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A ESCRITA ÍNTIMA NA PUBERDADE: A TESSITURA DE UM VÉU NO ENCONTRO COM O FEMININO

Por:   •  20/3/2018  •  2.015 Palavras (9 Páginas)  •  464 Visualizações

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No relato de uma adolescente siciliana, ela fala sobre os seus desejos mais íntimos e sobre o início da sua vida sexual com a busca desesperadora pelo seu verdadeiro amor, que faz com que ela ofereça o próprio corpo a qualquer um que solicite. Em seu texto, ela faz uma viagem em busca de “si mesma” e do amor. A jovem descreve sobre a observação que ela faz de seu corpo no espelho e fala sobre o seu encantamento com a nova forma que que começa a se delinear.

“Diante do espelho, eu me admiro, extasiada com as formas que vão pouco a pouco se delineando, com os músculos que ganham um contorno mais modelado e seguro, com os seios que começam a aparecer sob as camisetas e se movem suavemente a cada passo” (Panarello, 2004, p. 8).

As transformações físicas são rápidas demais na adolescência, por isso o jovem desconhece o seu corpo e fica sem saber como dele se servir. É o seu próprio corpo que lhe causa angustia e lhe é estranho.

“Sinto meu corpo arrasado e pesado, inacreditavelmente pesado. É como se alguma coisa muito grande tivesse caído em cima de mim e me esmagado. Não me refiro à dor física, mas a uma dor diferente, por dentro” (Panarello, 2004, p. 24).

É neste período também que o encontro com o outro sexo ganha corpo. É exatamente no momento em que o rapaz satisfaz aos ideais de sua virilidade e a moça se instala na identificação, momento de assunção do desejo, que o encontro fracassa. Há um mal-estar, um impasse na relação sexual. Os desencontros dos primeiros amores são paradigmáticos do impasse da relação sexual. De acordo com Lacan, quando chega a hora do rapaz fazer amor com as moças, é preciso que sonhe com isso, antes disso se ocupar.

A entrada da adolescência é um momento em que o sujeito ainda não se decidiu totalmente sobre suas escolhas e esse é um momento de decisão. A escolha do sintoma e a organização da fantasia se estabelecem extremamente cedo, mas são recolocadas parcialmente na adolescência. Essas escolhas deverão ser recolocadas tanto do lado da fantasia, posta à prova na puberdade, quanto do lado do sintoma. Elas são recolocadas mesmo se a estrutura clínica já está decidida. No entanto, as formas comportamentais, fenomenais e também a forma do sintoma com o sexo vão se encontrar modificadas na puberdade.

Segundo Stevens, (2004) a clínica da adolescência é proposta como clínica do sintoma. Mas se trata de uma resposta individual e como escolha de um sujeito. Na adolescência, há certo despedaçamento do imaginário diante da irrupção do real da puberdade (órgão marcado pelo discurso na ausência de um saber sobre o sexo). Na ausência de um saber, resta a cada um inventar sua própria resposta. Stevens descreve o real da puberdade articulando-o com três definições de real em Lacan: um primeiro conceito de real, articulável na disjunção entre a identificação simbólica e imaginária, disjunção esta acentuada no momento da adolescência em função do despedaçamento da imagem; um segundo conceito de real como aquilo que irrompe, que não tem nome e que vem modificar a imagem, que acontece no tempo do despertar da puberdade; e o real como a não-relação sexual, que faz retorno na puberdade. A adolescência é, pois, a enumeração de uma série de escolhas sintomáticas em relação a esse impossível, que é o real da puberdade.

Diante das exigências que se impõem ao jovem adolescente: passagem do pai à lei social na ampliação do pacto edípico ao pacto social, elaboração do luto dos pais infantis, ressignificação da relação com o corpo, escolha do objeto e da posição sexuais, além da escolha da perversão, a escrita de um diário pode ser um instrumento que possibilita esse trabalho psíquico, ou, a partir das considerações de Stevens (2004), o diário pode ser uma resposta do sujeito, uma escolha sintomática possível ao impossível do encontro com o real, próprio da puberdade.

Para Freud, a singularidade do desenvolvimento sexual feminino se dá por uma “espécie de involução” dos órgãos sexuais masculinos. Além disso, um novo recalcamento deve incidir sobre a atividade clitoriana, fazendo sucumbir ao recalque uma parte da vida sexual masculina das meninas. A menina, para tornar-se mulher, deve então organizar sua sexualidade em torno da vagina. A essência da feminilidade está relacionada à troca de zona erógena. O menino renuncia ao objeto incestuoso pela ameaça de castração e a menina tem a sua entrada no Édipo em função de uma privação real, a ausência de pênis. Freud estabelece três saídas para a mulher, diante da “inveja do pênis”: renúncia, masculinidade e feminilidade. A feminilidade é alcançada pela aceitação de sua condição de privação e por não buscar autoproporcionar-se o substituto fálico; ela o espera de um homem, especialmente sob a forma de um filho. O desejo do pênis então deve ser substituído pelo desejo de um filho do pai, para que se instaure a feminilidade. Esse é o impasse a que Freud chega com relação à feminilidade, pois ele equivale mulher e mãe, não ultrapassando o complexo de masculinidade.

Freud destaca que na passagem da infância para a adolescência algo se mantém intransponível, que é a perversão polimorfa. Ela é lançada no momento em que o sujeito deve identificar-se com o ideal de seu sexo. A fantasia é um recurso que o neurótico construiu e deve ajustar quando é chegado o momento do encontro sexual, mas é também um exílio para não ter que se haver com a sexualidade, como o que “faz buraco no real”. Segundo a autora, esse mal-entendido, apesar de estar marcado para os dois sexos, apresenta especificidades no homem e na mulher, que não fazem amor na mesma proporção. Enquanto a puberdade masculina se decifra como um sintoma obsessivo, a puberdade na mulher responde ao modelo histérico, cujo efeito principal, uma vez passado o estupor e a angústia, são o desgosto da sexualidade.

A passagem do corpo de menina para o corpo de mulher é confrontada com a questão da seguinte dúvida: o que quer uma mulher? Na ausência de um significante feminino, a adolescente constrói um semblante, velando a falta fálica. O ressentimento pela ausência de um significante feminino e

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