Desnaturalizar o olhar sobre as temáticas de gênero e sexualidade no processo educativo em artes visuais
Por: Evandro.2016 • 22/4/2018 • 3.300 Palavras (14 Páginas) • 494 Visualizações
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Somos produzidos por meio de experiências e forças exteriores, que nos afetam ou não, e que por sua vez tomamos como discurso. E esses discursos, reforçam quem somos. Assim como Simone Beauvoir, afirma que, “Ninguém nasce mulher, torna-se mulher” (1980, p.9), essa frase teve um grande impacto em todo mundo, ganhando repercussão e força nos movimentos feministas. A questão de gênero é imprescindível no cenário educacional, pois estabelece expectativas culturais a respeito do que se espera de um homem e de uma mulher num determinado momento histórico. Contudo, o conceito de desnaturalizar o olhar a esses ‘modelos’ constituídos socialmente e historicamente, possibilita pensarmos além do que se é ao que não se é, mas do que se pode ser, ou ainda, deslocar as afirmações e relativizar. Como explicita Cunha e Rower:
Estranhar/desnaturalizar são atividades de pensamento, movimentos que levam a outras formas de relação, de práticas. Estranhamento/desnaturalização, como ato pedagógico, configura-se como processos dissonantes, com fins indefinidos. ( p. 28, 2014)
O conceito de gênero surge a partir dos estudos e movimentos feministas para chamar atenção para o caráter social. Gênero refere-se a uma identidade adotada ou atribuída a uma pessoa, se trata ainda de uma construção cultural, social e histórica. Como Louro coloca, “gênero se constitui com ou sobre corpos sexuados, ou seja, não é negada a biologia, mas enfatizada, deliberadamente a construção social e histórica produzida sobre as características biológicas” (1997, p.22). Identidade de gênero é a forma como o sujeito, se enxerga, sente, identifica como fazendo parte, numa percepção pessoal, auto-intitulação, construções sócio-culturais, manifestações externas da personalidade que refletem essa identidade.
Para Foucault a sexualidade, é um ‘dispositivo histórico’ e que “não se deve concebê-la como uma espécie de dado da natureza que o poder é tentado a pôr em xeque, ou como um domínio obscuro que o saber tentaria, pouco a pouco, desvelar” (Foucault, 1988, p. 100). O conceito de dispositivo, para o mesmo, emprega em três apontamentos: primeiramente há uma urgência histórica, multinear, onde cada cultura desenvolve de uma forma diferente e está relacionado a outros dispositivos que são contemporâneos.
Portanto, a partir desses apontamentos, podemos afirmar que esse “dispositivo” sucede com a sexualidade e consequentemente com gênero, como uma construção histórica, produzida na cultura, sociedade, mídia, religião e a partir de encontros que produzimos com outros indivíduos e espaços. Contudo, Louro afirma que “a sexualidade não é apenas uma questão pessoal, mas é social e política: a sexualidade é “aprendida, ou melhor, é produzida, ao longo de toda vida, de muitos modos, por todos os sujeitos” (Louro, 2007, p.11). A sexualidade assim como gênero, não se constituem como temas que buscam um consenso, aliás envolvem uma disputa de valores, de poderes, de comportamentos legitimados como o certo e/ou verdadeiro, como uma espécie de disputas de dicotomias.
A desnaturalização das explicações dos fenômenos sociais, são importantes no ambiente escolar, e busco a partir da arte, das visualidades e das mídias tratar desses temas tidos como tabus, além de procurar pensar que se trata de uma tendência natural e imutável construída/normatizada pela vontade humana, mas que pode ser movimentada a partir das relações que produzimos, sob a perspectiva dos estudos da cultura visual. Entrelaçando o deslocar do olhar para com o outro, em um movimento de trocas, relações, no qual produz a subjetividade.
Experiência educativa: como um lugar de encontro.
Parto da premissa de que a experiência educativa seja um lugar de encontro, produzida no conjunto, como Oliveira (2013) ressalta. Por mais que esses encontros sejam organizados/planejados anteriormente pelo docente, só acontecem diante do coletivo. Não pretendo fazer uma descrição da experiência pedagógica que realizei em uma escola estadual, mas perceber como ocorre o processo de subjetivação em relação às temáticas de gênero e sexualidade nas aulas de artes visuais e o meu processo como docente em formação. Assim, a pesquisa torna-se desafiadora ao pensar em como expor esses processos, visto que, ao tratarmos de subjetividade não conseguimos ter uma materialidade, neutralidade, pois de alguma forma não se trata de um objeto de pesquisa palpável.
Sendo assim, ao falar de subjetividade, fala-se também do que acontece no íntimo do sujeito, como ele se vê, sente e/ou identifica, e como essas posições de “fora” o afetam, dialogando com a manifestação de liberdade e de ação do sujeito, adotando assim um sentido de ser. A subjetividade é construída ao longo do tempo, e nos permite interpretarmos, experimentarmos e questionarmos em relação ao que vemos. As imagens nos constroem como sujeito, produzindo assim nossas subjetividades, pois desde que nascemos como Mitchell (2009) ressalta, somos alfabetizados primeiramente pelas imagens, construímos imaginários a partir das imagens que nos interpelam e dos repertórios visuais que vamos guardando.
Pensar, problematizar e questionar as interpretações firmadas e outras que possam ser instigadas pelas imagens, é disso que trata o desnaturalizar o olhar, talvez mover, borrar, deslocar certos estereótipos produzidos por artefatos como: a cultura, arte e publicidade, e com isso, buscar potencializar problematizações das temáticas de gênero e sexualidade no ambiente escolar. Diferentes propostas foram realizadas com uma turma de 9º ano, na rede pública de ensino, para a construção da temática central, além da elaboração de conceitos, referente ao projeto de estágio e trabalhos em grupos. Com isso, destaco uma proposta realizada nessa turma em relação ao imaginário dos estudantes, das pressões sociais e os valores culturais que promovem a produção do sujeito. De acordo com Louro (1997), as relações pedagógicas que são construídas no contexto educacional estão carregadas de signos por meio das quais os jovens aprendem regras, conteúdos e valores. E como isso, determina como os mesmos ‘devem ser e agir’ referente ao gênero.
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Figura 1 e 2: Proposta corpos, acervo pessoal.
A proposição era de uma construção em torno do imaginário e universo feminino quanto masculino através da elaboração de moldes do corpo humano, com palavras e imagens se que relacionassem com cada sexo. Essa proposta específica teve grande aceitação por parte dos estudantes,
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