A Teoria da desconsideração da personalidade jurídica
Por: Luísa Eulália • 21/10/2018 • Pesquisas Acadêmicas • 1.405 Palavras (6 Páginas) • 338 Visualizações
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica
Para compreender a teoria, primeiro devemos tentar compreender o problema.
Vamos tentar simplificar a ideia: você paga as contas dos seus vizinhos? Se eles não cumprem com suas obrigações, você pode ser acionado a cumpri-las? Ou seja, se o seu vizinho não paga a conta de luz dele, você pode ser obrigado a pagá-la?
Óbvio que não!
Pois bem. Também é assim com a pessoa jurídica e seus integrantes. Ou seja, os integrantes da pessoa jurídica (sócios, associados, administradores etc.) não respondem pessoalmente com seus bens pelas obrigações sociais.
A regra, portanto, é a de que os sócios não pagam as contas da sociedade. Ainda que haja tipos societários em que os sócios assumem a responsabilidade subsidiária pelas obrigações sociais, a regra legal continua sendo aquela, pois nessas, eles o fazem voluntariamente ao optarem pelo tipo.
É o chamado Princípio da Autonomia Patrimonial segundo o qual a personalização da pessoa jurídica implica a separação patrimonial entre a pessoa jurídica e seus membros. Sócio e sociedade são sujeitos distintos, com seus próprios direitos e deveres. As obrigações de um, portanto, não se podem imputar ao outro.
Quanto à isso, nada há de errado ou imoral. Porém, pessoas mal intencionadas podem pretender fazer uso dessa estrutura para fraudar credores, confundir patrimônio ou desviar a finalidade da sociedade sem comprometer (ou com a intenção de proteger) seus bens.
No texto base “Desconsideração da personalidade jurídica”, o professor Fábio Ulhoa Coelho dá exemplos bem didáticos desses maus usos possíveis (Confira!) e resume bem a ideia:
A sociedade empresária, em razão de sua natureza de pessoa jurídica, isto é, de sujeito de direito autônomo em relação aos seus sócios, pode ser utilizada como instrumento na realização de fraude ou abuso de direito (ULHOA, 2013, p. 58)
Justamente para evitar tal instrumentalização, ou melhor, para anular a eficácia do instrumento quando utilizado com esses fins é que surge a Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica.
Trata-se de uma teoria doutrinária que busca definir os critérios que autorizariam o afastamento da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas com o intuito de alcançar o patrimônio dos sócios.
Assim, a intenção de fraudar ou abusar de direito através da pessoa jurídica seria ineficaz diante da desconsideração da autonomia patrimonial da entidade em relação ao patrimônio dos sócios.
Segundo o professor Fábio Ulhoa (2013, p. 62 a 65), a teoria basicamente resulta em quatro princípios:
1º“O juiz, diante de abuso da forma da pessoa jurídica, pode, para impedir a realização do ilícito, desconsiderar o princípio da separação entre sócio e pessoa jurídica”.
2º“Não é possível desconsiderar a autonomia subjetiva da pessoa jurídica apenas porque o objetivo de uma norma ou a causa de um negócio não foram atendidos”.
3º“Aplicam-se à pessoa jurídica as normas sobre capacidade ou valor humano, se não houver contradição entre os objetivos destas (pessoas) e a função daquela. Em tal hipótese, para atendimento dos pressupostos da norma, levam-se em conta as pessoas físicas que agiram pela pessoa jurídica”. Desvio de finalidade.
4º“Se as partes de um negócio jurídico não podem ser consideradas um único sujeito apenas em razão da forma da pessoa jurídica, cabe desconsiderá-la para aplicação da norma cujo pressuposto seja diferenciação real entre aquelas partes”.
Por fim, pode-se acrescer que, como o ato jurídico de constituição de pessoa jurídica é um ato lícito (pressuposto da licitude), cabe aplicar a desconsideração apenas se a personalidade jurídica autônoma da sociedade empresária antepõe-se como obstáculo à justa composição dos interesses. Ou seja, se a autonomia patrimonial da sociedade não impede a imputação de responsabilidade ao sócio ou administrador, não há a necessidade de nenhuma desconsideração.
Tal teoria está contida no artigo 50 do nosso Código Civil:
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
E lembra-nos que os efeitos da desconsideração são temporários e específicos, não causando qualquer dissolução (total ou parcial) ou extinção em relação
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