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Tráfico de órgãos Humano no Brasil

Por:   •  15/12/2018  •  3.653 Palavras (15 Páginas)  •  323 Visualizações

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Some-se a isso o fato de que os esquemas de tráfico se revestem de invisibilidade, em

decorrência de diversos fatores:

- A situação de vulnerabilidade das vítimas, como já mencionado;

- A confiança social na medicina e o caráter de altruísmo dos transplantes, que faz com que essas práticas permaneçam inquestionáveis;

- A presença marcante do corporativismo na classe médica, fundado em códigos morais de lealdade, o que perpetua a dificuldade das investigações e a impunidade da elite médica nos casos em que os esquemas têm envolvimento dos próprios transplantistas;

- A estrutura organizada das redes de tráfico;

- O desinteresse político em levantar e divulgar dados a respeito do tráfico, por receio de que se crie insegurança no sistema reduzindo as doações;

- E, por fim, as falhas nos próprios sistemas de transplante de cada Estado, que não apresentam a transparência e o controle necessários para coibir as práticas ilegais.

3-Dados

Não existem dados precisos sobre o número de casos de tráfico de órgãos no

Brasil. Isso se justifica, primeiramente, por serem vítimas, em regra, pessoas socialmente excluídas, que, por sua própria situação, não comunicam as autoridades e são resistentes em prestar informações. Nesse ponto é válido ressaltar que a Lei de Transplantes tipifica em seu art. 15 a venda de tecidos, órgãos, e partes do corpo, ou seja, o indivíduo que dispõe de seus órgãos incide em crime e está sujeito a pena de até oito anos de reclusão, além de multa.

No caso específico de comércio de órgãos por pessoa viva, portanto, não há

qualquer incentivo para denúncia por parte das vítimas. Por sua vez, na remoção ilegal de órgãos e tecidos de cadáveres, a apuração dos fatos é bastante difícil. Some-se a isso o fato de que não existe interesse político em que as informações sobre o tráfico sejam apuradas e divulgadas, diante da premissa de que a doação voluntária seria desestimulada, agravando ainda mais a disparidade entre a oferta e a demanda de órgãos, situação já drástica no país.

Cabe a consideração, ainda, de que o tráfico de órgãos é um crime complexo,

de estrutura organizada e que dá às máfias poder e influência política. Os valores bilionários que o tráfico de pessoas movimenta, a organização e amplitude das condutas delitivas e a vulnerabilidade das vítimas, o cenário de baixa fiscalização por parte dos órgãos públicos, demanda inesgotável e poder de barganha política, tornam o combate ao tráfico de órgãos uma questão muito mais abrangente do que a simples imposição de sanções penais.

Diante da força das máfias e a dificuldade de fiscalização de suas práticas, uma

das possibilidades levantadas como instrumento de combate ao mercado ilegal é a

descriminalização e regulamentação do comércio de órgãos e tecidos humanos. Amplamente debatida, a hipótese está longe de alcançar consenso.

Partindo de uma lógica estritamente econômica, a dinâmica do mercado resolveria em

grande parte o problema das filas de espera, reduziria drasticamente o preço de órgãos.

Por outro lado, inúmeros contrapontos são levantados a respeito da descriminalização

e da regulação do comércio de órgãos. Referem-se, essencialmente, à proteção da dignidade da pessoa humana e à hipótese de exploração acirrada da população econômica e socialmente vulnerável. A Organização Mundial de Saúde e a Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos são instituições de peso que condenam a possibilidade de remuneração pela cessão de órgãos.

O tráfico de partes do corpo, dessa forma, apresenta-se como prática altamente

rentável. A demanda é quase inesgotável, as grandes filas de espera por cirurgia: no Brasil, em março de 2015, 18.818 pessoas esperavam por um transplante de rim, ao passo que no período entre janeiro e março deste mesmo ano, apenas 1.305 transplantes de rim foram realizados em todo o país.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), apesar dos dados não serem completos, estimativas referentes ao ano de 2004 previam que o preço pago aos intermediários variava entre US$100.000,00 e US$200.000,00, incluindo os

custos de organização do sistema para a realização das transações. Os vendedores, por sua vez, em regra pessoas pobres, receberiam em média US$5.000,00 por um rim, apesar de que, em alguns casos, o valor pode ser ainda mais baixo.

Nesse sentido, os Estados podem ser classificados em sendo tipicamente de origem ou tipicamente de destino. O Brasil, enquanto país subdesenvolvido e de acordo com os dados apurados enquadra-se na primeira categoria.

É o caso do Brasil, que criminaliza a compra e venda e demais condutas relativas ao tráfico de órgãos nos artigos 14 a 20 da Lei 9.434 de 1997. Apresenta, ainda, diversas normas administrativas que visam a garantia da igualdade e da eficiência do Sistema Nacional de Transplantes.

Mesmo incorporando os comandos do Protocolo de Palermo e atendendo ao texto

constitucional, a lei brasileira é deficiente em diversos aspectos. Primeiramente, em seu art.15, e parágrafo único, ao tipificar a compra e venda de órgãos, tecidos e partes do corpo humano, a norma não faz distinção entre o vendedor consciente e a vítima do tráfico, coagida a dispôr de seu corpo. Além disso, atribui pena indistintamente à vítima e ao traficante, em violação evidente ao princípio da proporcionalidade. No que se refere ao bem jurídico tutelado, nota-se que a legislação brasileira também é falha. Ao criminalizar a conduta do vendedor, sob o argumento de proteção da dignidade humana ou da integridade física, coloca se o titular do bem jurídico como autor do tipo.

Nesse contexto, resta evidente que o Brasil ainda tem muito a fazer, principalmente no

estabelecimento de metodologia padronizada nos órgãos do sistema de justiça criminal para o levantamento e sistematização efetiva das informações.

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