Dicionario Karl Marx
Por: Evandro.2016 • 7/2/2018 • 46.027 Palavras (185 Páginas) • 509 Visualizações
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Base e Superestrutura A metáfora do edifício – base (infraestrutura) e superestrutura – é usada por Marx e Engels para apresentar a ideia de que a estrutura econômica da sociedade (a base ou infraestrutura) condiciona a existência e as formas do ESTADO e da consciência social (a superestrutura). Uma das primeiras formulações dessa ideia surge na primeira parte de A ideologia alemã, onde há referência à “organização social que nasce diretamente da produção e do comércio, a qual, em todas as épocas, constitui a base do Estado, e do resto da superestrutura das ideias”. Mas a noção da superestrutura não é usada apenas para indicar dois níveis da sociedade que são dependentes, ou seja, o Estado e a consciência social. Pelo menos uma vez, na terceira parte de O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte, a expressão “superestrutura” parece referir-se à consciência ou visão do mundo de uma classe: “sobre as diferentes formas de propriedade, sobre as condições sociais de existência, ergue-se toda uma superestrutura de sentimentos, ilusões, modos de pensar e visões da vida distintos e formados peculiarmente. Toda a classe cria e forma esses elementos a partir de suas bases materiais e das relações sociais que a elas correspondem”. Não obstante, essa metáfora procura explicar, quase sempre, a relação entre três níveis gerais de sociedade, por meio da qual os dois níveis de superestrutura são determinados pela base. Isso significa que a superestrutura não é autônoma, que não aparece por si mesma, mas tem um fundamento nas relações de produção sociais (ver FORÇAS PRODUTIVAS E RELAÇÕES DE PRODUÇÃO ). Em consequência disso, qualquer conjunto particular de relações econômicas determina a existência de formas específicas de Estado e de consciência social que são adequadas ao seu funcionamento, e qualquer transformação na base econômica de uma sociedade leva a uma transformação da superestrutura. Uma descrição mais pormenorizada do que se deve entender por base, ou infraestrutura, é feita por Marx em uma passagem do “Prefácio” à Contribuição à crítica da economia política (1859) que se tornou a formulação clássica da metáfora: “Na produção social de sua vida, os homens estabelecem determinadas relações necessárias e independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a uma determinada fase do desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. O conjunto dessas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se ergue a superestrutura jurídica e política e à qual correspondem determinadas formas de consciência social. O modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e intelectual em geral.” A estrutura econômica não é, portanto, concebida como um conjunto dado de instituições, unidades produtivas ou condições materiais, mas antes como a soma total das relações de produção estabelecidas pelos homens ou, em outras palavras, das relações de classe que, entre eles, se estabelecem. Como diz Marx em O Capital, “é sempre na relação direta entre os proprietários das condições de produção e os produtores diretos – relação que naturalmente sempre corresponde a um estágio preciso do desenvolvimento dos métodos de trabalho e, portanto, da sua produtividade social – que se encontra o segredo mais íntimo, o fundamento oculto de toda a estrutura social e, portanto, da forma política da relação de soberania e dependência, em suma da forma específica correspondente de Estado” (III, cap.XLVII, 2). Mas o caráter da relação entre base ou infraestrutura e superestrutura é mais complexo do que essas formulações poderiam levar a crer. Marx tem consciência de que a determinação pela infraestrutura pode ser mal-entendida como uma forma de reducionismo econômico. É por isso que ele caracteriza também essa relação como histórica, desigual e compatível com a eficácia própria da superestrutura. No que diz respeito ao primeiro aspecto, Marx afirma, em Teorias da mais-valia, que, “para examinar a ligação entre a produção espiritual e a produção material, é acima de tudo necessário compreender a última não como uma categoria geral, mas em sua forma histórica definida. Assim, por exemplo, diferentes tipos de produção espiritual correspondem ao modo capitalista de produção e ao modo de produção da Idade Média. Se a própria produção material não for concebida em sua forma histórica específica, é impossível compreender o que é específico à produção espiritual que a ela corresponde e a influência recíproca de uma sobre a outra” (vol.I, cap.IV). Vale notar que, embora a especificidade da produção espiritual seja determinada pelas formas históricas da produção material, a produção espiritual exerce “influência recíproca” sobre a produção material. Em outras palavras, a superestrutura das ideias não é considerada como simples reflexo passivo, mas como dotada de certa eficácia própria. Em segundo lugar, igualmente Marx tem consciência de que a produção material se desenvolve de maneira desigual com relação à produção artística e às relações jurídicas, tal como acontece, por exemplo, na relação entre o direito privado romano e a produção capitalista ou na relação entre a ARTE grega e forças produtivas não desenvolvidas. Em sua “Introdução” aos Grundrisse, ele diz: “No caso das artes, é fato notório que certos períodos de seu florescimento não guardam qualquer proporção com o desenvolvimento geral da sociedade e, portanto, também com a base material (…) a estrutura essencial, por assim dizer, de sua organização.” Mas o problema não é tanto o de compreender que certas formas artísticas ou jurídicas podem corresponder a certas condições materiais não desenvolvidas: a arte grega baseia-se na mitologia grega e esta, por sua vez, é uma forma primitiva de tornar propícias forças naturais que não são bem-compreendidas ou dominadas, de modo que, nas palavras de Engels, essas falsas concepções têm “um fator econômico negativo como sua base” (carta a C. Schmidt, 27 de outubro de 1890). O problema real é que a arte grega ainda goza de grande estima e representa até mesmo uma norma ou modelo em modos de produção mais avançados. A tentativa de Marx de explicar isso em termos do encanto inerente à infância histórica da humanidade é claramente insuficiente, mas, pelo menos, evidencia a consciência de que a determinação social da arte e das formas jurídicas não limita necessariamente a sua validade para outras épocas (ver ARTE). Em terceiro lugar, Marx sublinha a eficácia da superestrutura ao responder, em O Capital, à objeção de que a determinação econômica só se aplica ao capitalismo e não ao feudalismo
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