A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DA CRIANÇA COMO LIMITE À PUBLICIDADE NO MERCADO DE CONSUMO
Por: Jose.Nascimento • 24/12/2018 • 9.440 Palavras (38 Páginas) • 354 Visualizações
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Este assunto é de suma importância não só para a esfera jurídica interna, mas para toda a comunidade internacional. Prova disso é o fato de ter seu reconhecimento presente nos pactos e convenções internacionais referentes à criança, tais como o que está disposto na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança de 1989.
É cediço que a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança a protege amplamente nos seus direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais. No entanto, é visível que no Brasil, a prática não é condizente com os atos devidamente ratificados no documento supracitado.
O descaso com as normas legais protetivas da criança pode ser confirmado através da publicidade ilícita diariamente veiculada em forma de comerciais apelativos direcionados a este público. Insta ressaltar que o simples fato da propaganda ser direcionada à criança já é considerado como ato abusivo, portanto, ilícito.
Parte-se do princípio de que a criança, como ser em formação, ainda não tem definido valores norteadores do ser humano, tais como: moral, afeto, respeito, dentre outros. Assim, considera-se que estaria sendo prejudicada com a legislação vigente, quando tem acesso a conteúdo televisivo que estimula a conduta inadequada, criando referenciais distorcidos daqueles valores.
Nesta esteira, o foco da pesquisa concentra-se em analisar a problemática suscitada em torno dos seguintes questionamentos: reconhecido que a criança não é capaz de exercer direitos e obrigações por si mesma, por não ter o discernimento necessário para exercê-los, tem sentido a publicidade para a criança? O Brasil, como signatário da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, estaria descumprindo não somente o tratado, mas a própria Constituição ao permitir a publicidade voltada para o público infantil?A publicidade voltada para o público infantil, na forma da legislação vigente, pode lesar os direitos da criança?
Escolheu-se este tema por acreditar que as mensagens contidas nos comerciais estão cada vez mais apelativas, pois, em sua maioria tratam a criança como adulto, como se estas possuíssem capacidade para reconhecer seus próprios limites, o que não é verdade.
Ademais, um comercial que atinge diretamente à criança tem o condão de provocar a falsa sensação de independência, causando graves conseqüências tais como o fomento ao consumo exacerbado, a falsa necessidade de possuir determinado produto, a desobediência aos pais, dentre outras. É sabido que as consequências geradas pela ineficiência legislativa, no que tange a proteção à criança, vão muito além do consumo, haja vista que trata-se de pessoa humana, em plena formação de seus valores morais, críticos, psicológicos, e também materiais.
O objetivo geral deste trabalho é analisar as bases legais da publicidade voltada para o público infantil, partindo do princípio de que a criança ainda não é um ser formado e seus valores norteadores ainda estão em formação, portanto, fáceis de serem distorcidos.
Enquanto que os objetivos específicos consistem em: identificar se a legislação vigente protege efetivamente a criança da publicidade ilícita; apresentar o conceito do princípio da dignidade da pessoa humana em face aos produtos ofertados às crianças através da publicidade e investigar os entendimentos de especialistas e doutrinadores a respeito do tema.
Este estudo teve como finalidade contribuir para a efetividade dos direitos da criança através da reflexão sobre sua incapacidade absoluta e a aplicabilidade das normas constitucionais concernentes à publicidade voltada a esse público. Pretendeu, ainda, em termos de pesquisa, discutir a necessidade em se fiscalizar a publicidade dirigida ao meio infantil.
O presente artigo apresenta uma estrutura composta de quatro capítulos. No primeiro, realizou-se uma análise da inserção da criança no ordenamento jurídico brasileiro, perpassando pela Constituição Federal de 1988, adentrando no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990, finalizando com a análise de documentos internacionais sobre a proteção da criança.
No segundo, o enfoque ocorre acerca da proteção da criança nas relações de consumo, destacando a origem do Código de Defesa do Consumidor, a relação jurídica de consumo e os sujeitos formadores desta relação, adentrando na publicidade, ressaltando-se os conceitos, as características e os sujeitos que atuam neste ramo de atividade. Na sequencia foram apresentados os princípios do CDC norteadores da publicidade, bem como as formas de publicidade ilícitas que exploram a deficiência de julgamento da criança.
Já no terceiro e último capítulo, foi realizado estudo sobre a atuação do CONANDA Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, acerca de sua atuação e atribuições, bem como foi apresentado alguns aspectos da Resolução nº 163 do referido Conselho, que tem por objetivo proibir toda e qualquer publicidade considerada abusiva direcionada às crianças.
CAPÍTULO I
A CRIANÇA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
- A criança na Constituição Federal de 1988
O advento da Constituição Federal Brasileira de 1988 fez surgir a proteção à criança, amplamente amparada por esse diploma proteção legal. Por sua vez, tal proteção tem amparo no Princípio da Dignidade da Pessoa humana, tido como direito fundamental.
Assim, ao elencar direitos e garantias fundamentais de todo ser humano, seja homem ou mulher, a Carta Magna promove os direitos e as garantias fundamentais também da criança.
O eixo basilar assegurador dos direitos e das garantias constitucionais repousa nos princípios constitucionais, conforme ensina Paulo Bonavides (2008, p. 288):
Em verdade, os princípios são o oxigênio das Constituições na época do pós-positivismo. É graças aos princípios que os sistemas constitucionais granjeiam a unidade de sentido e auferem a valoração de sua ordem normativa.
Insta destacar o entendimento do também constitucionalista Luis Roberto Barroso (2011, p. 204), a respeito da relevância dos princípios para o ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que estes são considerados alicerce das normas jurídicas:
Ao longo do processo evolutivo, consolidou-se na teoria do Direito a ideia de que as normas jurídicas são um gênero que comporta, em meio a outras classificações, duas grandes espécies: as regras e os princípios. Tal distinção tem especial relevância
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