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Cidadania no Brasil:O longo caminho (cap. 2)

Por:   •  5/9/2018  •  2.914 Palavras (12 Páginas)  •  306 Visualizações

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A maior parte dos cidadãos do novo país não tinha tido prática do exercício do voto durante a Colônia. Certamente, não tinha também noção do que fosse um governo representativo, do que significava o ato de escolher alguém como seu representante político. Até mesmo o patriotismo tinha alcance restrito. Para muitos, ele não ia além do ódio ao português, não era o sentimento de pertencer a uma pátria comum e soberana.

As eleições eram frequentemente tumultuadas e violentas. Na época, o votante não agia como parte de uma sociedade política, de um partido político, mas como dependente de um chefe local, ao qual obedecia com maior ou menor fidelidade. O voto era um ato de obediência forçada ou, na melhor das hipóteses, um ato de lealdade e de gratidão. À medida que o votante se dava conta da importância do voto para os chefes políticos, ele começava a vendê-lo mais caro, fazendo com que os chefes políticos não pudessem confiar apenas na obediência e na lealdade, tinham que pagar pelo voto. O encarecimento do voto e a possibilidade da fraude generalizada levaram à crescente reação contra o voto indireto e a uma campanha pela introdução do voto direto.

1881: tropeço

Em 1881, a Câmara dos Deputados aprovou a lei que introduzia o voto direto, eliminando o primeiro turno das eleições. Ao mesmo tempo, a lei dobrava a exigência de renda. Embora o limite de renda novo não fosse muito alto, a lei era muito rígida no que se referia à maneira de demonstrar essa renda. Assim, muitos, mesmo cumprindo as exigências, deixavam de votar por não conseguirem provar seus rendimentos ou por não estarem dispostas a ter o trabalho de prová-los.

Com a proclamação da República, em 1889, pouca coisa mudou. Pelo lado legal, a Constituição republicana de 1891 eliminou apenas a exigência da renda. A principal barreira ao voto, a exclusão de analfabetos, foi mantida. Do ponto de vista da representação política, a Primeira República (1889-1930) não significou grande mudança. Ela introduziu a federação de acordo com o modelo dos Estados Unidos. A descentralização causou a aproximação sobretudo com as elites locais. Assim, facilitou-se a formação de sólidas oligarquias estaduais. A aliança das oligarquias dos grandes estados, sobretudo São Paulo e Minas Gerais permitiu que mantivessem o controle da política nacional até 1930. Assim, a Primeira República ficou conhecida como “república dos coronéis”.

Quando a Guarda Nacional perdeu sua natureza militar, seu chefe, o Coronel, passou a indicar o chefe político local. O coronelismo era a aliança desses chefes com os presidentes dos estados e desses com o presidente da República. Nesse contexto, as práticas eleitorais fraudulentas foram aperfeiçoadas para que os coronéis não perdessem as eleições. Apesar de todas essas práticas e restrições ao voto, não houve no Brasil, até 1930, movimentos populares exigindo maior participação eleitoral.

Direitos civis só na lei

Apesar das pressões da Inglaterra, as leis instituídas para tentar acabar com o tráfico no Brasil durante a primeira metade do século XIX não tiveram efeito prático (“lei para inglês ver”). Foi só em 1850, quando os ingleses passaram a usar a força para pressionar o Brasil, afundando navios suspeitos de transportar escravos, que o governo decidiu interromper o tráfico de maneira efetiva. A abolição só veio em 1888, fazendo do Brasil o último país de tradição cristã e ocidental a libertar os escravos.

No país não havia como fugir da escravidão: os escravos se distribuíam de maneira desigual pelo país, mas estavam em todo o território. Além disso, a posse de escravos era muito difundida. Os valores da escravidão eram aceitos por quase toda a sociedade. mesmo os escravos, embora lutassem pela própria liberdade e repudiassem sua escravidão, uma vez libertos admitiam escravizar os outros.

No Brasil, não se considerava o cristianismo incompatível com a escravidão. A escravidão que se devia evitar era a da alma, causada pelo pecado, e não a escravidão do corpo. Fora do campo religioso, o principal argumento que se apresentava no Brasil em favor da abolição era a razão nacional, em oposição à razão individual dos casos europeu e norte-americano. Segundo esse ponto de vista, a escravidão seria um obstáculo à formação da verdadeira nação, pois mantinha parcela da população subjugada a outra parcela. Assim, a escravidão impedia a integração social e política do país e a formação de forças armadas poderosas.

Depois da abolição, foram poucas as vozes que insistiram na necessidade de assistir os libertos, dando-lhes educação e emprego, como feito nos Estados Unidos. Passada a euforia da libertação, muitos ex-escravos voltaram para as suas fazendas para retomar o trabalho por baixo salário. Outros dirigiram-se às cidades, onde foram engrossar a grande parcela da população sem emprego fixo. Onde havia dinamismo econômico provocado pela expansão do café, os novos empregos foram ocupados pelos milhares de imigrantes europeus que o governo atraía para o país. Lá, os ex-escravos foram expulsos ou relegados aos trabalhos mais brutos e mal pagos. As consequências disso foram duradouras para a população negra. Até hoje essa população ocupa posição inferior em todos os indicadores de qualidade de vida. É a parcela menos educada da população, com os empregos menos qualificados, os menores salários, os piores índices de ascensão social.

Do ponto de vista da cidadania, a escravidão afetou tanto o escravo quanto o senhor. Se o escravo não desenvolvia a consciência dos seus direitos civis, o senhor tampouco o fazia. O senhor não admitia os direitos dos escravos e exigia os privilégios para si próprio. Se um estava abaixo da lei, o outro se encontrava acima. A libertação não trouxe consigo a igualdade, apesar de esta ser afirmada por lei.

Outro grande obstáculo à expansão da cidadania era a propriedade rural. Embora profundamente ligada à escravidão, ela tinha características próprias e teve vida muito mais longa, sendo ainda uma realidade em várias regiões do país.

O coronelismo não era apenas um obstáculo ao livre exercício dos direitos políticos. Ele impedia a participação política porque antes negava os direitos civis. Nas fazendas, imperava a lei do coronel, criada por ele, executada por ele. Seus trabalhadores e dependentes não eram cidadãos do Estado brasileiro, eram súditos dele. Quando o Estado se aproximava, ele o fazia dentro do acordo coronelista, pelo qual o coronel dava seu apoio político ao governador em troca

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