Fichamento do livro - O Estado, o poder, o socialismo , do autor Nicos Poulantzas – 1980
Por: SonSolimar • 19/12/2018 • 2.177 Palavras (9 Páginas) • 527 Visualizações
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em termos de aparelhos repressivos e aparelhos ideológicos só pode ser considerada a título puramente descritivo e levando-se em conta as restrições já feitas. Tem o mérito de ampliar a esfera estatal, nela incluindo uma série de aparelhos de hegemonia, geralmente ‘privados’, e de insistir na ação ideológica do Estado e de sua ação que ainda permanece bem restrita (POULANTZAS, 1980, p. 40).
No geral, o Estado capitalista em seu conjunto se condensa na contradição intrínseca às lutas de classes e, deste modo, recondiciona o seu papel de modo a favorecer a classe hegemônica e desarticular a classe operária. Assim, “os aparelhos de Estado consagram e reproduzem a hegemonia ao estabelecer um jogo (variável) de compromisso provisório entre o bloco no poder e fração de determinadas classes dominadas” (p. 161). Neste sentido apesar de demonstrar a sobreposição da classe burguesa no que concerne ao estabelecimento da hegemonia no contexto do Estado capitalista Poulantzas (1980, p. 35) vai reiterar o caráter contraditório que perpassa as relações de classes ao demonstrar que, mesmo a contragosto dos pressupostos que embasam os interesses da classe burguesa, “o Estado também age de maneira positiva, cria, transforma, realiza” de modo a favorecer, mesmo que em menor medida, a classe operária.
Especificamente, Poulantzas (p. 33) vai asseverar que “a ideologia não consiste somente ou simplesmente num sistema de ideias ou de representações” mais também, em “uma série de práticas materiais extensivas aos hábitos, aos costumes, ao modo de vida dos agentes, e assim se molda como cimento no conjunto das práticas sociais, aí compreendidas as práticas políticas e econômicas”. Portanto, a ideologia não é algo neutro, pois só existe enquanto ideologia de classe. Nesse sentido:
A ideologia dominante, que o Estado reproduz e inculca, tem igualmente por função constituir o cimento interno dos aparelhos de Estado e da unidade de seu pessoal. Esta ideologia é precisamente a do Estado neutro, representante da vontade e dos interesses gerais, árbitro entre as classes em luta [...] (Poulantzas, 1980, p. 179).
Para Poulantzas (p. 179), “essas lutas se revestem de formas específicas: moldam-se no arcabouço material do Estado, segundo a trama de sua autonomia relativa”. E nesse sentido, o Estado capitalista estrito, a fim de preservar os interesses hegemônicos da classe burguesa, utiliza um duplo e unificado processo ideológico: o efeito de isolamento, que converte, através do sistema jurídico, os agentes sociais membros de uma classe em indivíduos particulares, sujeitos de direito, pessoas “livres e iguais” entre si; e o de representação da unidade, que consiste na capacidade do Estado de apresentar-se como unificador das classes sociais em função de “preservar os interesses” de uma parcela da sociedade e com isso se apresentar como mediador da vontade geral do povo nação. De outro modo, Poulantzas vai entender que é inviável compreender a forma de organização estatal, sem levar em conta o seu papel de mediador de conflito entre as classes.
Nesse sentido, outra estratégia de manutenção da divisão social de classes é o direito. Para Poulantzas, o direito, entendido como constructo de legitimação de relações sociais, apresenta uma dupla e unificada forma ideológica jurídica que se expressa nas contradições que perpassam as lutas de classes. No primeiro momento, Poulantzas vai relacionar direito e repressão e deduzir que o Estado capitalista não os dissocia, ao contrário, utiliza de maneira “legitima” o uso da violência como mecanismo de estabelecimento do controle das relações sociais. No segundo momento, vai acrescentar que a utilização do direito serve, de forma expressiva, como estratégia de manutenção dos indivíduos na classe de origem, ou seja, como legitimador das desigualdades socioeconômicas típicas do modo de produção capitalista
Deste modo, é observado que a lei é apresentada como a própria encarnação da razão e que somente na análise meticulosa da divisão socioeconômica do trabalho e da produção é que poderemos encontrar o significado apropriado do direito.
Com efeito, Poulantzas vai asseverar que quando as desigualdades sociais ganham dimensões que extrapolam os limites do consenso forjado, que têm no direito sua expressão jurídica, entra em evidência a autonomia relativa, constituída de igual forma, como monopólio privado do Estado capitalista de classes.
Deste modo, a autonomia relativa do Estado entendida como “relação entre Estado, de um lado, capital monopolista e conjunto da burguesia, de outro, relação que se coloca sempre em termos de representação e de organização política de classe” , consolida o bloco no poder na medida em que é “necessária igualmente para a organização da hegemonia” (1985, p. 161). Portanto, as contradições entre classes dominantes e classes dominadas se realizam dentro e fora do Estado.
Poulantzas (p. 165) vai afirmar ainda que apesar da presença das classes populares nos distintos aparelhos do Estado, fato histórico incontestável, mas que tomado em si mesmo e logo sem a superação da divisão socioeconômica, apesar de necessária, pouco modificaria a estrutura capitalista de organização estatal, na medida em que “a ação das massas populares no seio do Estado é a condição necessária para sua transformação, mas não é o bastante”, pois é evidente que:
O Estado organiza e reproduz a hegemonia de classe ao fixar um campo variável de compromissos entre as classes dominantes e classes dominadas, ao impor muitas vezes até às classes dominantes certos sacrifícios materiais a curto prazo com o fim de permitir a reprodução de sua dominação a longo termo (1980, p. 213).
Poulantzas, ao entender a não neutralidade do Estado no equilíbrio instável de forças entre a burguesia e o proletariado vai reiterar em sua abordagem o papel central das contradições para conjunto das relações sociais e, nesse sentido, vai asseverar que “as diferenças de tática, ou mesmo de estratégia política, numa conjuntura dada ou a mais longo prazo, frente às massas populares, são um dos fatores primordiais de divisão no seio do bloco no poder” (p. 165). Porém, “mesmo no caso de uma mudança da relação de forças e da modificação do poder de Estado em favor das classes populares, o Estado tende, a curto ou a longo prazo, a reestabelecer [...] a relação de forças em favor da burguesia” (Poulantzas, 1980, p. 164).
Neste sentido, as “desigualdades sociais de classe só são o efeito, sobre os agentes, das classes sociais, isto é, dos lugares objetivos que
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