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O Ser da Compreensão: Fenomenologia da situação do psicodiagnóstico

Por:   •  24/11/2018  •  2.798 Palavras (12 Páginas)  •  407 Visualizações

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Para nós, porém, é recente o enfoque da proxêmica, que visa situá-lo em sua territorialidade. É possível interpretar diversas neuroses do cidadão que vive em meio urbano muito povoado, como sendo produtos da transgressão do território individual. O acúmulo de edifícios, os amontoamentos de meios de transporte reduzem as dimensões do território às fronteiras do corpo, não raro espremido também.

Uma forma de corroboração, são os animais selvagens, quando transportados fora do seu habitat natural, frequentemente emagrecem, ficam doentes e até morrem, sem que nenhuma causa orgânica possa ser identificada. Pessoas transplantadas apresentam reações de depressão e, até mesmo, quadros de despersonalização. Despojadas dos costumes de seu próprio ambiente, perdem também o seu centro.

O espaço, estruturado como extensão do corpo, é vivenciado como parte integrante da unidade corpórea. A autora, citando Jaspers, faz uma observação: “Curioso é o fato de nossa consciência corpórea não se restringir aos limites de nosso corpo (...)”. O espaço de nosso corpo anatômico e físico se compreende até onde vai esta sensação de unidade conosco.

Poder-se-ia dizer então que o espaço é o corpo do homem, não sendo limitado as suas fronteiras somáticas, mas incluindo as extensões implícitas. A vivência do espaço expressa-se deste modo através da fenomenologia da corporeidade vivida, ou seja, uma conclusão previsível que daí decorre, decerto, é que nessa abordagem o corpo não é, ao menos não exclusivamente, um processo fisiológico, é antes uma ferramenta da qual o homem dispõe para expressar-se, experienciar o mundo e a si próprio, bem como atuar e conferir significado à concretude do mundo), na sua presença e movimentação.

Nesse ponto, o espaço primitivo é a morada do homem e como tal, o seu significado pode ser aproximado a partir da análise da casa, espaço criado pelo homem para assegurar a sua proteção. Conforme Bachelard, “todo espaço verdadeiramente habitado carrega a essência do conceito de casa”. O espaço humano é por definição construído pelo próprio homem que o delimita e o constrói todos os dias.

Dessa forma, a psicologia clínica, por enquanto, parece ter dedicado pouca atenção ainda aos conceitos de espaço primitivo e de território pessoal do Ser. No entanto, várias doenças psíquicas poderiam ser descritas como alterações primordiais do espaço. Dentro das neuroses fóbicas, não parece haver dúvida de que as mais exemplares expressam uma patologia da vivência espacial. Agorafobia, claustrofobia, aerofobia revelam a angústia ligada à possibilidade de transgressão das fronteiras do território.

Nessas perturbações, o espaço primitivo vê-se ameaçado, a pessoa se desespera por não reconhecer aquele espaço como parte dela, algo que foi invadido ou mesmo dissuadido. Ora corre o risco de ser invadido, reduzido em sua expansão (por exemplo na claustrofobia), ora os seus limites são tão fluidos, tão mal definidos que o indivíduo, ao transpô-los, fica exposto a terríveis perigos, à morte talvez.

A insegurança em torno do centro da personalidade provoca a porosidade do espaço primitivo. Em certas psicoses, é o próprio corpo que se torna permeável. Deleuze chega a falar de “corpo-peneira”. Na esquizofrenia, concomitantemente às perturbações da vivência temporal, ocorrem também importantes modificações do espaço vivido, frequente a petrificação, parada no tempo e no espaço. O movimento carece de plasticidade, transforma-se em repetição estereotipada, até congelar-se no mundo catatônico.

De fato, é muito visível essas perturbações, as direções espaciais perdem totalmente o significado. Altera-se a proporção relativa entre os objetos e o cenário. O aposento dilata-se até atingir um tamanho cósmico. Ou, pelo contrário, ocorre o estreitamento do ambiente, “apertando” e até “sufocando” o doente: “o fim, é o fim, está tudo apertado. Tudo vai cair, está caindo, tudo apertado, tão pequeno que não me cabe. As paredes da sala estão se juntando.” Ao expressar essa vivência aterrorizante, a doente encolhe-se no chão, numa mímica de alguém que estivesse sendo pressionado pelas paredes que se fecham sobre ele.

Na prática clínica, é muito importante que se investigue a vivência espacial do sujeito, espacial do cliente. Correndo o risco da redundância, é preciso lembrar que o psicólogo clínico, salvo aquele que já trabalha dentro de uma instituição dedicada ao atendimento psiquiátrico, tem poucas oportunidades, no dia-a-dia do seu consultório, de lidar com portadores de perturbações psiquiátricas francas e declaradas. Mas é frequente, defrontar-se com pessoas que iniciem um processo patológico, que se apresenta então velado, ainda atípico. Nesses casos, muitas vezes, a investigação sistemática da vivência espacio-temporal pode contribuir decisivamente para levantar hipóteses diagnósticas precisas.

Capítulo 5. O OUTRO

“A relação ontológica com o outro torna-se então uma projeção “dentro do outro” da relação ontológica de si para si. O outro é um duplo de si”. Começando com a discussão da referida frase, já se pode ter uma ideia do que este capítulo abordará. A relação social do ser com o outro e as psicopatologias, assim como no capítulo anterior falamos do ser e seu espaço. A compreensão de si fundamenta-se no reconhecimento da coexistência, e ao mesmo tempo constitui-se como ponto de partida para a compreensão do outro.

Nesse sentido, a compreensão do outro não descansa apenas na compreensão de si próprio, mas ela se justifica a partir da situação do homem como desconhecido de si para si mesmo. Explicando melhor: a coexistência é também co-estranheza. O outro fornece um modelo para a construção da imagem de si. Por ser outro, contudo ele também revela que a imagem de si comporta uma parte igual de alteridade.

Vale dizer que a superação total da duplicidade não pode ser alcançada em moldes meramente humanos. Embora todo o processo de integração a si próprio consista em tentativas contínuas de equilibração num sistema de tensões, a conjunção dos contrários só pode ser formulada mediante o recurso à transcendência. Num âmbito religioso, amar ao próximo é equivalente a amar a Deus, pois, conforme o preceito evangélico, supõe o amar-se a si próprio, que talvez seja mais difícil, já que implica a aceitação das próprias contradições.

A descoberta que o indivíduo faz de sua alteridade apoia-se no encontro com o espelho, de imediato. Muito já se escreveu acerca das etapas

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