Aristoteles
Por: Salezio.Francisco • 26/4/2018 • 5.437 Palavras (22 Páginas) • 259 Visualizações
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- ARISTÓTELES
Atenas, 367 ou 366 a.C. ao grande centro intelectual e artístico da Grécia no século IV a.C, chega um jovem de cerca de dezoito anos, proveniente da Macedônia. Como muitos outros, vem atraído pela intensa vida cultural da cidade que lhe acenava com oportunidades para prosseguir seus estudos. Não era belo e para os padrões vigentes no mundo grego, principalmente na Atenas daquele tempo, apresentava características que poderiam dificultar-lhe a carreira e a projeção social. Em particular uma certa dificuldade em pronunciar corretamente as palavras deveria criar-lhe embaraços e mesmo complexos numa sociedade que, além de valorizar a beleza física e enaltecer os atletas, admirava a eloqüência e deixava-se conduzir por oradores. Naquela época duas grandes instituições educacionais disputavam em Atenas a preferência dos jovens que, através de estudos superiores, pretendiam se preparar para exercer com êxito suas prerrogativas de cidadãos e ascender na vida pública.
De um lado, Isócrates, seguindo a trilha dos sofistas, propunha-se a desenvolver no educando a aretê política — ou seja, a "virtude" ou capacitação para lidar com os assuntos relativos à pólis — transmitindo-lhe a arte de "emitir opiniões prováveis sobre coisas úteis". E, de fato, numa democracia como a ateniense, cujos destinos dependiam em grande parte da atuação de oradores, a arte de persuasão por meio da palavra manipulada com o brilho e a eficácia dos recursos retóricos era fator imprescindível para o desempenho de um papel relevante na cidade-Estado. Ao contrário de Isócrates, Platão ensinava que a base para a ação política — como, aliás, para qualquer ação — deveria ser a investigação científica, de índole matemática.
Na Academia, que fundara em 387 a.C, mostrava a seus discípulos que a atividade humana, desde que pretendesse ser correta e responsável, não poderia ser norteada por valores instáveis, formulados segundo o relativismo e a diversidade das opiniões; requeria uma ciência (episteme) dos fundamentos da realidade na qual aquela ação está inserida. Por trás do inseguro universo das palavras — sujeitas à arte encantatória e à prestidigitação dos retóricos — o educando deveria ser levado, por via do socrático exame do significado das palavras, à contemplação, no ápice da ascenção dialética, das essências estáveis e perenes: núcleos de significação dos vocábulos porque razão de ser das próprias coisas, padrões para a conduta humana porque modelos de todos os existentes do mundo físico. Para além do plano da palavra-convenção (nomos) dos sofistas e de Isócrates, Platão apontava um ideal de linguagem construída em função das idéias, essas justas medidas de significação e de realidade. Diante dos dois caminhos — o de Isócrates e o de Platão — o jovem chegado da Macedônia não hesita: ingressa na Academia, embora a advertência da inscrição de que ali não devesse entrar "quem não soubesse geometria" Mas em 367 a.C. Platão não se encontrava em Atenas. Havia morrido Dionísio I, tirano de Siracusa, e Platão para lá se dirigira, pela segunda vez, a chamado de seu amigo Dion. O novo tirano, Dionísio II, talvez pudesse ser convencido a adotar uma linha política mais justa e condizente com os interesses gerais do mundo helênico. O jovem que viera da Macedônia ingressa, assim, numa Academia na qual a figura principal era, no momento, Eudoxo de Cnido, matemático e astrônomo que defendia uma ética baseada na noção de prazer. Somente cerca de um ano depois é que Platão retorna, fatigado por mais uma frustrada experiência política na Sicília. E talvez tenha sido o próprio Eudoxo quem lhe apresentou o novo aluno da Academia, o jovem da Macedônia de olhos pequenos porém reveladores de excepcional vivacidade: Aristóteles de Estagira.
1.1 O Preceptor de Alexandre
De pura raiz jônica, a família de Aristóteles estava tradicionalmente ligada à medicina e à casa reinante da Macedônia. Seu pai, Nicômaco, era médico e amigo do rei Amintas II, pai de Filipe. Estagira, a cidade onde Aristóteles nasceu, em 384 a.C, ficava na Calcídica e, apesar de estar situada distante de Atenas e em território sob a dependência da Macedônia, era na verdade uma cidade grega, onde o grego era a língua que se falava. A vida de Aristóteles — e pode-se dizer que até certo ponto sua obra — estará marcada por essa dupla vinculação: à cultura helênica e à aventura política da Macedônia. Ao ingressar na Academia platônica — que viria a freqüentar durante cerca de vinte anos — Aristóteles já trazia, como herança de seus antepassados, acentuado interesse pelas pesquisas biológicas. Ao matematismo que dominava na Academia, ele irá contrapor o espírito de observação e a índole classificatória, típicas da investigação naturalista, e que constituirão traços fundamentais de seu pensamento. Por outro lado, embora de raízes gregas, ele não era cidadão ateniense e estava estritamente ligado à casa real da Macedônia. Essa condição de meteco — estrangeiro domiciliado numa cidade grega — explica que ele não viesse a se tornar, como Platão, um pensador político preocupado com os destinos da pólis e com a reforma das instituições. Diante das questões políticas Aristóteles assumirá a atitude do homem de estudo, que se isola da cidade em pesquisas especulativas, fazendo da política um objeto de erudição e não uma ocasião para agir.
Em 347 a.C, morrendo Platão, Aristóteles deixa Atenas e vai para Assos, na Ásia Menor, onde Hérmias, antigo escravo e ex-integrante da Academia, havia se tornado o governante. É possível que a escolha de Espeusipo, sobrinho de Platão, para substituir o mestre na direção da Academia, tenha decepcionado Aristóteles; sua destacada atuação naqueles vinte anos parecia apontá-lo como o mais apto a assumir a chefia. Três anos depois que Aristóteles havia se transferido para Assos, Hérmias foi assassinado. Deixou então a cidade, levando em sua companhia Pítias, sobrinha do tirano morto, e que se tornou sua primeira esposa. Mais tarde, morrendo Pítias, desposará Herpilis, que lhe dará um filho, Nicômaco. Saindo de Assos, Aristóteles permanece dois anos em Mitilene, na ilha de Lesbos. É o momento em que a Macedônia, garantida pelo poderio militar, começa a manifestar suas vastas ambições políticas. Filipe, em 343 a.C, chama Aristóteles à corte de Pela e confia-lhe importante missão: a de educar seu filho, Alexandre. Durante anos o filósofo encarrega-se dessa missão.
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