Parecer fictício caso animais maltratado x associação religiosa
Por: kamys17 • 2/6/2018 • 1.786 Palavras (8 Páginas) • 401 Visualizações
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Compreendo que as religiões afro-brasileiras podem, assim como outras, abandonar rituais que não atendem mais aos princípios éticos contemporâneos. O exemplo exposto à cima mostra que já há a possibilidade de abolição de sacrifício de animais em seus cultos. Lembrando que não é possível levar em consideração a maioria das decisões e conceitos do século passado a cerca do tempo, pois estes estariam completamente ultrapassados.
O Brasil é um país oriundo de um processo de miscigenação, possuidor de uma sociedade culturalmente heterogênea, e por isso, há constantemente o conflito entre direitos culturais e fundamentais dos cidadãos, gerando a necessidade de se conhecer limites, obrigações e direitos, para que possa haver uma justa atuação das normas jurídicas.
Sendo oportuno fazer o seguinte questionamento: que tipo de movimento cultural, histórico ou religioso, pode justificar o encarceramento e sacrifício de um animal cuja natureza é a vida em liberdade?
Segundo Fernandes Portual, adepto a religião afro-brasileira, é possível verificar que:
Hoje só se faz sacrifício de animais ditos domésticos, faço essa ressalva porque antigamente se fazia sacrifício de animais dito silvestres. Por exemplo, o Veado, o “Adjapa” (tartaruga), o tatu já foram utilizados, como o lagarto e outros animais. Hoje só se faz de animais dito domésticos. Sacrificamos, o cabrito, a cabra, a codorna, a galinha da angola, o galo, a galinha, o galo, a franga, o pato, a pata, paturi, enfim, esses são os principais. São os Orixás que definem quais animais vão ser sacrificados. Existe um sistema, uma lógica, não é aleatório.
Este prossegue:
A relação de animais a serem sacrificados varia de acordo com o orixá ao qual se dirige a oferenda, mas, é possível apontar bodes, cabras, carneiros, porcos, pombos, codornas, patos, frangos, galos e galinhas como os mais típicos dos rituais de candomblé e umbanda.
A condição do animal de ser doméstico ou selvagem, não descaracteriza a conduta moralmente reprovável e até mesmo prevista em lei de sacrificá-lo ou torturá-lo independente de sua finalidade.
O reconhecimento das manifestações culturais e religiosas no sistema jurídico brasileiro é fruto de fatores históricos de uma grande parcela da sociedade brasileira, que inequivocamente merece amparo jurídico. No entanto, essa proteção constitucional não permite que outra garantia seja violada, sob o fundamento de se tratar de um direito fundamental.
Importante ressaltar que nenhum direito, ainda que fundamental, pode ser compreendido em seu sentido absoluto. Conforme leciona Silva Júnior, “no Estado Democrático de Direito brasileiro, não existe nenhum direito absoluto”.
A Constituição Federal de 1988 protege a fauna e a flora vedando às práticas que submetam os animais a crueldade: “art. 225 § 1º. […] VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.”
O direito de crença, assim, como qualquer outro dos direitos dispostos no texto constitucional encontra seu limite e termo, quando seu exercício entra em conflito com as demais normas previstas no sistema jurídico brasileiro.
Em interessante artigo Daniel Braga Lourenço sustenta que a prática de rituais religiosos, consistente na matança de animais não humanos, é condenável, filosófica, ética e juridicamente, constituindo tais condutas atos ilícitos que acarretam responsabilidade civil e criminal, devendo ser enquadradas nos tipos penais pertinentes, especialmente no previsto no art. 32 da Lei 9.605/98.
Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:Pena - detenção, de três meses a um ano, e multas
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.
§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.
Sendo assim, há a impossibilidade legal do sacrifício de animais em ritos religiosos, por se considerar que a liberdade religiosa não inclui a lesão ou a matança de animais, o que afrontaria o disposto no texto constitucional.
A liberdade de culto é a exteriorização da liberdade de crença e a sua manifestação também está assegurada, todavia, dessa liberdade não é absoluta, pois a prática de suas liturgias não pode afrontar princípios e regras já impostos pelo legislador e pela sociedade.
Sobre o reconhecimento do status moral dos animais, já foram consolidados vários estudos que justificam a consideração moral e certos direitos aos animais não humanos, dentre os quais os modelos de Peter Singer, Tom Regan, Gary Francione, Stevem Wise, Lawrence Johnson, Carlos Naconecy e Paul Taylor.
Para Singer: “Se a dor humana merece consideração, pelo efeito devastador que tem sobre a existência de quem a sente, o mesmo merece a dor de qualquer animal. Dor é dor”.
Argolo, advogada, esclarece que ao se querer atribuir aos animais não humanos a qualidade de sujeito de direitos, não se pretende que eles tenham todos os direitos estabelecidos no ordenamento jurídico, apenas defender a sua titularidade de direitos fundamentais básicos.
Conclui-se, que o discurso ético em favor dos animais decorre não apenas do dispositivo legal constitucional, mas dos princípios morais que orientam a conduta humana.
Contudo, apesar de normatizada, a violência contra os animais ainda é tratada de forma branda pela Lei n. 9.605/1998, que a classifica como de “menor potencial ofensivo”, em seu artigo 32, prevendo pena de 03 meses a 01 ano de detenção para quem a praticar, e, por isso, garantindo, dentre outros benefícios, o da possibilidade de transação penal antecedente à denúncia, quando preenchidos os requisitos legais, o que se revela de certo modo, vantajoso ao autor do fato.
Desta feita, conclui-se que não se deve tratar os animais apenas sob
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