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A VOZ DA EJA

Por:   •  9/12/2018  •  2.929 Palavras (12 Páginas)  •  414 Visualizações

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A acolhida do aluno em sala de aula é de grande importância para o trabalho pedagógico do educador. Dar atenção com uma escuta qualificada gera temas e conteúdos que se torna, em sua maioria, objetos de ensino e aprendizagem. É o tempo em que se conhece o que se passa, mas nem tudo se transforma em conteúdo de aula, mas tudo será objeto de reflexão. FREIRE (2002) afirma:

Quando estou com meus alunos observo um por um e um com outro e um com todos. Procuro encontrar afinidades, sonhos, curiosidades, tristezas, fraquezas, esperanças, conhecimento entre eles e daí começo a planejar como vou dispor a minha sala e os meus materiais e principalmente os grupos, duplas ou não individual. (FREIRE, 2002)

Neste ambiente de escuta, se conhece os interesses dos alunos, o que os move. É o momento em que poderá, inclusive, identificar saberes, memórias e expectativas. Um momento em que se reconstrói afetivamente a situação grupal e se prepara o trabalho pedagógico que virá a seguir. Representa, portanto, uma situação de preparação do clima afetivo da aula.

Para se potencializar o processo ensino-aprendizagem, as práticas pedagógicas devem tomar a vivência dos sujeitos como ponto de partida (PARREIRAS, 2001). No que diz respeito à EJA, é importante atentar para o fato de que a experiência de vida de seus educandos confere a essa modalidade educativa uma identidade que a diferencia da escolarização regular, com demandas educativas específicas, características diferenciadas de aprendizado, práticas adequadas de trabalho, representações também distintas acerca da idade cronológica e do tempo de formação (SOARES, 2011).

Quando nos referimos ao educando da EJA, não nos reportamos a qualquer sujeito vivenciando a etapa de vida jovem ou adulta, e sim a um público particular e com características específicas: sujeitos que foram excluídos do sistema escolar (possuindo, portanto, pouca ou nenhuma escolarização); indivíduos que possuem certas peculiaridades socioculturais; sujeitos que já estão inseridos no mundo do trabalho; sobretudo, sujeitos que se encontram em uma etapa de vida diferente da etapa da infância (OLIVEIRA, 2001). O reconhecimento de tais especificidades também foi salientado em pesquisa realizada por Silva (2010):

Diante da proposição de se trabalhar com a Educação de Jovens e Adultos – EJA depara-se, de pronto, com uma necessidade real de olhar para esses sujeitos de maneira diferenciada da comumente associada aos estudantes que seguem uma trajetória escolar quando crianças e adolescentes. As pessoas jovens e adultas, ao retornarem aos espaços de educação formal, carregam consigo marcas profundas de vivências constitutivas de suas dificuldades, mas também de esperanças e possibilidades, algo que não deveria ficar fora do processo de construção do saber vivenciado na escola (SILVA, 2010, p.66).

Percebemos que não se pode desconsiderar que os alunos da EJA possuem uma grande bagagem de conhecimentos, construída ao longo de suas histórias de vida. Eles trazem consigo saberes, crenças e valores já constituídos, e é a partir do reconhecimento do valor de suas experiências de vida e de suas visões de mundo que cada aluno da EJA pode apropriar-se das aprendizagens escolares de modo crítico e original, na perspectiva de ampliar sua compreensão e seus meios de ação e interação no mundo. Tal assertiva é defendida por FREIRE (1992):

O que tenho dito sem cansar, e redito, é que não podemos deixar de lado, desprezado como algo imprestável, o que educandos [...] trazem consigo de compreensão do mundo, nas mais variadas dimensões de sua prática na prática social de que fazem parte. Sua fala, seu modo contar, de calcular, de seus saberes em torno da saúde, do corpo, da sexualidade, da vida, da morte, da força dos santos, dos conjuros (FREIRE, 1992, p. 85-86).

Todavia, é importante explicitar que a afirmação sobre o valor que possuem tais saberes nunca implicou que Freire considerasse que os educandos devessem ficar limitados a tais conhecimentos. FREIRE (1992):

Partir do saber que os educandos tenham não significa ficar girando em torno deste saber. Partir significa pôr-se a caminho, ir-se, deslocar-se de um ponto a outro e não ficar, permanecer. Jamais disse, como às vezes sugerem ou dizem que eu disse, que deveríamos girar embevecidos, em torno do saber dos educandos, como mariposas em volta da luz. Partir do ‘saber de experiência feito’ para superá-lo não é ficar nele (FREIRE, 1992, p. 70-71).

Ou seja, é imprescindível que os educadores procurem conhecer seus educandos, suas características, suas culturas, suas expectativas, além de suas necessidades de aprendizagem. Cabe ressaltar que estas não estão desvinculadas das necessidades básicas da população. Nesse contexto, “a EJA deve perguntar primeiro que realidade há de transformar, e depois o que pode fazer a educação para que essa transformação seja de melhor qualidade” (SOARES, 2001, p. 211-212). Para tanto, Freire afirma que é fundamental que os docentes construam uma postura dialógica e dialética, não mecânica, trabalhando o processo ensino aprendizagem fundamentado na consciência da realidade vivida pelos educandos, jamais o reduzindo à simples transmissão de conhecimentos (FREIRE, 1992).

Coerentemente com todas essas colocações, esse princípio tem como base fundamental a concepção de educação libertadora, que segundo Freire, “implica na negação do homem abstrato, isolado, solto e desligado do mundo, e na negação do mundo como uma realidade ausente dos homens” (FREIRE, 1978, p. 81). Ao contrário, tal concepção une um esforço permanente pelo qual os homens vão percebendo, criticamente, como estão inseridos no mundo em que se encontram.

A partir dessa perspectiva, fica explícito não só a relevância, mas principalmente o desafio da complexidade que se revela aos educadores dessa modalidade de ensino, conforme confirmado por MOURA (1999):

Ao longo de sua trajetória, Freire mostrou que os educadores de alunos jovens e adultos devem, além de seu papel político de ajudar a desvelar o mundo, a fazer uma leitura crítica da realidade e buscar elementos necessários à intervenção na sociedade, proporcionar aos educandos os saberes necessários à leitura e escrita da palavra e a sua consequente apropriação como instrumento desencadeador de novos conhecimentos que possibilitem formas competentes de atuação nos contextos em que estão inseridos (MOURA, 1999, p. 76)

Na prática pedagógica, o momento de reflexão é de escutar, compreender, analisar essas histórias como o primeiro passo para saber como chegar até esses alunos criando

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