O Acesso a Justiça
Por: Jose.Nascimento • 25/10/2018 • 3.599 Palavras (15 Páginas) • 251 Visualizações
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Deste princípio, deriva ainda outro que garante a assistência jurídica gratuita e integral aos necessitados. Observa-se que o termo assistência judiciária da Constituição anterior foi substituído pelo termo assistência jurídica, pois este é mais amplo e abrange a atividade jurídica extrajudicial. Tal princípio está prescrito no mesmo artigo 5º, todavia no inciso LXXIV:
Art. 5º, LXXIV. O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.
No âmbito internacional, a Convenção Interamericana sobre Direitos Humanos de 1969 - Pacto de San José da Costa Rica, em seu artigo 8º, 1, rege o seguinte:
Art. 8º, 1. Toda pessoa tem direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer natureza.
Através da interpretação da letra da lei, pode-se perceber que todos têm acesso à Justiça indistintamente para postular tutela jurisdicional preventiva ou reparatória relativa a um direito. É perceptível que o princípio salvaguardou não somente os direitos individuais, mas também os difusos e coletivos e que a Constituição de 1988 achou por bem tutelar não só a lesão a direito como também a ameaça de lesão, incluindo aí a tutela preventiva. Dentro de uma visão valorativa da Justiça, compreendendo o seu sentido moral, o acesso a ela não é reduzido ao acesso ao Poder Judiciário e suas instituições, mas sim a uma ordem de valores e direitos fundamentais para o ser humanos, não restritos a um sistema jurídico. Assim doutrina Kazuo Watanabe:
A problemática do acesso à Justiça não pode ser estudada nos acanhados limites dos órgãos judiciais já existentes. Não se trata apenas de possibilitar o acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim de viabilizar o acesso à ordem jurídica justa. (WATANABE, 1988)
De outra maneira, vendo de uma ótica mais ampla, o acesso à justiça deve também ser visto como movimento transformador, e uma nova forma de conceber o jurídico, enxergando-o a partir de uma perspectiva cidadã. Tendo a justiça social como premissa básica para o acesso à justiça. Os avanços mais significativos nas ondas de acesso à justiça sempre foram conseguidos na esfera civil, em constante evolução processual. Na área penal, os movimentos sempre foram mais tímidos, provavelmente porque a Constituição de 1988, em seu artigo 129, I, atribui ao Ministério Público a função de “promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei”. Na esfera penal, o acesso à justiça pode ser analisado pelo aspecto econômico, da legitimidade processual, da simplificação processual e da investigação criminal. Na ótica econômica, já era tradicional a assistência judiciária ao réu, custeada pelo Estado. A Constituição Federa de 1988 ampliou o seu significado, ao prever a assistência jurídica integral e gratuita aos mais carentes. Sob o ângulo da legitimidade processual, já existia a ação penal pública subsidiária promovida pelo ofendido por inércia do Ministério Público, um mecanismo tradicional de ampliação de legitimidade de acusação e acesso à justiça. Na simplificação processual, a Lei 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais) normatizou sobre o procedimento dos crimes de menor potencial ofensivo (pena de até 1 ano), criando o termo circunstanciado, que concentra as informações sobre os fatos numa única peça -- fazendo com sucesso o papel do burocrático inquérito policial --, que remetido imediatamente a Juízo proporciona a realização de audiência preliminar, em procedimento marcado pela informalidade, celeridade e oralidade, para proporcionar oportunidade de reparação dos danos, representação, aplicação imediata de pena, arquivamento ou oferecimento de denúncia, agilizando e facilitando a decisão sobre pequenos delitos, inclusive em procedimento sumaríssimo. Sobre a investigação criminal é muito perspicaz o que diz Valter Foleto Santin:
A investigação criminal comporta alguns problemas que começam pela atuação policial, passando pela intervenção do Ministério Público até a participação da vítima, do indiciado e de outros entes estatais, que se relacionam à atribuição de realização de investigação, ao monopólio policial e o valor das investigações, porque para o ingresso de ação penal exige-se um mínimo de elementos sobre a autoria e materialidade fornecidos pela investigação criminal, para acompanhar a denúncia ou queixa-crime para o seu recebimento pelo juiz. Também o exercício do contraditório e da ampla defesa na fase de investigação. (SANTIN, 2001)
O principal obstáculo do acesso à justiça na esfera criminal relaciona-se à investigação criminal, pelo sistema burocrático e demorado com que realizada tradicionalmente pela polícia, quase de forma exclusiva, sendo necessária a análise da exclusividade da polícia na investigação criminal, se as demais polícias podem investigar delitos fora da sua área de atuação normal, se outros entes estatais extrapoliciais podem investigar e a atuação da vítima, do indiciado e do cidadão.
3 A AUSÊNCIA DO ESTADO
O Estado, tal como o conhecemos atualmente, em sua versão moderna e democrática de Direito, é uma instituição totalizadora, completa e fechada. Assim diz Borja:
Caracterizado essencialmente pela ordenação jurídica e política da sociedade, o Estado constitui o regime de associação humana mais amplo e completo de todos os que se conhecem na história da humanidade. (Borja, 1998, p. 394)
Dessa forma, reagindo como um “todo”, como totalidade política e institucional, o Estado não deve admitir dissidências, dissensões e por ser um sistema fechado não se encontra aberto para questionamentos. A ideia de ser uma instituição completa indica que se trata de uma instituição que, teoricamente, não precisaria de reparos substanciais, mas apenas de manutenção, havendo permanência da base e de seus principais implementos. Todavia, para que essa instituição “totalizadora, completa e fechada” não se tornasse uma mera fonte de coerção e a fim de evitar que o poder se concentrasse nas mãos de uma única pessoa, para que não houvesse abuso, como o ocorrido no Estado Absolutista, por exemplo, em que todo o poder concentrava-se na mão do rei, o Estado liberal caracterizou-se justamente pela separação de Poderes, denominado Tripartição
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