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POPULAÇÕES TRADICIONAIS NAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Por:   •  30/3/2018  •  3.207 Palavras (13 Páginas)  •  197 Visualizações

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torno da presença de populações tradicionais em Unidades de Conservação. A maior evidência dessa polêmica gira em torno da própria definição do que é população tradicional, como veremos um pouco mais adiante.

O SNUC estabeleceu dois grupos de Unidades de Conservação: as de Proteção Integral e as de Uso Sustentável. As unidades consideradas de Proteção Integral são: Estação Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional, Monumento Natural e Refúgio de Vida Silvestre. De acordo com o §1º do art. 7º da Lei 9.985/2000, o objetivo das unidades de Proteção Integral é “preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos nesta Lei” . O outro grupo, o das Unidades de Uso Sustentável, é composto pelas categorias: Área de Proteção Ambiental, Área de Relevante Interesse Ecológico, Floresta Nacional, Reserva Extrativista, Reserva de Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e Reserva Particular do Patrimônio Natural. O §2º do supracitado artigo estabelece o objetivo das Unidades de Uso Sustentável: “compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais” .

A descrição de cada categoria de Unidade de Conservação está gravada a partir do art. 8º da Lei do SNUC até o 21º. Ressalte-se que a própria Lei, no parágrafo único do art. 6º, facultou a existência, excepcionalmente e a critério do Conama, de Unidades de Conservação criadas pelos Estados e Municípios que, concebidas para atender a peculiaridades regionais ou locais, possuam objetivos de manejo que não possam ser satisfatoriamente atendidos por nenhuma categoria prevista nesta Lei e cujas características permitam, em relação a estas, uma clara distinção.

Diante do estudado até agora, outra consideração importante é a distinção de Unidade de Conservação para terras indígenas e territórios remanescentes de comunidades quilombolas, que são criados e regidos por leis especiais.

Já que voltamos a tratar das populações tradicionais, continuemos sobre a polêmica da definição legal de população tradicional. O conceito jurídico que seria implantado pela Lei nº 9.985/2000 em seu art. 2º, inciso VX, foi vetado pelo Presidente da República quando de sua promulgação. Nas razões do veto, levadas ao Congresso pela Mensagem de Veto nº 967/2000, o presidente considerou a definição muito abrangente. O conceito de população tradicional que o projeto que originou a Lei nº 9.985 era o seguinte:

População tradicional: grupos humanos culturalmente diferenciados, vivendo há, no mínimo, três gerações em um determinado ecossistema, historicamente reproduzindo seu modo de vida, em estreita dependência do meio natural para sua subsistência e utilizando os recursos naturais de forma sustentável.

Na mensagem de veto, o então presidente Fernando Henrique Cardoso argumentou que se o conceito fosse empregado “com pouco esforço de imaginação" por meio do inciso XV era possível incluir “toda a população do Brasil”:

O conteúdo da disposição é tão abrangente que nela, com pouco esforço de imaginação, caberia toda a população do Brasil. De fato, determinados grupos humanos, apenas por habitarem continuadamente em um mesmo ecossistema, não podem ser definidos como população tradicional, para os fins do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. O conceito de ecossistema não se presta para delimitar espaços para a concessão de benefícios, assim como o número de gerações não deve ser considerado para definir se a população é tradicional ou não, haja vista não trazer consigo, necessariamente, a noção de tempo de permanência em determinado local, caso contrário, o conceito de populações tradicionais se ampliaria de tal forma que alcançaria, praticamente, toda a população rural de baixa renda, impossibilitando a proteção especial que se pretende dar às populações verdadeiramente tradicionais. Sugerimos, por essa razão, o veto ao art. 2º, inciso XV, por contrariar o interesse público.

Como se vê, a definição do que é uma população tradicional ficou em campo infralegal. Os antropólogos Mauro Almeida e Manuela Carneiro da Cunha acreditam que o termo é propositalmente abrangente. Segundo os pesquisadores, a discussão passa pela consideração ou não de que as populações tradicionais são aquelas que não estão inseridas no mercado, argumento prontamente afastado pelos antropólogos por desconsiderar a existência relevante de populações totalmente afastadas do mercado. A melhor solução seria considerar cada população isoladamente e verificar suas características para enquadrá-las como tradicional. Não obstante, os autores chegaram a uma característica comum:

O que todos esses grupos possuem em comum é o fato de que tiveram pelo menos em parte uma história de baixo impacto ambiental e de que têm no presente interesses em manter ou em recuperar o controle sobre o território que exploram. E, acima de tudo, estão dispostos a uma negociação: em troca do controle sobre o território, comprometem-se a prestar serviços ambientais. (grifo nosso).

É sobre esse caráter retributivo das populações tradicionais que nos debruçaremos no próximo momento deste estudo.

2. A MUDANÇA DE PARADIGMA SOBRE O PAPEL DAS POPULAÇÕES TRADICIONAIS DENTRO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Dando continuidade ao pensamento iniciado no capítulo anterior, devemos deixar claro que a acepção que se tem hoje de população tradicional mudou pari passu ao conceito que a sociedade tem de Meio Ambiente.

Os primeiros países a criar unidades de conservação desenvolveram o pensamento de que não era possível a presença humana em tais áreas. Entretanto, é fácil entender porque se pensava dessa forma há séculos devido à forma de ocupação territorial daqueles tempos, com baixa densidade demográfica e inexistência de áreas verdadeiramente ameaçadas.

No Brasil, por exemplo, em que os primeiros esforços na constituição de unidades de conservação têm no máximo 70 anos, tornou-se quase uma utopia a criação de reservas, parques e áreas de proteção sem uma tradicional, mansa e pacífica presença humana. Após observações empíricas que examinaram com maior profundidade a relação entre as populações tradicionais e o meio, chegou-se aos primeiros biólogos e ambientalistas que concordavam em realmente existirem populações cujas ações são de fato benéficas para a conservação do meio. Um exemplo dessas ações são as lutas de populações que têm impedido a devastação de lagos, rios e florestas. Sem a presença

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