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Autonomia e justiça no debate sobre aborto: implicações teóricas e políticas (Resumo)

Por:   •  1/8/2018  •  1.700 Palavras (7 Páginas)  •  322 Visualizações

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É para esse segundo deslocamento que me volto agora, analisando as formas que assume nas abordagens da chamada "ética do cuidado". Sob essa rubrica, são reunidas abordagens distintas entre si, sobretudo no modo (e no quanto) mobilizam as convenções de gênero associadas à maternidade. Em algumas delas, a distinção entre uma ética centrada no cuidado e uma ética da justiça ou dos direitos corresponde a um afastamento da ideia de autonomia individual. A noção de autonomia que toma forma no pensamento liberal seria contrastante com a posição social efetiva das mulheres: isso se daria não apenas porque os obstáculos ao exercício da autonomia seriam distintos para elas, mas também pelo horizonte ético que se definiria quando são ouvidas e quando suas experiências são levadas em conta na afirmação dos valores socialmente relevantes. A partir da singularidade das suas experiências, as mulheres mobilizariam valores que colocam em xeque a autonomia individual como referência normativa. Responsabilidade, zelo e cuidado com as outras pessoas, sobretudo com as mais vulneráveis, estariam no centro desse horizonte ético.

A decisão relativa ao aborto é vista como um caso privilegiado para a observação de como as mulheres pensam em uma situação que, além de moralmente complexa, é marcada pela expectativa de que a decisão tomada seja de fato sua. Esse contexto, que é o do acesso a métodos anticonceptivos e ao aborto legal nos Estados Unidos na passagem dos anos 1970 para os anos 1980, colaboraria para individualizar a mulher em um processo de escolha que a coloca no centro da decisão a ser tomada, como protagonista da sua vida reprodutiva. Por outro lado, as convenções que associam o feminino a virtudes que estariam relacionadas à capacidade de autossacrifício - vale lembrar, diretamente relacionadas ao ideal moderno da maternidade - impõem às mulheres conflitos singulares na forma de uma oposição entre interesses próprios e interesses das outras pessoas, entre autonomia e compaixão.

O direito ao aborto é necessário para a valorização da vida - dos indivíduos, como cidadãos aos quais são garantidos direitos iguais e igual respeito a sua integridade física e psíquica. Faz toda diferença, para este debate, se a vida é concebida como algo sagrado e que está fora do arbítrio humano porque toda a vida é criação divina, se é uma abstração que engloba toda e qualquer vida humana independentemente da consciência e da vontade - posição que tem sido mobilizada em conjunto com a primeira -, ou se o valor da vida se define no respeito aos seres humanos como indivíduos concretos, como sujeitos corporificados de projetos e interesses, como sujeitos que têm relações afetivas e são capazes de refletir sobre elas e sobre sua posição (e as consequências das suas ações) em relação às outras pessoas. Se este último entendimento não é um ponto de chegada, ele é sem dúvida o único ponto de partida possível para a consideração do problema do aborto quando autonomia individual e democracia são valores de referência. As posições contrárias ao direito ao aborto promovem uma visão pouco refletida sobre o valor da vida, que não permite avançar na consideração sobre as vidas já presentes e existentes, sobre a inviolabilidade da vida como investimento humano e criativo. A integridade dos indivíduos depende do respeito a sua integridade física e psíquica, à sua vida biológica e criativa, com os componentes psicológicos, afetivos e solidários que constituem a individualidade. O respeito à vida assim concebida depende, portanto, da redução dos obstáculos materiais e simbólicos a uma integridade que tem formas bastante concretas e terrenas.

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