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A TEORIA AGNÓSTICA DA PENA E A BUSCA PELA LEGITIMIDADE DE UMA SANÇÃO PENAL

Por:   •  31/3/2018  •  4.710 Palavras (19 Páginas)  •  311 Visualizações

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DESENVOLVIMENTO

Na década de 80 os ares da Política Criminal tinham tomado outra direção. A ressocialização, como objetivo nuclear e legitimado da intervenção penal, tinha perdido espaço. A tese abolicionista de que o crime não tinha realidade ontológica e de que os conflitos sociais ou problemas que realmente existiam só poderiam ser equacionados através da negociação de todas as partes neles envolvidas entrara num processo de crise. Surgiram, nessa época, movimentos progressistas, centrados nos grupos ecológicos, feministas e alternativos, e tais movimentos provocaram novas reivindicações de intervenção penal. As posturas da criminologia crítica foram colocadas de quarentena exatamente por grupos ideologicamente próximos. A proposta abolição do controle social penal foi posta em xeque não apenas pelos movimentos feminista e ecológico, mas principalmente pelos criminológos.

Eram exatamente os fracos, os débeis do sistema social, diziam que sofram as consequência das ações delitivas, de forma que a supressão do mecanismo penal servia para atingi-los em primeiro lugar. Era preciso, portanto, lutar contra o crime e para este combate deveria ser empregado o próprio instrumento repressivo submetido, no entanto, a um controle menos seletivo. Ao mesmo tempo, novos bens jurídicos supraindiviuais começaram a a vir á tona e a exigir a tutela penal.

Tudo estava a indicar novos rumos, outro paradigma. O Direito Penal Liberal e as garantias formais, mais principalmente as garantias materiais que estavam ínsitas no próprio núcleo da ideia do Estado Democrático de Direito. Admitir este tipo de pacto fundador significava ao mesmo tempo reconhecer a validade de princípios, tais como da culpabilidade, da humanidade da pena e da igualdade, da proporcionalidade e da ressocialização. E isto sem se perder de vista o caráter preventivo norteador da intervenção penal estatal, isto é sem que pusessem de lado os princípios da fragmentariedade e subsidiariedade da tutela penal. Se pudesse resumir em duas palavras o novo paradigma, o “garatismo” e o “direito penal mínimo” constituíram, por certo expressões mais significativas.

O controle social deveria ser cercado de garantias para que a liberdade do cidadão não fosse conspurcada. Bem por isso deveria ser racional, previsível e transparente. Para tanto, necessita ser formal: “desformalização” não se traduz no melhor meio de solucionar os conflitos porque põe em risco as garantias do cidadão. Por outro lado, num Estado Democrático de Direito a intervenção penal não poderia ter uma dimensão expansionista, deveria ser necessariamente mínima , expressando apenas e exclusivamente a ideia de proteção aos bens jurídicos vitais para a livre e plena realização da personalidade de cada ser humano e para a organização, conservação e desenvolvimento da comunidade social que esta inserido.

As novas tendências político-criminais, que já influenciaram a legislação positiva dos países centrais, chegaram com extrema rapidez, mercê da extraordinária capacidade de propagação dos meio de comunicação, aos países periféricos, e se adaptaram bem á visão autoritária dos segmentos hegemônicos dominantes. Na própria Constituição de 1988, o modelo garantista e o principio da intervenção mínima, que são, sem dúvida dados caracterizadores do Estado Democrático de Direito, não o foram acolhidos em sua inteireza, admitindo nocivas interferências. Faz-se no Brasil dos tempos presentes, o discurso do Direito Penal de intervenção mínima, mas não há nenhuma correspondência desse discurso e a realidade legislativa. Ao invés da renúncia formal ao controle penal para a solução de alguns conflitos sociais ou da adoção de um processo mitigador de penas, com a criação de alternativas á pena privativa de liberdade ,ou mesmo da busca , no campo, no campo processual,de expedientes idôneos a sustar o processo de forma a equacionar o conflito de maneira não punitiva,parte-se para um destemperado processo de criminalização no qual a primeira e única resposta estatal, em face de um surgimento de um conflito social, é o emprego da via penal.

Descriminalização, despenalização e diversificação são conceitos fora da moda, em desuso. A palavra de ordem agora é criminalizar, ainda que a feição punitiva tenha uma finalidade puramente simbólica.

A FUNÇÃO DO SISTEMA PENAL

É muito difícil afirmar-se qual é a função que o sistema penal cumpre na realidade social. A Criminologia e a Sociologia do direito penal contemporâneo assinalam diferentes funções. Para uns, por exemplo, o sistema penal cumpre a função de selecionar, de maneira mais ou menos arbitrária, pessoas dos setores sociais mais humildes, criminalizando-as, para indicar aos demais os limites do espaço social. Para outros, cumpre a função de sustentar a hegemonia de um setor social sobre outro. Esta última afirmação — compartilhada por todos os autores marxistas e por outros mais heterodoxos ou diretamente não marxistas — é por demais genérica. É indiscutível que em toda sociedade existe uma estrutura de poder e segmentos ou setores mais próximos — ou hegemônicos — e outros mais alijados — marginalizados — do poder. Obviamente, esta estrutura tende a sustentar-se através do controle social e de sua parte punitiva, denominado sistema penal. Urna das formas mais violentas de sustentação é o sistema penal, na conformidade da comprovação dos resultados que este produz sobre as pessoas que sofrem os seus efeitos e sobre aquelas que participam nos seus segmentos estáveis. Em parte, o sistema penal cumpre esta função, fazendo-o mediante a criminalização seletiva dos marginalizados, para conter os demais. E também em parte, quando os outros meios de controle social fracassam, o sistema não tem dúvida em criminalizar pessoas dos próprios setores hegemônicos, para que estes sejam mantidos e reafirmados no seu rol, e não desenvolvam condutas prejudiciais à hegemonia dos grupos a que pertencem, ainda que tal fenômeno seja menos frequente (criminalização de pessoas ou de grupos contestadores pertencentes às classes média e alta). Também, em parte, pode-se chegar a casos em que a criminalização de marginalizados ou contestadores não atenda a nenhuma função em relação aos grupos a que pertencem, mas unicamente sirvam para levar urna sensação de tranquilidade aos mesmos setores hegemônicos, que podem sentir-se inseguros por qualquer razão (geralmente, por causa da manipulação dos meios massivos de comunicação).

Em síntese, o sistema penal cumpre uma função substancialmente simbólica perante os marginalizados

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