A SUPERAÇÃO DA TEORIA DA COCULPABILIDADE ATRAVÉS DA CULPABILIDADE PELA VULNERABILIDADE DO AGENTE
Por: Jose.Nascimento • 17/11/2017 • 6.590 Palavras (27 Páginas) • 483 Visualizações
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2. A COCULPABILIDADE DA SOCIEDADE NO EVENTO DELITUOSO
2.1. A teoria da coculpabilidade
Tendo em vista a sociedade brasileira contemporânea e suas deficiências no que diz respeito ao cenário penal e o sistema penal tido como falido em demasiados aspectos, procuram-se alternativas a todo instante que possam sanar essas lacunas estridentes. O sistema prisional brasileiro, assim como outros, tem características que o descreve como seletivo e discriminador, os indivíduos que o sistema capta e sofrem o ajuizamento da mão punitiva do Estado a partir de seu “ius puniendi” são dotados, na maioria das vezes, de realidades semelhantes.
A realidade penal brasileira, através de seus códigos e artigos, muitas vezes não consegue compreender as múltiplas analises que se tem de fazer num caso concreto e material.
As decisões tomadas pelas pessoas necessitam independentes da situação, de uma determinada autodeterminação do individuo, o que não é diferente no âmbito penal, os conceitos do que é certo ou errado dentro de uma sociedade é eminente a todos, sem restrições, os atos ilícitos e lícitos são de conhecimento unânime, porém o coeficiente de autodeterminação de certos indivíduos podem fazer com que este seja mais propício a tomar decisões dentro de uma ilicitude fora do âmbito normativo e jurídico brasileiro, e este fator deve ser analisado ao valorizar o caso em tela.
É notório que o Estado não consegue o seu fim quando se diz em oferecer condições de convívio igualitário e digno a todos da sociedade, pois as oportunidades são fracionadas e seletivas, tendo os menos favorecidos o ônus relativo a essa seleção. Essa parcela da população é facilmente alcançada pelo sistema, já que se vêem em uma posição excluída do âmbito social e, assim, encaram situações peculiares à sua situação de exclusão e miserabilidade. Pessoas que se deparam nessa situação podem se questionar de certas maneiras que o instiga a entender o porquê ele é tão facilmente alcançado pelo direito penal e outrem que cometera conduta igual ou semelhante não.
A reprovação da conduta no âmbito normativo não consegue responder tais questionamentos, por sofrer uma descaracterização devido à seletividade. Zaffaroni e Pierangeli reforçam esse ponto de vista, “a seletividade do sistema penal neutraliza a reprovação: Por que a mim? Por que não a outros que fizeram o mesmo? São perguntas que a reprovação normativa não consegue responder”.
Nesse sentido Zaffaroni e Pierangeli propuseram a chamada “teoria da coculpabilidade”, onde coloca a sociedade e o Estado na posição de co-autores da conduta cometida pelo agente com grau de autodeterminação reduzida. A possibilidade de exigir conduta distinta à considerada ilícita em indivíduos com grau de autodeterminação baixo é, no mínimo, não razoável.
A coculpabilidade analisa que, devido às mazelas que o Estado não consegue resolver e a falta de oportunidades de inserção de indivíduos menos favorecidos na sociedade, como cidadão propriamente dito, a partir da própria sociedade culminando na exclusão destes de uma vida social de comum aceitação de todos, estes procuram se igualar a seus semelhantes da maneira que lhes cabe, por muitas vezes de forma ilícita, ou seja, quando os meios institucionalizados não oferecem totais condições para que o indivíduo se desenvolva e consiga se igualar à exigência social, este carece se utilizar de outras maneiras de conseguir tal objetivo, o que muitas vezes se dá conforme atitudes execráveis ante o sistema penal brasileira.
Jean-Paul Marat assim vê a sociedade com muita propriedade quando ele analisa a partir das desigualdades e falta de oportunidades, vejamos então:
“Numa terra em que tudo é possessão de outro e na qual não se pode apropriar-se de nada, resta apenas morrer de fome. Então, não conhecendo a sociedade a não ser por suas desvantagens, estarão obrigados a respeitar a lei? Não, sem dúvida. Se a sociedade os abandona, voltam ao estado natural e quando reclamam à força direitos dos quais não podem prescindir senão para proporcionar-lhes melhorias, toda autoridade que se oponha é tirânica e o juiz que os condena à morte não é mais que um vil assassino.”
“Se para manter a sociedade é necessário obrigar a respeitar a ordem estabelecida, antes de tudo, deve satisfazer-se às suas necessidades. A sociedade deve assegurar a subsistência, um abrigo conveniente, inteira proteção, socorro em suas enfermidades e cuidados em sua velhice, porque não podem renunciar aos direitos naturais, contanto que a sociedade não prefira um estado de natureza.”
Além desta falta por parte do Estado, a própria sociedade contribui para que a seletividade do sistema penal continue a ser discriminatória e, por muitas vezes, benéfica às pessoas com mais condições de se autodeterminar. Sendo assim, vale advertir, que a sociedade impõe certas condições de aceitação que somente uma pequena fração desta pode usufruir, o próprio consumismo exacerbado e o pré-julgamento em determinados casos, culminam na exclusão precipitada de certos indivíduos em certos espaços da sociedade.
A exigência de se vestir de acordo a moda da classe dominante, morar em determinadas regiões isentas de serem taxadas de subúrbio ou favela são exemplos de que os poucos que podem se adequar a tais exigências serem vistos e julgados de forma mais acomodada do que os que, por razões que a própria sociedade e o Estado propuseram, não receberem o mesmo tratamento e receptividade.
Sendo assim, Zaffaroni e Pierangeli explanam a respeito dessa teoria da seguinte forma:
“Todo sujeito age numa circunstância determinada e com um âmbito de autodeterminação também determinado. Em sua própria personalidade há uma contribuição para esse âmbito de autodeterminação, posto que a sociedade – por melhor organizada que seja – nunca tem a possibilidade de brindar a todos os homens com as mesmas oportunidades” (ZAFFARONI e PIERANGELI , 2007, p. 525).
A coculpabilidade fará com que juntamente com o individuo agente do ato punível, uma parte dessa culpa seja atribuída à sociedade e Estado que o negou igual oportunidade e autodeterminação suficiente para agir conforme a licitude vigente no Direito Penal do Brasil. O magistrado teria a opção da atenuação da pena a partir do art. 66, CP, “A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente
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