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A CAÇA AS “BRUXAS” CONDUZIDA PELA INQUISIÇÃO: COMO O MALLEUS MALEFICARUM FOI DE SUMA IMPORTÂNCIA PARA SUA REALIZAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM A ATUALIDADE

Por:   •  30/4/2018  •  2.197 Palavras (9 Páginas)  •  342 Visualizações

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A religião católica, e posteriormente, a protestante, contribuem de forma decisiva para a volta da centralização do poder, através dos tribunais da Inquisição, que visava realocar dentro de regras de comportamento dominante as massas camponesas, principalmente as mulheres.

Sendo assim, os séculos de perseguição às bruxas não podem ser considerados uma histeria coletiva, já que foi uma perseguição calculada e planejada pelas classes dominantes, para maior centralização e poder.

Em um estado teocrático, a transgressão da fé era também a política. Mas também reinava naquele período a transgressão sexual, crescente entre a população de classes inferiores. Assim, os inquisidores ligaram a transgressão sexual à transgressão da fé, e as mulheres passaram a ter um grande “X vermelho” pintado em si, por serem os principais alvos de punição.

Mas a razão natural está em que a mulher é a mais carnal que o homem, o que se evidencia pelas suas muitas abominações carnais. E convém observar que houve uma falha na formação da primeira mulher, por ter sido ela criada a partir de uma costela recurva, ou seja, uma costela do peito, cuja curvatura é, por assim dizer, contrária à retidão do homem. E como, em virtude dessa falha, a mulher é animal imperfeito, sempre decepciona a mente. (MALLEUS, Parte I, Questão VI).

A mulher passa a ser interpretada como o símbolo da transgressão da fé, o ser abominável que tenta o homem. O sexo é colocado como o grande pecado, portanto, é mau e proibido, sendo exclusivo para procriação, e o poder se torna imune a crítica.

Portanto, a mulher, que antes era o símbolo da fertilidade das colheitas e animais, se torna a primeira pecadora, nociva aos homens e portadora de todos os males.

Quando cessa a caça as bruxas, o comportamento feminino tem uma drástica mudança. A sexualidade se regulamenta, as mulheres se tornaram frígidas, reduzidas exclusivamente ao âmbito doméstico, pois qualquer comportamento pecaminoso seria passível de castigo. O saber feminino se tornou um tabu, presente apenas na clandestinidade. O acesso ao saber pelas mulheres cessa, e elas passam a transmitir os mesmos valores sexistas patriarcais a seus filhos.

Com o controle restabelecido, o final do século XVIII trás uma sociedade de classes de trabalhadores dóceis, que não se atrevem a questionar o sistema e buscar conhecimento.

Deirdre English e Barbara Ehrenreich em seu livro Witches, Nurses and Midwives (The Feminist Press, 1973), nos dão estatísticas do que foi a queima de mulheres feiticeiras em fogueiras durante essa perseguição.

A extensão da caça às bruxas é espantosa. No fim do século XV e no começo do século XVI, houve milhares e milhares de execuções - usualmente eram queimadas vivas na fogueira - na Alemanha, na Itália e em outros países. A partir de meados do século XVI, o terror se espalhou por toda a Europa, começando pela França e pela Inglaterra. Um escritor estimou o número de execuções em seiscentas por ano para certas cidades, uma média de duas por dia, ‘exceto aos domingos’. Novecentas bruxas foram executadas num único ano na área de Wertzberg, e cerca de mil na diocese de Como. Em Toulouse, quatrocentas foram assassinadas num único dia; no arcebispado de Trier, em 1585, duas aldeias foram deixadas apenas com duas mulheres moradoras cada uma. Muitos escritores estimaram que o número total de mulheres executadas subia à casa dos milhões, e as mulheres constituíam 85% de todos os bruxos e bruxas que foram executados (EHRENREICH, 1983).

Outros cálculos levantados por Marilyn French, uma das maiores pensadoras feministas americanas, começa o seu livro Beyond Power (Summit Books, Nova York, 1985), mostra que o número mínimo de mulheres queimadas vivas foi de cem mil.

1.2 MALLEUS MALEFICARUM

O livro Malleus Maleficarum foi escrito pelos inquisidores Heinrich Kramer e James Sprenger em 1487.

É dividido em três partes, sendo elas: I) Das três condições necessárias para a bruxaria: o Diabo, a bruxa e a permissão de Deus Todo-Poderoso. II) Dos métodos pelos quais se infligem os malefícios e de que modo podem ser curados. III) Que trata das medidas judiciais tomadas contra as bruxas e também contra todos os hereges.

Para Carlos Amadeu B. Byington, médico psiquiatra e analista, membro da Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica; à luz de uma teoria simbólica da história, o livro é diabólico em sua concepção e redação. A primeira parte cuida de enaltecer o Demônio com poderes extremos e ligar suas ações com a bruxaria. A segunda parte é uma religião do Diabo que explica todos os males da vida individual e comunitária. Já na terceira parte, compreende-se como o livro é ardil em sua escrita, pois compreende as duas primeiras partes, sendo um escoadouro da patologia cultural acumulada no milênio da Idade Média.

Ainda que delirante, sádico e puritano, não está aí a essência da patologia do Malleus. Ele advém, fundamentalmente, de o texto ter o objetivo de defender e de enaltecer Cristo, o que o transforma, loucamente, num código penal redigido por criminosos eruditos, doutamente referenciados no que havia de melhor na teologia cristã. (BYINGTON, 2015, p. 24).

As principais teses defendidas no livro Malleus Maleficarum, para o expurgo feminino, são, em síntese, que o demônio, com a permissão de Deus, procura fazer o máximo de mal aos homens a fim de apropriar-se do maior número possível de almas. E este mal é feito prioritariamente através do corpo, único “lugar” onde o demônio pode entrar, pois “o espírito [do homem] é governa­do por Deus, a vontade por um anjo e o corpo pelas estrelas”. E porque as estrelas são inferiores aos espíritos e o demônio é um espírito superior, só lhe resta o corpo para dominar. E este domínio lhe vem através do controle e da manipulação dos atos sexuais. Pela sexualidade o demônio pode apropriar-se do corpo e da alma dos homens. Foi pela sexualidade que o primeiro homem pecou e, portanto, a sexualidade é o ponto mais vulnerável de todos os homens. E como as mulheres estão essencialmente ligadas à sexualidade, elas se tornam as agentes por excelência do demônio (as feiticeiras). E as mulheres têm mais conivência com o demônio “porque Eva nasceu de uma costela torta de Adão, portanto nenhuma mulher pode ser reta”. A primeira e maior característica, aquela que dá todo o poder às feiticeiras, é copular com o demônio. Satã é, portanto, o senhor do prazer. Uma vez obtida a intimidade com o demônio, as feiticeiras são capazes de

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