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APRENDER, ENSINAR E RELAÇÕES ÉTNICO RACIAIS NO BRASIL

Por:   •  18/4/2018  •  1.891 Palavras (8 Páginas)  •  496 Visualizações

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Como podemos ver não impossível, a tarefa de tratar de processos de ensinar e de aprender em sociedades multiétnicas e pluriculturais, como a brasileira. Abordá-los pedagogicamente ou como objeto de estudos, com competência e sensatez, requer de nós, professores e pesquisadores: não fazer vista grossa para as tensas relações étnico-raciais que “naturalmente” integram o dia-a-dia de homens e mulheres brasileiros; admitir, tomar conhecimento de que a sociedade brasileira projeta-se como branca; ficar atento para não reduzir a diversidade étnico-racial da população a questões de ordem econômico-social e cultural; desconstruir a equivocada crença de que vivemos numa democracia racial.

A sociedade brasileira sempre foi multicultural, desde os 1500, data que se convencionou indicar como de início da organização social e política em que vivemos. Esteve sempre formada por grupos étnico-raciais distintos, com cultura, língua e organização social peculiares, como é o caso dos povos indígenas que por aqui viviam quando da chegada dos portugueses e de outros povos vindos da Europa. Também os escravizados, trazidos compulsoriamente para cá, provinham de diferentes nações e culturas africanas conhecidas por pensamentos, tecnologias, conhecimentos, inclusive acadêmicos, valiosos para toda a humanidade. Fala-se e pensa-se como se a realidade fosse meramente uma construção intelectual; como se as desigualdades e discriminações, malgrado as denúncias e reivindicações de ações e movimentos sociais não passassem de mera insatisfação de descontentes.

As ideias e iniciativas dos europeus expansionistas, no século XVI, criaram um sistema mundo cujos valores e objetivos, embora, é claro, com novos contornos, ainda perduram nas relações entre pessoas, grupos sociais e étnico-raciais, entre nações. A visão segura de que eram superiores permitiu, aos europeus, consolidar projetos de domínio de civilizações não europeias. Por meio da ocupação de terras, da exploração de riquezas, nos diferentes continentes, buscaram transformar povos e suas culturas, em constructos europeus.

Em seus próprios territórios tratavam, os colonialistas, de convencer os demais cidadãos quanto à inferioridade e até mesmo animalidade dos indígenas, africanos e aborígenes. Entre outros recursos, valeram-se dos zoos humanos que, segundo Blanchard, foram comuns na França, Alemanha, Inglaterra, no final do século XIX. Em jardins zoológicos, ao lado das jaulas dos animais, expunham-se “seres exóticos” que, no seu pensar, “até assemelhavam-se a humanos”.

No Brasil, os povos indígenas, primeiramente nas escolas dos jesuítas, mais tarde nas públicas, viram-se constrangidos por tentativas de fazê-los esquecer sua língua, religião, cultura. Segundo Kreutz, no Rio Grande do Sul as primeiras escolas públicas que se criaram, destinaram-se a crianças guaranis, que ao matricular-se perdiam seus nomes próprios e passavam a ser chamadas por um nome português. Esperava-se que esquecessem sua cultura, a ponto de adotar o cristianismo e de rejeitar hábitos costumes, arquitetura de seus povos, passando a preferir o jeito português, dito “mais civilizado”.

A autora ainda lembra que o conceito de civilização, que se consolida no século XVIII, foi criado pelos europeus para referir-se a suas culturas, ou melhor, à cultura, avaliada por eles próprios como superior, a única civilizada. Com justificativas, inclusive reforçadas por argumentos bíblicos e pela meta cristã de salvar a todos, propunham, os colonizadores, civilizar povos que tinham costumes, religiões, comportamentos, mentalidades, estranhos do seu ponto de vista de europeus.

Na experiência brasileira, além do que se passou com os indígenas, deve-se ter presente a situação dos africanos escravizados, de seus filhos e descendentes. A eles foi negada a possibilidade de aprender a ler, ou se lhes permitia, era com o intuito de incutir-lhes representações negativas de si próprios e convencê-los de que deveriam ocupar lugares subalternos na sociedade. Ser negro era visto como enorme desvantagem, utilizava-se a educação para despertar e incentivar o desejo de ser branco.

De acordo com estudos de Lopes (1985), relações de opressão, no Brasil, vêm desde a constituição e exploração da colônia produzindo processos educativos. Nas Minas Gerais, ensina, a autora referida, os colonizadores, mantenedores da exploração das minas, com estruturas hierárquicas, modos de tratar, exigências, buscavam garantir o avassalamento, a submissão, a dependência dos colonizados. Empenhavam-se também em instruí-los para se tornarem opressores dos escravizados e assim educá-los para sujeição. No entanto, ressalta a pesquisadora, os colonizados também educavam seus opressores com rebeliões, revoltas, inconfidências, compelido-os a recuar, conceder, conformar-se.

De certa forma, é nesta perspectiva que pensadores e políticos brasileiros, do final do século XIX e início do XX, entre eles Ruy Barbosa, viam nas causas dos males que atingiam o Brasil, a “ignorância do povo, grande ameaça contra a existência constitucional e livre da nação”.

No entender de Ruy, como de outros intelectuais latino-americanos do mesmo período, a escola era meio para reformar ou eliminar a mencionada ignorância, ou seja, os jeitos de ser, pensar, viver do povo diferentes das autodenominadas elites. Com entendimento semelhante, Varela, no final do século XIX, formulou um plano educacional para o Uruguai, com o objetivo de que ou bem se assimilavam os indígenas à sociedade, ou se exterminava com eles.

Os resultados foram, até certo ponto, eficientes, pois há uns anos atrás, alguns intelectuais uruguaios diziam não haver mais índios no Uruguay. Hoje o movimento Indígena, neste país, mostra o contrário.

Ao longo deste texto, a autora tenta mostrar que a diversidade é, como bem argumentam Abramowicz e Silvério (2004, 2005), uma construção social, cultural, histórica das diferenças. MkGoba (1996) destaca que diversidade de pessoas, ideias, perspectivas, interpretações, culturas, estilos de vida e experiências é o que permite, aos educadores, estudantes, pesquisadores refletir sobre e relacionar-se com a sociedade em que vivem, com as culturas em que estão inseridos.

A problemática da diversidade no Brasil, embora apareça nas discussões educacionais nos anos 1990, é antiga, acompanha a história de lutas por inserção cidadã na sociedade, empreendidas por indígenas, negros, sem-terra, empobrecidos, outros marginalizados pela sociedade.

O Brasil, como outras sociedades ocidentais se descobre multicultural quando os oprimidos, que alguns designam

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