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Construção artística de Brás Cubas

Por:   •  4/10/2018  •  1.545 Palavras (7 Páginas)  •  294 Visualizações

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A próxima questão a ser pensada é a ironia machadiana, que em Brás Cubas, está presente desde o título, já que o defunto-autor só passa a escrever postumamente. O teor irônico na narrativa é tão ácido que chega a ser corrosivo, acabando assim, por contaminar toda a obra. Pode-se dizer que todos os temas abordados ao decorrer da história são inundados por uma crítica tenaz sustentada por tal ironia, o amor, a burguesia, a escravidão, a filosofia, tudo é alvo de desconstrução. O fato de que o autor dedicou a sua epigrafe a um verme, apenas confirma sua autoridade como defunto-autor, não estar mais entre os vivos dá ao narrador propriedade para que fale sinceramente de tudo, “Agora, porém, que estou cá do outro lado da vida, posso confessar tudo.” (Machado: 1880,9).

Desta forma, Brás Cubas usando do discurso irônico e da liberdade de expressão que adquiriu ao estar na condição de morto, vai tocando em temas polêmicos como a religião. No capitulo I, “Óbito do autor, o personagem tenta justificar a escolha de ter começado a escrever aquelas memórias pela morte, não pelo nascimento como é o de costume, o que conclui esclarecendo ter optado por isso, para tornar a escrita mais galante e inovadora. A religião se encaixa quando o narrador diz” Moisés, que também contou a sua morte, não pôs no intróito, mas no cabo: diferença radical entre este livro e o Pentateuco.” (Machado: 1880,7). Ao comparar seu livro com um capitulo bíblico, o narrador acabou fazendo uma comparação entre a ficção e a bíblia, permitindo que o leitor possa aproximar ambas, e levantando ainda a questão da bíblia poder ser também ficção, mas essa questão é apenas mais uma de tantas outras que são levantadas e não concluídas.

Assim como no capítulo IV, “A idéia fixa”, o narrador invade o campo político, comparando sua ideia para o emplasto com as ideias de Cavour, morto depois de unificar a Itália, Bismark, que não morreu, mas também foi responsável por uma unificar a Alemanha. Isto é, as reflexões do personagem nunca chegam a um fim conclusivo ou sofrem cortes abruptos para que se possa falar de outros temas. A metalinguagem, por exemplo, é mais um ponto a ser pensado, pois já no primeiro capítulo o autor coloca sua noção de como um bom prólogo deveria ser “O melhor prólogo é o que contém menos cousas, ou o que as diz de um jeito obscuro e truncado.” (Machado: 1880,7). Este conceito pode se aplicar a toda à unidade do livro, pois e cheio de caminhos e vielas que quase sempre não levam leitor a lugar algum, ou trazem questões tão densas que seria preferível nem pensa-las.

Como antes mencionado, a ironia corrosiva contamina toda a narrativa de Brás Cubas, mas parece se concentrar bem criticamente ao Humanitismo. A filosofia parece ter sido um dos principais pontos a serem questionados na obra, fatalmente de forma critica e corrosiva. O narrador entra em contato com Quincas Borba, seu amigo de infância, que o introduz ao Humanitismo, assim como Antonio Candido diz no ensaio Esquema Machado de Assis, o Humanitas parece ser uma sátira ao Positivismo e Naturalismo. Basicamente o Humanitismo seria a ideia da sobrevivência do mais forte, um individuo só poderia obter sucesso na vida se subjulgasse o outro, um sujeito só sobreviveria devorando o outro, assim conclui Candido:

Os críticos, sobretudo Barreto Filho, que melhor estudou o caso, interpretam o Humanitismo como sátira ao positivismo e em geral ao naturalismo filosófico do século XIX, principalmente sob o aspecto da teoria darwiniana da luta pela vida com sobrevivência do mais apto. Mas, além disso, é notória uma conotação mais ampla, que transcende a sátira e vê o homem como um ser devorador em cuja dinâmica a sobrevivência do mais forte é um episódio e um caso particular. Essa devoração geral e surda tende a transformar o homem em instrumento do homem, e sob este aspecto a obra de Machado se articula muito mais do que poderia parecer à primeira vista, com os conceitos de alienação e decorrente reificação da personalidade, dominantes no pensamento e na crítica marxista de nossos dias, e já ilustrados pela obra dos grandes realistas, homens tão diferentes dele quanto Balzac e Zola (Candido, 1970, 28-9).

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