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Análise da Personagem Halla A Narradora-protagonista do Romance “A Desumanização”

Por:   •  3/10/2018  •  4.816 Palavras (20 Páginas)  •  265 Visualizações

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ser que encerra em si mesmo aspectos que realmente constroem o enredo; sem ele o enredo não parece acontecer. As ações de Halla durante o enredo mostram que ela é o foco da narração e suas reflexões sobre a perda da irmã e o desejo sobre fuga e libertação um dos temas que saltam aos olhos em toda a narrativa. É por isso que , ainda de acordo com Cândido, “a personagem é o que torna vivo o enredo”. Daí a importância de seu estudo.

Halla : “a menos morta”

“Andava por ali a ver o vazio das coisas. Porque, sem a Sigridur , tudo perdera o conteúdo.Estava oco.Como se ela fosse o dentro de tudo.” (p. 55)

Halla é a narradora - protagonista de “A desumanização”. Condicionada pelo sofrimento após a morte da irmã gêmea, vive durante toda a narrativa a descrever o impacto emocional desse evento na sua vida e na de seus pais, além de retratar o mundo cinzento, congelado e pacato de seus conterrâneos, os habitantes dos fiordes islandeses, descrição essa com uma característica linguagem simbólica. A menina Halla é caracterizada até mesmo na sua forma de dizer as coisas no romance. Ao contrário de Mariamar, Halla parece ser menos pessimista e mais autônoma. A personagem sobrevive em meio a um problema que nunca acabará: o trauma da perda da irmã gêmea e a vida enlutada por causa disso. As descrições exaustivas de fatos que envolvem a vida da personagem como um todo parecem cansar o leitor, mas a importância dessa abordagem deve-se à necessidade de uma caracterização da situação em que está a protagonista.

Nas idas e vindas, de “A desumanização”, a protagonista vive com um vazio existencial, um sentimentalismo profundo – sendo essa a profundidade da alma humana, a qual apenas os olhos e o silêncio podem talvez dar a conhecer. A cada relato revela-se a complexidade de sua forma de interpretar o mundo e a transformação que passa aaté o fim da narrativa sugerem uma personalidade de difícil caracterização o que nos permite classifica-la como uma personagem redonda segundo a classificação de Forster, com o qual concordamos quando ao diz que

as personagens classificadas como redondas, por sua vez, são aquelas definidas por sua complexidade, apresentando várias qualidades ou tendências, surpreendendo convincentemente o leitor. São dinâmicas, são multifacetadas, constituindo

o imagens totais e, ao mesmo tempo, muito particulares do ser humano. (FORSTER,2009- apud CÂNDIDO et alii)

“Escrevíamos mensagens aos desconhecidos, pedindo sorte e prendas, pedindo visitas.Contávamos histórias tolas e confissões,ficávamos cheias de esperança se alguém nos atendesse.Escondidas, para não nos cobrarem as garrafas roubadas[...]Pensávamos nos desconhecidos como heróis.”(p.31)

Sigridur e Halla viviam numa intensa relação de irmãs gêmeas, não tornando à toa, por isso, a forma como se autocaracterizava: crianças espelho. No trecho acima e no trecho abaixo, percebe-se que as personagens são crianças que brincam com a natureza e veem a vida com inocência.

“Quando eu for grande, quero ser de outra maneira, quero ser longe. Eu respondia: ninguém pode ser longe.As pessoas são sempre perto de alguma coisa e perto delas mesmas[..]E eu respondia :quero ser professora”(p.34)

Em meio a essa amizade e cumplicidade amorosa, uma apoplexia aparece e tira a vida de Sigridur ( fato que é retomado em flashback, não aparecendo no relato no tempo cronológico) e permite a Halldora (Halla) contar os fatos que sucedem a esse acontecimento. Percebemos, a cada descrição dos assaltos de reflexão da personagem, a simplicidade de sua compreensão da vida. Isso é perceptível quando ela descreve a chegada de sua menstruação (p. 23); sua relação sexual com Einar (p.73- 77); a forma como encara a morte. Para Halla, na morte, sonha-se (p.36) e é algo que torna o ser inteligente (p. 39); no tocante a deus, o mesmo pode ser comparado à própria Islândia (p.36) e em outras passagens aparece como um ser que sentou-se sobre uma pedra das montanhas,que acaba cedendo por causa do rabo pesado dele (p.48).Ela parece ter convicção de que deus é um ser imanente à matéria.A personagem se debruça sobre fatos como esses e desenvolve um monólogo interior, circunstanciando a narrativa com suas alegorias e fantasias de menina.

A vida para ela parece ser um mistério e a morte uma saída (p.132). A sua inocência é aparente, como bem ilustra a passagem em que a mesma, numa conversa com seu par romântico Einar, parece se admirar de que os rapazes não tem o fluxo de todos os meses das mulheres.

Em passagens como a que descreve o órgão sexual masculino (p. 75), torna-se evidente a pureza pueril da personagem. É nesse momento em que, cita de modo indireto, uma conversa com Einar, em que ele descreve o jeito masculino. A caracterização de ambos os personagens mostra que são igualmente ingênuos. A ingenuidade da protagonista é tão natural que reflete-se em cada situação em que ela se envolve.Todas as vezes em que torna a falar ou se relacionar com Sigridur, deixa transparecer sua ingenuidade .Numa passagem em que tange as ovelhas do exato lugar onde Sigridur foi enterrada(p. ), Halla trava um diálogo telepático com a defunta, mostrando que a deseja muito e desejaria que a mesma aparecesse a ela nem que fosse como fantasma.A aparição de Sigridur e a mão que Halla enfia na terra para tentar tocar o cadáver de Sigridur são alguns aspectos desse comportamento infantil da protagonista.

Halla parece ser uma protagonista frágil, mas é forte, decidida e firme e cheia de crendices religiosas e fantásticas. Suas ações parecem condizer com a sua compreensão da vida. A narrativa é recheada de suas explicações sobre elementos da vida. A passagem que bem ilustra isso é a que ela mesma relata a explanação de um velho ao explicar a ela o nascimento do oceano - era o sangue de cristal que desce das veias de deus e forma os oceanos. Ainda de acordo com a mesma passagem, junto com esse sangue de cristal, descem monstros que habitam as veias do mesmo deus e que formam os animais marinhos, que, para ele, são monstros enormes com aparência medonha. Essa passagem nos relembra bem de passagens similares que aparecem em obras da mitologia grega, como em Hesíodo, no seu relato fantástico sobre o nascimento dos deuses. A intertextualidade temática entre o texto grego e as explicações mitológicas como as exemplificadas sugerem que a explicação mitológica de fatos no enredo do romance mostra que a mentalidade islandesa e logo, a da protagonista, é caracterizada por crenças em mitos e um imaginário surreal mas que

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