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Luta por reconhecimento - Axel Honneth

Por:   •  23/9/2018  •  7.006 Palavras (29 Páginas)  •  250 Visualizações

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Na experiência de destruição a criança rebela-se contra a experiência do desvanecimento da onipotência: aplica golpes, mordidas e empurrões. Esses atos destrutivos e lesivos formam os meios construtivos com base nos quais a criança pode chegar a um reconhecimento da mãe, como um “ser com direito próprio”. Então se torna capaz de amá-la sem fantasias narcisísticas de onipotência. Nessa luta com a mãe a criança vivencia o fato de que ela depende de atenção amorosa de uma pessoa existindo independentemente dela, como um ser com pretensões próprias.

O segundo mecanismo, que apresenta pelo conceito de “objeto transicional”, consiste na forte inclinação das crianças de pousos meses de idade para contrair uma relação afetivamente investida com objetos de seu ambiente material. Tais objetos são tratados como posse exclusiva, amados temporariamente com ternura, mas também destruídos com paixão. Esses objetos são formas substitutivas para a mãe, perdida na realidade exterior. Os objetos transicionais seriam de certo modo elo de mediação ontológica entre a vivência primária do estar fundido e a experiência do estar separado. A criança tenta lançar pontes simbólicas sobre o abismo dolorosamente vivenciado da realidade interna e externa.

Essa tarefa de aceitação da realidade, da aceitação do estar só, se realiza somente através da confiança elementar da disposição da pessoa amada para a dedicação. A capacidade de estar só depende da confiança da criança na durabilidade da dedicação materna. Se o amor da mãe é duradouro e confiável, a criança é capaz de desenvolver ao mesmo tempo, à sombra da sua confiança intersubjetiva, uma confiança na satisfação social de suas próprias demandas ditadas pela carência. Esse poder-estar-só, comunicativamente protegido, é a matéria de que é feita a amizade. Assim, pode-se partir da hipótese de que todas as relações amorosas são impelidas pela meniniscência inconsciente da vivência de fusão originária que marcara a mãe e o filho nos primeiros momentos de vida.

Jessica Benjamin investigou as deformações patológicas da relação amorosa. Também se apropria da teoria das relações de objeto para tirar dos conhecimentos sobre o curso bem-sucedido da separação entre mãe e filho inferências a respeito da estrutura interativa que figura numa ligação feliz entre adultos, e também conceitos clínicos de “masoquismo” e “sadismo”. A dependência simbioticamente alimentada de um parceiro da relação amorosa acaba se relacionando de modo complementar com as fantasias de onipotência de matiz agressivo, às quais se fixa o outro parceiro. Para J.B., está fora de questão, naturalmente, que essas distorções da balança do reconhecimento se atribuam a distúrbios psíquicos cuja causa comum reside numa evolução falha do desligamento da criança em relação à mãe.

A camada fundamental de uma segurança emotiva não apenas na experiência, mas também na manifestação das próprias carências e sentimentos, propiciada pela experiência intersubjetiva do amor, constitui o pressuposto psíquico do desenvolvimento de todas as outras atitudes de autorrespeito.

Toda relação amorosa está ligada à condição de simpatia e atração, o que não está a disposição do indivíduo (são sensações involuntárias). Embora seja inerente ao amor um elemento necessário de particularismo moral, Hegel fez bem em supor nele o cerne estrutural de toda eticidade: só aquela ligação simbioticamente alimentada, que surge da delimitação reciprocamente querida, cria a medida de autoconfiança individual, que é a base indispensável para a participação autônoma da vida pública.

A forma de reconhecimento pela relação jurídica distingue-se muito da do amor. Para o direito, Hegel e Mead perceberam uma semelhante relação na circunstância de que só podemos chegar a um compreensão de nós mesmos como portadores de direitos quando possuímos, inversamente, um saber sobre quais obrigações temos de observar em face do respectivo outro (“outro generalizado”). Assim é que podemos nos perceber também como pessoas de direito. A forma de reconhecimento do direito visa desde o início à constituição específica das relações jurídicas modernas. A autonomia individual do singular se deve a um modo particular de reconhecimento recíproco, incorporado no direito positivo. Essa forma de reconhecimento só pôde se constituir na sequência de uma evolução histórica.

Mead demonstra que o Alter e o Ego se respeitam mutuamente como sujeitos de direito, porque eles sabem em comum as normas sociais por meio das quais os direitos e os deveres são legitimamente distribuídos na comunidade. Esse conceito fraco de ordem jurídica é apropriado para caracterizar as propriedades gerais que competem ao reconhecimento jurídico em sociedades tradicionais. Em contrapartida, a estrutura da qual Hegel pode derivar suas determinações da pessoa de direito só assume a forma de reconhecimento do direito quando se torna dependente historicamente das premissas dos princípios morais universalistas. As definições de Hegel, diferentemente das de Mead, só valem para a ordem social do direito na medida em que esta pôde se desligar da autoridade natural das tradições éticas, adaptando-se ao princípio de fundamentação universalista.

Com a passagem para a modernidade, os direitos individuais se desligam das expectativas concretas específicas dos papeis sociais, pois competem a todo homem na qualidade de ser livre. Para as relações jurídicas ligadas às tradições, nós podemos assumir como seguro o reconhecimento como pessoa de direito ainda está fundido aqui como estima social que se aplica ao membro individual da sociedade em seus status social. Desde então, na modernidade, o reconhecimento como pessoa de direito deve se aplicar a todo o sujeito na mesma medida, apartando-se a tal ponto do grau de estima social, que acaba originando duas formas distintas de respeito (reconhecimento jurídico e a estima social).

Ihering, no século XIX, desdobra o nexo categorial entre as diversas formas de comportamento que podem contribuir para a integração “ética” de uma sociedade. Tenta diferenciar tipos de respeito social sob pontos de vista sistemáticos. O reconhecimento jurídico de um ser humano como pessoa não pode tolerar nenhuma outra graduação. O fato de nós podermos reconhecer um ser humano como pessoa, sem ter de estimá-lo por suas realizações ou por seu caráter, constitui o argumento teórico que lança uma ponte entre os estudos de Ihering e a discussão atual.

Na estrutura do reconhecimento jurídico, universalista nas condições modernas, está inserida a tarefa

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