O EFEITO RETROATIVO DO ENEM NO LIVRO DIDÁTICO DE INGLÊS DO ENSINO MÉDIO
Por: Rodrigo.Claudino • 2/4/2018 • 3.518 Palavras (15 Páginas) • 560 Visualizações
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DISCUSSÃO
A influência ou o impacto dos exames no ensino é denominado efeito retroativo, em inglês, backwash ou washback effect (ALDERSON E WALL, 1993). No caso específico de exames de avaliação, tal efeito consiste no modo em que o mesmo influencia o conteúdo programático e como ele será ministrado em sala de aula de modo a atender às propostas de seleção. Alderson e Wall (1993) propõem restringir a denominação de efeito retroativo ao impacto da avaliação no que acontece na sala de aula. Entretanto, reconhecem como parte desse efeito a confecção de materiais didáticos especialmente elaborados para a preparação os alunos para os exames. Tendo como base tais considerações, inúmeras pesquisas foram conduzidas e diversas definições para o termo “efeito retroativo” têm sido propostas. Prodromou (1995:13) o define como “o efeito direto ou indireto dos exames nos métodos de ensino”. Watanabe (1996) define efeito retroativo como o impacto dos exames no ensino e na aprendizagem. Para Messick (1996:241), trata-se da “amplitude a que a introdução e uso de um exame influenciam os professores e aprendizes de línguas a fazerem coisas que, de outro modo, não fariam e quepromovem ou inibem a aprendizagem de línguas.” Wall (2000:501), por sua vez, define-o como “o efeito dos exames no ensino e na aprendizagem”.
Esse impacto pode ir muito além da sala de aula pois estamos falando de um exame de nível nacional que abrange diversas camadas sociais com diferentes níveis de instrução. Scaramucci (2002) considera que a abrangência do conceito do efeito retroativo ainda não está bem definida e acredita que restringir o conceito ao âmbito da sala de aula pode ser mais complexo do que possa inicialmente parecer. Um exemplo disso é que em determinadas regiões não há a disciplina de língua inglesa devido a fatores externos como falta de professor ou até mesmo falta de escola. Neste caso, o aluno será prejudicado pois concorrerá com outros que tiveram diferentes tipos de contato com a língua inglesa e que sairão beneficiados em relação a esses desfavorecidos.
Apesar da palavra retroativo transmitir uma conotação negativa, ela não se restringe apenas a efeitos ruins em relação ao exame. Na visão de Scaramucci (2000-2001:102), esse impacto pode se manifestar de diversos modos que podem ser positivos ou negativos ao mesmo tempo, dependendo “dos traços de personalidade e cultura de ensinar/ aprender/ avaliar/ ser avaliado” dos professores e alunos”. Ela ainda considera que forças presentes na escola e na sociedade, inclusive na sociedade educacional, interagem com as características do exame na determinação de seu impacto. A partir dessa reflexão podemos observar que um único exame repercurte de diferentes maneiras pois o contexto social no qual ele é aplicado varia drasticamente nas diferentes regiões do país. Professores e alunos tem que se adaptar ao requerido contando com os recursos, materiais didáticos, que lhes ão fornecidos pelas instituições de ensino. Pela ótica de Correia (2003), que desenvolveu pesquisa sobre o ensino de língua estrangeira, autores de material didático, administradores ou coordenadores (que tomam a decisão de adotá-los) e professores (que usam o material didático para preparar seus alunos para o exame) são os maiores responsáveis pelo tipo de efeito retroativo positivo ou negativo que o exame externo possa ter no ensino/aprendizagem (CORREIA, 2003).
A língua estrangeira assume, assim, um papel educacional e pragmático para a construção da cidadania, servindo de instrumento de libertação e inclusão social (BRASIL, 1998). Nesse sentido, o ensino de língua estrangeira envolve uma série de questões que extrapolam sua organização sistêmica (lexicogramática), devendo envolver também escolhas temáticas, responsáveis pela situacionalidade sócio-histórico-cultural do ensino, e pelas escolhas de organização textual - gêneros discursivos, que articulam o conteúdo temático com a estrutura composicional e o estilo da linguagem (BAKHTIN, 1952 [2003]), dando conta não apenas da estrutura textual e de mecanismos de coesão e coerência, mas també[1]m de questões como variação linguística e pluralidade cultural. Para tal, a escolha de LD de editoria nacional é mais favorável pois adapta o conteúdo a ser ministrado à realidade do aluno brasileiro, trazendo cenários cotidianos que fazem com que o aluno sinta-se mais familiarizado com a língua estrangeira que lhe está sendo ensinada.
Um dos debates em termos de efeito retroativo é o fato de que os enunciados das questões da prova são na língua portuguesa, o que, para alguns, não atende às competências exigidas pela prova . Outros questionamentos incluem a suficiência e a necessidade do domínio das quatro habilidades linguísticas. Dominar as quatro habilidades é realmente suficiente para o entendimento da língua? Um indivíduo que domine as quatro habilidades está preparado para agir no mundo globalizado? Tais habilidades englobam apenas o conceito de competência linguística, mas deixa de fora as demais competências inerentes ao próprio conceito de competência comunicativa (sociolinguística, discursiva e estratégica), o conceito fundador da abordagem comunicativa. Além disso, as quatro habilidades não são sempre necessárias. Já que não existe um saber total, único, os saberes são plurais e parciais, e cada saber parcial requer tipos de conhecimentos diferentes. Sendo assim, dependendo do objetivo do aprendiz com a língua estrangeira, ele só precisa dos conhecimentos necessários para o alcance daquele objetivo, e tais conhecimentos podem não envolver um conhecimento por igual das quatro habilidades linguísticas.
Recentemente, a diretoria da Associaçao de Linguística aplicada do Brasil (ALAB) posicionando-se em relação ao ENEM, propondo a seus associados um abaixo-assinado que requer que o MEC utilize apenas enunciados em inglês nas questões dessa disciplina no referido exame. Os motivos alegados remetem ao provável efeito “positivo” que essa medida teria sobre o ensino de inglês no ensino médio. Tal efeito parece, pelo texto apresentado, estar relacionado à superação do foco na leitura, fazendo com que as chamadas quatro habilidades propostas no edital passem a ter o mesmo peso no programa de inglês como língua estrangeira adotado nas escolas regulares de ensino médio. Durante as discussões nos fóruns, temas importantes como qual seria a validade e a real importância de colocar questões que não na referida língua se as competências não são avaliadas de acordo com o proposto. Para alguns opinantes, isso reforça a má qualidade do ensino de língua estrangeira no país, para outros, uma
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