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Nascimento e morte do cuidado de si

Por:   •  11/12/2017  •  2.294 Palavras (10 Páginas)  •  475 Visualizações

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No entanto, as práticas do “cuidado de si” foram incorporadas tanto na moral cristã como na moral moderna não cristã. Porém, foram devidamente aclimatadas.

“Essas regras austeras, cuja estrutura de código permaneceu idêntica, foram por nós reaclimatadas, transpostas, transferidas para o interior de um contexto que é o de uma ética geral do não egoísmo, seja sob a forma ‘moderna’ de uma obrigação para com os outros – quer o outro, quer a coletividade, quer a classe, quer a pátria, etc. Portanto, todos esses temas, todos esses códigos do rigor moral, nascidos que foram no interior daquela paisagem fortemente marcada pela obrigação de ocupar-se consigo mesmo, vieram a ser assentados pelo cristianismo e pelo mundo moderno numa moral do não egoísmo”. (HS, p.14)

Contudo, Foucault acredita “haver uma razão bem mais essencial que esses paradoxos da “história da moral”[4] que é o que ele chamou – mesmo reconhecendo ser uma expressão ruim – de “momento cartesiano”.

Se no Alcibíades, Platão ao abrir a bifurcação para a interpretação do papel da filosofia, parece dar primazia ao “conhecimento de si” através de Sócrates, ele faz “uma espécie de ‘sobreposição dinâmica’ das duas noções, um ‘apelo recíproco’ a articulá-las, de modo que nenhum dos dois elementos deve ser negligenciado em proveito do outro”[5].

“Esquematizando muito sinteticamente o que já foi explicitado, podemos dizer que a dissociação entre ‘cuidado’ e ‘conhecimento’ de si está na origem de duas vias que marcam, na trajetória do pensamento filosófico, a concepção que se tem da filosofia e a correlata concepção do sujeito: na via em que predomina o ‘cuidado’, a filosofia é pensamento inseparável da prática de vida e a ela corresponde o sujeito de ações cuja verdade não tem essência nem substância porque se constitui e transforma-se continuamente; na outra via, a filosofia é conhecimento prioritariamente ‘representativo’ a que corresponde o sujeito do conhecimento cuja verdade é substância essencialmente invariável, já dada à constituída“. (Salma, p.59)

“Tendo chamado de ‘socrático-platônico’ aquele ‘momento decisivo’ em que ocorre o concomitante nascimento filosófico do ‘cuidado’ e do ‘conhecimento de si’, [Foucault] chamará, como dissemos de ‘momento cartesiano’ precisamente a este outro, não menos decisivo, que, consolidando o distanciamento entre ‘cuidado’ e ‘conhecimento’, deflagra na história de nosso pensamento ocidental um novo ‘começo’” (Salma, p.68-69)

“Portanto, é o cuidado de si, relativamente ao privilégio tão longamente concedido ao gnôthi seautón, que neste ano, gostaria de fazer reemergir.”[6]

Um “novo começo” é o que Foucault parece buscar nos antigos. Principalmente nos estoicos – muito pelo volume de material escrito produzido, o que não acontece com outras doutrinas da mesma época (idade de ouro do “cuidado de si”) – e nos epicuristas.

O filósofo, agora, busca – para fazer reemergir o “cuidado de si” – unir ou reunir o epistemológico, o ético, o político e o estético em uma nova reflexão sobre o sujeito “cuja verdade é indissoluvelmente construída na prática de sua própria conduta, cuja prática de si é simultaneamente cuidado com o outro, e cujo cuidado, enfim, faz de sua existência uma existência bela”[7]

Foucault nos convida a nos tornarmos aprendizes do cuidado de si, pois o momento atual carece.

- Contextualizando o estudo de Foucault com a necessidade do “cuidado de si” nos tempos atuais

Vivemos em uma época de uma espécie de Renascimento. Há um movimento em direção aos antigos, porém para pensar o tempo presente e construir um novo tempo futuro. No entanto, essa transformação se dá de forma muito lenta devido aos problemas das práticas de educação; praticadas sobretudo pelas escolas (instituições de sequestro, de acordo com Foucault). Urge daí a necessidade de se pensar novas práticas que possibilitem, de forma mais rápida e harmoniosa, a transformação tanto das instituições de ensino (em instituições que permitam indivíduos livres) quanto a transformação de si por si (o que seria já, a prática da liberdade) permitindo que a transição de nossa sociedade atual (que é vista com maus olhos pela maioria) em uma sociedade mais fraterna (“Formar-se e cuidar-se são atividades solidárias”) que aprenda a valorizar as diferenças como riquezas, em uma sociedade mais consciente de si.

Ele visa, certamente, uma sociedade mais feliz, por isso essa citação de Sêneca: “Quero que nunca deixes escapar a alegria. Ela abundará com a condição de estar dentro de ti mesmo...”

Em sua “segunda fase”, Foucault se depara com a eficácia do exercício na produção do sujeito – usará isso para pensar a filosofia e o cuidado de si como um modo de vida. Lá – na “segunda fase” -, ele analisou como os poderes exercidos sobre os indivíduos são capazes de moldar os corpos, a subjetividade destes. Foucault nunca perde de vista a sua grande questão, que é ponto central de seu estudo: a relação entre sujeito e verdade.

O conceito de verdade aparece para o filósofo – influenciado por Hegel – como algo que põe o sujeito fora de si, tira-o da posição que estava e modifica-o em direção a um novo sujeito. A verdade seria como uma forma de alteração no corpo do sujeito, fazendo assim um novo, - e possivelmente - totalmente diferente (sujeito) do momento anterior ao encontro com a verdade. Esse é o poder da verdade, é o que ela é capaz de fazer; modificar, moldar, lapidar o corpo do sujeito. Essa é, portanto, uma responsabilidade que deve ser assumida pelo indivíduo que decide cuidar de si.

E como uma “trama”, “rede” de poderes bem articulada de forma a conduzir a formação de sujeitos “padronizados” por meio da disciplina (poder normalizador). Por fim, parece que ele chega à conclusão que o sujeito é moldável e, portanto, passível de ser um objeto de “aperfeiçoamento” – não que exista um sujeito perfeito para Foucault, mas um sujeito que se transforma permanentemente a si próprio e desprende-se permanentemente de si através do modo de vida que busca o conhecimento de si e, sobretudo, o cuidado de si.

Muito influenciado por Nietzsche, Foucault aposta no trato da vida da mesma forma que uma obra de arte deve ser tratada – busca por estilo e beleza. Por isso, ele vai fazer uma genealogia das “artes de viver”. Diferenciando a “filosofia” - como entendida na tradição

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