.Francisco • 22/3/2018 • 2.746 Palavras (11 Páginas) • 1.302 Visualizações
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Isto é, falar das vicissitudes dos direitos reais é o mesmo que se referir às mudanças, variações ou transformações dos direitos reais.
- Constituição dos direitos reais
- A usucapião
A usucapião é uma forma voluntaria de aquisição de certos direitos reais que necessita de uma posse com certas características e mantida pelos prazos legais[2].
- Capacidade para a usucapião ‒ para a usucapião apenas se exige a capacidade de gozo.
- Direitos que podem ser objecto de usucapião ‒ a usucapião só pode abranger coisas objecto de direitos privados, sejam elas móveis ou imóveis, sendo, no entanto, diferentes os prazos da usucapião nas duas situações. Dito isto, as coisas fora do comércio, como os bens integrantes do domínio público (art.º 202°, n° 2 do Código Civil[3]), estão naturalmente excluídas da usucapião.
- Requisitos da posse necessária para a usucapião ‒ para poder conduzir à usucapião exige-se uma posse pública e pacífica, sendo por isso a posse oculta ou violenta inidónea para a usucapião. Esta resulta dos arts. 1297° e 1300°, n° 1 CC.
- Prazo da usucapião ‒ os prazos da usucapião variam segundo a natureza móvel ou imóvel da coisa e segundo o carácter de boa ou má-fé.
- Invocação da usucapião ‒ a usucapião só é eficaz quando é invocada, sendo por isso voluntaria (art.º 303° CC, aplicável por força do art.º 1292° CC). No entanto, sendo invocada, os seus efeitos retroagem ao início da posse (art.º 1288 CC). Como aquisição originária do direito, a usucapião suplanta todos os registos existentes sobre o bem (usucapio cotra tabulas). Por esse motivo, o registo da usucapião é meramente enunciativo (art.º 5°, n°2 alínea a) do Código do Registo Predial[4]).
- Ocupação, o achamento e a aquisição do tesouro
A ocupação consiste na apropriação ou tomada de posse de uma coisa que não tem ou deixou de ter dono. As coisas que se podem adquirir por ocupação são: os animais e outras coisas móveis que nunca tiveram dono (res nullus) ou foram abandonadas (res derelictae), perdidas ou escondidas pelos seus proprietários (art.º 1318° CC)[5].
Por achamento entendesse a forma de constituição do direito de propriedade sobre coisas móveis perdidas por parte de quem as encontre. No achamento a coisa móvel é uma coisa que saiu do poder do anterior proprietário casualmente, independentemente da vontade deste, por isso, a coisa perdida mantém-se na propriedade do titular anterior, ate que se constitua um novo direito. O achamento encontrasse regulado no artigo 1323° CC[6].
O código dá uma noção de tesouro, no seu atrigo 1324°, n° 1: “coisa móvel de algum valor, escondida ou enterrada não se podendo determinar que é o dono dela”[7].
- A acessão e a especificação
A acessão é definida na lei como a situação que ocorre quando a coisa que é propriedade de alguém se une e incorpora com uma coisa que não lhe pertencia (art.º 1325° CC).
Nos termos do art.º 1326° CC distingue-se a acessão entre natural e industrial.
A acessão é natural, quando resulta exclusivamente das forças da natureza. A regra geral prevista no art.º 1327° CC é a de que pertence ao dono da coisa tudo o que a esta acrescer por efeito da natureza, ocorrendo assim uma extensão automática do direito real em relação a tudo o que acrescer à coisa em virtude de fenómenos naturais (art.º 1317° alínea d) CC). Normalmente estes fenómenos poderão ser os terramotos, a acção do vento ou a força das águas[8].
A acessão é industrial, quando resulta de acção humana, que pode consistir em juntar objectos pertencentes a diferentes donos (união ou confusão) ou aplicar o trabalho próprio em matéria pertencente a outrem (especificação). A acessão industrial é distinguida entre industrial mobiliaria e a acessão imobiliária[9].
- Negócio Jurídico
A forma mais comum de constituição dos direitos reais é através do negócio jurídico. A constituição por negócio jurídico pode encontrar-se nos direitos reais de gozo (arts. 1417°, 1440°, 1485°, 1528° e 1547° CC), nos direitos reais de garantia (art.º 658° n° 2, art.º 667°, e 712° CC), e nos direitos reais de aquisição (arts. 421° e 413° CC). Em virtude da tipicidade dos direitos reais, o negócio jurídico não pode criar novos direitos reais, mas apenas aqueles que já se encontram legalmente previstos[10].
- A lei, os actos judiciais e os factos administrativos. A reversão automática a favor do Estado
Os direitos reais podem ser constituídos por lei, nos casos em que é ela própria a estabelecer o direito, como sucede com os privilégios creditórios (art.º 733° e ss CC) e com a hipoteca legal (704° e ss CC)[11]
Outra forma de constituição dos direitos reais é através da sentença judicial que se encontra prevista nos direitos reais de gozo em relação à propriedade horizontal (art.º 1417° n° 2 CC) e as servidões legais (art.º 1547° n° 2). Nos direitos reais de garantia, a sentença judicial é prevista nos arts. 658° e 710° CC e seguintes.
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Transmissão dos direitos reais
Os direitos reais são, em regra transmissíveis em vida ou por morte, ou seja, são susceptíveis de mudar de esfera jurídica, mantendo a sua identidade objectiva (conteúdo/objecto)[12].
- A transmissibilidade dos direitos reais
A regra absoluta da nossa ordem jurídica é o princípio de que todos os direitos reais são transmissíveis, seja “inter vivos”, seja “mortis causa”[13].
A transmissibilidade dos direitos reais consta do art.º 1305° quando se refere que “ o proprietário goza de modo exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas”[14].
- Os factos jurídicos transmissivos
Qualquer dos factos jurídicos dotados de eficácia real, cujas classificações conhecemos, é susceptível de provocar a transmissão dos direitos. São eles os factos, os actos e os negócios. Os efeitos reais a transmissão verificam-se com a simples ocorrência
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