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Ética Profissional Assuntos Emergentes na Psicologia

Por:   •  26/4/2018  •  1.826 Palavras (8 Páginas)  •  277 Visualizações

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Para se compreender este processo é importante que entendamos a apropriação da figura do trauma e do traumatismo psíquico. E como o transtorno do estresse pós-traumático (TEPT) foi usado como modelo médico a partir da apropriação política da noção de traumatismo psíquico.

O TEPT - transtorno do estresse pós-traumático é um transtorno psicológico que ocorre em resposta a uma situação ou evento estressante, de natureza excepcionalmente ameaçadora ou catastrófica.

O traumatismo é entendido como um fato e não um processo, é a prova do intolerável e o traumatizado é a vítima. Assim o evento traumático se torna o agente etiológico, ou seja, causador e suficiente. Desta perspectiva, o estresse pós-traumático é considerado uma reação normal a uma situação anormal. Reação normal e não uma doença mental, o que constitui um modelo contrário: uma normalidade de uma condição patológica, verificável pela presença de sintomas responsáveis pelo sofrimento psíquico.

Os sintomas do estresse pós-traumático podem ser organizados em três categorias. São elas, (1) sintoma de revivescência, que faz com que os pacientes vivam os eventos traumáticos de forma repetitiva através de flashbacks, pesadelos, lembranças recorrentes; (2) sintoma de evitamento, quando a pessoa traumatizada evita situações, pessoas e lugares que lhe lembrem o trauma e (3) sintoma de hipervigilância, quando o traumatizado se encontra sempre ansioso como se estivesse em perigo, pronto para lutar e fugir.

Diagnosticados com TEPT, não podemos negar que esta população puderam ter seus benefícios sociais e não é isto que está em discussão, mas sim a necessidade de um discurso psiquiátrico como única forma de reconhecimento e legitimação de um grupo de sujeitos no meio social.

Também não há dúvidas que algumas pessoas precisam de medicação em determinadas situações, principalmente quando a angústia ultrapassa o limite do suportável e restringe a vida da pessoa. Mas o que não pode acontecer é o fato desta posição reforçar ainda mais uma cultura terapêutica de medicalização da existência. Portanto, a subjetividade é excluída quando a psiquiatria impõe seu saber como uma verdade sobre o sujeito.

É importante chamar a atenção para a história do uso da noção de trauma e sua consequência na concepção da categoria de estresse pós-traumático, pois foi com sua difusão e dentro de sua lógica que os efeitos psicológicos da violência nos refugiados começaram a ser reconhecidos.

A categoria de traumatismo psíquico enquanto uma reação normal a um evento anormal serve para embasar uma nova forma de “patologia normal”, agora identificada diretamente na condição do migrante. Isto se dá a partir da lógica que reduz a pluralidade de experiências culturais a um modelo único de interpretação biomédico: o de estresse pós-trauma. É dessa forma que os efeitos pós-traumáticos da migração entram no discurso clínico, tendo como idealizador da Síndrome de Ulisses, o psiquiatra espanhol Achotegui.

Achotegui enfatiza que “se existe uma área onde os estresses psicossociais possuem uma dimensão quantitativa e qualitativa relevantes e dificilmente discutíveis desde a perspectiva da saúde mental, essa área é a das migrações do séc. XXI.”

Portanto, a afirmação da experiência migratória como fator de risco de patologia psíquica justificou a descrição da “Síndrome Del Inmigrante com Estrés Crónico y Múltiplo”, mais conhecida como Síndrome de Ulisses.

Achotegui não considera a migração como causa de transtorno mental, mas como um fator de risco, já que situações de instabilidade emocional e hostilidade do meio, que podem impedir a elaboração do luto das perdas vividas, sempre estão presentes. Segundo ele, são sete os elementos de perda na migração, são eles: a da família e amigos, a da língua, a da cultura, a da terra, da posição social, do contato com o grupo de pertença (étnico e religioso) e os riscos pela integridade física. O sujeito fica muito vulnerável, num estado de sofrimento e crise permanente.

O autor (Achotegui) insiste que a Síndrome de Ulisses não é uma enfermidade mental, pertencente ao campo da saúde metal, mas um quadro reativo, e por isto as pessoas devem ser acompanhadas na esfera da prevenção, com abordagem psicossocial do tipo psicoeducativo e de contenção emocional.

O esteriótipo do migrante como pessoa frágil do ponto de vista mental, com um elevado risco de desenvolvimento de patologias psiquiátricas, permite transformar problemas sociais, econômicos e políticos de grupos desfavorecidos em elementos potencialmente patológicos que podem ser controlados e monitorizados farmalogicamente.

Alguns países europeus, como a Suécia, Alemanha, Dinamarca, Grécia, Finlândia, entre outros, mobilizaram-se e estão desenvolvendo um projeto sobre questões da saúde mental dos imigrantes, para que haja intervenção farmacológica dessa população e criação de serviços de saúde mental culturalmente sensíveis.

A síndrome de Ulisses é considerada como um discurso da ideologia biomédica, pois ela busca estereotipar a experiência migratória, onde as vivências emocionais, que são individuais e heterogêneas, são vistas de forma homogênea, e as categorias diagnósticas eliminam as diferenças do estranho/estrangeiro, anulando as singularidades. Torna-se uma política clínica e terapêutica interpretar a instabilidade de vida do imigrante como anomalia e potencial psicológico, sem levar em consideração o contexto, a história do sujeito no país de acolhimento.

É importante resaltar que nem sempre os modelos médicos fazem sentido para as experiências pessoais dos doentes, justamente pelas diferenças culturais entre médicos e imigrantes.

A medicalização da condição do migrante, no sentido que lhe dá a Síndrome de Ulisses, segundo Lechner, omite o essencial da compreensão da experiência dos imigrantes: “reconhecer como cada história, cada imigrante, cada caso clínico tem um sentido particular e único, sendo esse o sentido e não outro que pede uma escuta e ajuda.”

É por isto que o desafio é cuidar da formação do profissional da saúde, para que uma educação permanente em saúde ocorra e para que o objetivo esteja além de só capacitar os trabalhadores a se relacionarem com pessoas provenientes de outros contextos culturais.

O desafio é uma formação que permita aos profissionais ampliar os modos de cuidar e agregar ao modo dominante outras referências, de forma que não se homogeneízem vivências

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