O ABANDONO AFETIVO DA PATERNIDADE BIOLÓGICA
Por: kamys17 • 23/5/2018 • 2.536 Palavras (11 Páginas) • 413 Visualizações
...
1.1 Princípios norteadores da indenização por danos morais pelo abandono afetivo
Nesse contexto, segundo o princípio da dignidade da pessoa humana, somos seres carregados de sentimentos e emoções que são experimentadas no plano dos afetos, sendo que o Estado não tem apenas o dever de privar‐se de praticar atos que atentem contra a dignidade, mas também de garantir ao ser humano o mínimo existencial para a efetividade deste princípio. (LOMEU, 2009)
Conforme o princípio da solidariedade familiar, que deve ser entendida como o que cada um deve ao outro. ( DIAS, 2011) Em se tratando de crianças e de adolescentes, este princípio é atribuído primeiro à família, depois à sociedade e por derradeiro ao Estado, que possui o dever de garantir com absoluta prioridade os direitos dos cidadãos que estão em formação.(LOMEU, 2009, p. 02) Cumpre destacar ainda um último princípio relacionado diretamente ao dano moral por abandono afetivo, o da afetividade, que se trata do princípio norteador das relações familiares e o direito a elas correspondente. (LOMEU, 2009, p. 03)
- Indenização por danos morais com fundamento no abandono afetivo
Considerando os princípios balizadores do nosso ordenamento jurídico, o afeto tornou‐se um valor tão importante no Direito de Família que o desafeto paterno passou a ser objeto de litígio e indenização por danos morais. (CAROSSI, 2010 p. 06) Desta forma, o cabimento ou não de danos morais por negativa de afetividade por parte dos pais é assunto que gera controvérsias, pois é no afeto que as relações familiares buscam o alicerce do crescimento da personalidade da pessoa humana. (DIAS, 2011)
É na família que se encontrará o esteio da vida, refletindo a concretização dos direitos fundamentais para o crescimento comum da criança. Restringir este direito subjetivo inerente à ela, omitindo‐se o pai de propor atenção e amor, configurará, então, abuso de um direito. (VIAFORE, 2007 )
Em relação ao direito familiar, sobretudo nas relações paterno‐ filiais, tal abuso enseja reparação do dano moral indireto, pois são ameaçados os direitos da personalidade do filho abandonado afetivamente. Esses direitos embora sejam despedidos de expressão econômica intrínseca, representam para o seu titular um alto valor, por se prenderem a situações específicas o indivíduo e somente ele”. (PEREIRA, 2006)
---------------------------------------------------------------
Assim, o dano causado pela ausência afetiva é antes de tudo um dano causado à personalidade do indivíduo. A base onde se assenta a idéia de reparação do dano moral está definida no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88). A responsabilidade pela reparação do dano moral terá o dúplice objetivo, o de compensar aquele que sofre o abandono afetivo e, ao mesmo tempo, corresponde a uma sanção aplicada ao pai. (PEREIRA, 2006)
Muito embora o dano psíquico seja um dos resultados da falta de afetividade do pai, há quem defenda que o ajuizamento de uma ação por danos morais com fundamento no abandono afetivo poderá também auxiliar a construir mais um trauma de difícil reparação. (VIAFORE, 2007) Assim, merece destaque a análise dos aspectos positivos e negativos desta ordem de reparação pela falta de afetividade da paternidade biológica.
3.1 Aspectos positivos do dever de indenizar
Quando se caracteriza a ofensa à dignidade, à integridade psicofísica e à personalidade de um filho, deverá este ser protegido inclusive dos atos lesivos de seus próprios genitores. Logo, é perfeitamente cabível a reparação do dano quando a necessidade afetiva do autor não for suprida. (LOMEU, 2009, p.06)
A reparação pela falta de afetividade pelo filho, embora expressa em pecúnia, não busca qualquer vantagem patrimonial em benefício da vítima. Na verdade, “revela‐se como uma forma de compensação diante da ofensa recebida, que em sua essência é de fato irreparável, atuando ao mesmo tempo em seu sentido educativo”, representando, assim, uma sanção aplicada ao pai e irradiando seu efeito preventivo. (VIAFORE, 2007, p.21)
Maria Berenice Dias (2011) revela ser favorável à indenização por abandono afetivo, ao defender que a indenização por abandono afetivo poderá constituir‐se em “instrumento de extrema relevância e importância para a configuração de um direito das famílias mais consentâneo com a contemporaneidade”, podendo até exercer um papel pedagógico no seio das relações familiares. Paulo Lobo (2008,
p. 284) também corrobora com este entendimento. Para ele, o artigo 226 da Constituição “não se resume ao cumprimento do dever de assistência material. Abrange também a assistência moral, que é dever jurídico cujo descumprimento pode levar à pretensão indenizatória”.
Desta forma, o abandono afetivo seria entendido com um inadimplemento dos deveres jurídicos de paternidade. (DIAS, 2011) Como não é possível obrigar ninguém a dar afeto, a indenização por danos morais consistirá em forma reparatória do abandono afetivo. Não estabelecer tal sanção à paternidade biológica consistirá, então, em uma premiação da irresponsabilidade e do abandono afetivo cometido pelo mesmo. (VIAFORE, 2007)
Nesse sentido, em recente decisão, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) obrigou o pai a indenizar sua filha em R$ 200 mil reais por abandono afetivo. A relatora ministra Nancy Andrighi em seu voto defendeu que “amar é faculdade, cuidar é dever”. Destacou ainda que ao se comprovar que essa imposição legal fora descumprida, implicará a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão, pois o pai omitiu‐se em seu necessário dever de criação, educação e companhia em relação à sua filha. Segue trecho do acórdão do respectivo caso em comento:
---------------------------------------------------------------
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ABANDONO AFETIVO. COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. POSSIBILIDADE. (...) 2. O
cuidado como valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/88. (...) Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia‐se, o necessário dever de criação, educação e companhia – de cuidado – importa em vulneração da imposição
...