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Carnaval Industria Cultural

Por:   •  16/5/2018  •  2.263 Palavras (10 Páginas)  •  271 Visualizações

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de mercado, contribuindo, decisivamente, para a transformação do carnaval baiano em um produto, com um ciclo de realização que ultrapassa os limites da festa e da cidade, e estimulando as demais organizações carnavalescas a se arriscarem em aventuras organizacionais semelhantes. (MIGUEZ, Paulo 2012).

A camarotização do carnaval soteropolitano

O camarote é um fenômeno espontâneo do carnaval, tendo sua forma embrionária da década de 1920, quando eram colocados banquinhos e/ou cadeiras de um lado a outro das calçadas para assistir ansiosamente o desfile de corsos. Participar das carreatas dentro dos automóveis abertos ricamente adornados era uma prática restrita às famílias de maior poder de consumo. Pouquíssimas pessoas tinham condições financeiras de adquirir um carro naquela época. Neste processo, a massa era apenas coadjuvante, ocupando os passeios públicos para admirar a ostentação elitista. Com o intuito de minimizarem o desconforto de horas de desfiles em pé, grupos inteiros, ocupando papel de espectadores, passaram a trazer as mobílias das suas próprias casas, proporcionando um descanso ocasional durante horas ininterruptas de apresentação.

Para garantirem posição estratégica, algumas pessoas começaram a delimitar seus espaços antecipadamente, pintando as zonas de interesse com suas iniciais ou disponibilizando as mobílias nas calçadas semanas antes dos Dias Gordos. Se o “dono do pedaço” se ausentasse durante a festa, qualquer um poderia ocupar a área até seu retorno. Com a cristalização do costume, o poder público regulou a prática, determinando a colocação das mobílias apenas durante os desfiles, de modo que os passeios das casas comerciais permanecessem intactos, sob pena de multa e apreensão em caso de descumprimento.

Assim, na face de Carnaval-negócio, a prática de aluguel por temporada proporciona cifras instigantes para aqueles que preferem passar os Dias Gordos longe do som ensurdecedor dos trios elétricos. Um apartamento de alto padrão localizado na área nobre dos circuitos custa, em média, de R$8.000,00 a R$12.000,00 (sete diárias). Cerca de quatro meses antes dos festejos, começa a guerra dos corretores, intermediários entre proprietários imobiliários e turistas sedentos pelos meios de hospedagem alternativos, cujo custo-benefício, muitas vezes, supera hotéis, pousadas e albergues.

Em 1975, a Prefeitura Municipal de Salvador autorizou a instalação de arquibancadas na Rua Chile, proporcionando maior conforto para os cidadãos. Entretanto, a população não se fez satisfeita com o aprimoramento induzido das estruturas formadas por fileiras de madeira compensada sobrepostas. Reagindo com acidez contra a suposta “sapucaização” das manifestações soteropolitanas, os soteropolitanos questionaram a dinâmica: “É preciso lembrar que no Rio de Janeiro as arquibancadas afastaram o povo e acabaram com o carnaval de rua”.

O primeiro camarote com características similares às estruturas modernas foi montado no Campo Grande, idealizado pela BAHIATURSA na década de 1980 para receber políticos e autoridades, interessadas na crescente popularidade do megaevento. Mais tarde, empreendimentos similares foram disseminados como produtos momescos, introduzindo um mercado potencial, embora a geografia estreita do circuito do Campo Grande, àquela altura único percurso da manifestação, não oportunizasse a multiplicação destes negócios em larga escala.

O camarote, apresentando como razão de ser a própria criação de Dodô e Osmar, cria um cenário de participação parcial, discrepante da sensação de se festejar no “chão”. Se há distinções emblemáticas entre brincar a festa dentro e fora das cordas de um bloco, o ângulo camarotizado distorce ainda mais as características centrais da festa, cuja plenitude está nas ruas. Embora a finalidade básica de trios elétricos e camarotes seja o entretenimento, os meios utilizados são diferentes, justificando sensações diferentes. Se no quesito conforto os camarotes superam de longe os trios elétricos, é cerca dos palcos ambulantes que se presencia a manifestação simbólica do Carnaval de Salvador em sua totalidade, com direito à chuva, suor e cerveja.

De fato, os camarotes começaram a se transformar em oásis de sofisticação a partir da idealização do empreendimento da cantora Daniela Mercury, primeira referência de megaestrutura. Em 1996, trocando o circuito do Campo Grande pelo Barra/Ondina, Daniela arquitetou a construção de um camarote próprio, idealizado para receber amigos, personalidades, além da imprensa, trazendo os flashes para o circuito incipiente, recém- 51 oficializado. Contratada por Cacau Bleicker, então empresário da Rainha do AXÉ, a promoter Licia Fabio foi incumbida de criar, produzir e administrar a estrutura no terreno de um estacionamento na Barra.

Embora haja uma decaída contínua no número de empreendimentos nos últimos quatro anos (52, 46, 38 e 34 unidades), a capacidade de público por estrutura aumentou, refletindo a necessidade de ampliação da planta para permanência no mercado. Em suma, 56 pequenos empreendimentos tendem a desaparecer, sendo incorporados por estruturas cristalizadas, num panorama em que tamanho é documento. Somente o Camarote Salvador possui mais de 9.000 metros quadrados de área construída para receber até cinco mil pessoas por noite. Nos seis dias de festa são 72 horas de música, com apresentações segmentadas em dois palcos. Enquanto os DJs mais disputados do planeta se apresentam na área da boate, artistas do mainstream nacional agitam o Palco Praia. Fora os inúmeros espaços de entretenimento, incluindo a maior varanda do Carnaval, uma praça gourmet, 20 pontos de buffet e mais de 10 bares dão suporte ao público das 18h às 5h da manhã.

Curiosamente, um fenômeno oposto à ascensão dos camarotes é o fortalecimento da festa de rua, de cunho popular. Nos últimos quatro anos, o poder público aumentou a oferta de trios independentes. Neste sentido, o Carnaval de 2015 foi considerado pelo prefeito Antônio Carlos Magalhães Neto como “o mais democrático do planeta”, com mais da metade das atrações desfilando sem cordas. O público respondeu. Durante o Furdunço da Barra, mais de 200 mil pessoas saíram atrás de mais de 20 atrações gratuitas; anulando rumores de um esgotamento da face trieletrizada da festa. O que se contesta, portanto, não é a legitimidade dos palcos ambulantes, mas o esgotamento de um modelo de negócio centrado na comercialização de abadás, mercado em decadência. (OLIVEIRA, Thiago de Castro 2015)

Circuito Mudança do Garcia

A Mudança do Garcia surgiu

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