Essays.club - TCC, Modelos de monografias, Trabalhos de universidades, Ensaios, Bibliografias
Pesquisar

A busca da normalidade diante do sofrimento psíquico

Por:   •  16/7/2018  •  1.513 Palavras (7 Páginas)  •  289 Visualizações

Página 1 de 7

...

De acordo com Bezerra (2013), nos manuais classificatórios como o DSM e o CID, em todas as suas revisões, os sintomas são classificados estabelecendo um conjunto de rótulos que aumenta consideravelmente a cada revisão, onde o estudo do sofrimento, além de ter perdido sua perspectiva fenomenológica caracterizada pela análise da experiência de estar deprimido, perdeu ainda sua dimensão psicodinâmica, a qual se perguntava o que se passava dentro do indivíduo, buscando demonstrar seus conflitos sob a forma de sintomas, numa tentativa de solucioná-los.

Ainda segundo Bezerra (2013), esta classificação possibilita imensas possibilidades de diagnósticos, ocasionando uma crise em sua legitimidade, chamando atenção à reflexão sobre o contexto em que os conceitos psicopatológicos emergem, tendo como cenário uma sociedade caracterizada pela perda de sua normatividade regulada pelas grandes agências nômicas, as quais cedem lugar à autonomia, à possibilidade de discussão sobre o que é certo e errado, ao estabelecimento de referências norteadoras, empoderando a ciência como portadora de uma verdade objetiva e indiscutível, possibilitando ao indivíduo definir sobre sua forma de atuar em sociedade.

Além desse panorama no contexto social, os avanços dos medicamentos e drogas como ansiolíticos, antidepressivos, neurolépticos e outros, possibilitam uma existência social às pessoas portadoras de sofrimento psíquico, concedendo à psicopatologia o status de exercício cultural, onde as classificações psiquiátricas refletem o panorama histórico e social de determinado contexto, modificando frequentemente o conceito de normalidade, do que é ser normal.

No exercício cultural realizado pela psicopatologia, importa considerar ainda na questão da normalidade, a menção de Dalgalarrondo (1982, p. 59) sobre a questão da cultura na formação e entendimento de seus conteúdos impressos pelas neuroses e psicoses, considerando-as em suas diferenças, em sua etiologia e em seus tratamentos, tais como são realizados pelas populações locais, construindo uma semiologia própria, perpassada pelas tradições e folclores circunscritos a determinadas regiões, estudadas pela psiquiatria transcultural, fazendo com que essas considerações sirvam de apoio para a compreensão da amplitude dos conceitos de normalidade à luz da psicopatologia.

Considerando a questão da transculturalidade como um espaço capaz de comportar as diferenças em sua normatividade, Bezerra (2013) apud CANGUILHEM (2006, p. 116) atravessa o conceito de normalidade pela normatividade, onde ser normativo é ser capaz de manter a própria vida, de manter a própria diversidade e se reproduzir, onde ser saudável não é não ter doenças, e sim poder passar pelo sofrimento, passar pela doença e se recuperar. Onde o patológico não é o desvio estatístico, mas o desvio normativo, onde a doença não está relacionada com o fato de ser diferente ou de uma ausência de normas, mas com a incapacidade ou dificuldade de instituir normas que permitam a expansão da vida, onde: “O patológico não é a ausência de norma biológica, é uma norma diferente, mas comparativamente repelida pela vida” (CANGUILHEM, 2006, p.103).

Isso posto, a controvérsia do limite entre a normalidade e a patologia torna-se fascinante quando apoiada nos conceitos exarados, uma vez que os limites definidos pela semiologia desconstroem-se para ceder espaço a uma ampla gama de pessoas normais e outras nem tanto, implicadas em desenvolver uma forma de vida própria, apesar das diferenças, onde a busca é pelo sentido existencial, considerando as relações interpessoais e a própria solitude, onde o sofrimento psíquico é atravessado pela irrealidade, explanado brilhantemente por Laing (1927, p. 38), ao enfatizar que fingir ser real ao longo da vida, gera a necessidade de confessar segredos próprios, mesmo que essa confissão remeta à solidão irremediável do território íntimo, onde as pegadas deixadas, o são pelos protagonistas de sua própria história, independente de sua aparente normalidade.

Na busca pela normalidade importa considerar o que é brilhantemente expresso por SEIXAS (1977), em sua composição chamada Maluco Beleza, a qual segue, numa tentativa de se refletir sobre loucura e normalidade, permitindo que se interpenetrem, permeando a subjetividade de cada um, seja na loucura que se normatiza, seja na normalidade que se enlouquece:

Enquanto você

Se esforça pra ser

Um sujeito normal

E fazer tudo igual

Eu do meu lado

Aprendendo a ser louco

Um maluco total

Na loucura real

Controlando

A minha maluquez

Misturada

Com minha lucidez

Vou ficar

Ficar com certeza

Maluco beleza

Eu vou ficar

Ficar com certeza

Maluco beleza

E esse caminho

Que eu mesmo escolhi

É tão fácil seguir

Por não ter onde ir

Controlando

A minha maluquez

Misturada

Com minha lucidez

Eeeeeeeeuu!

Controlando

A minha maluquez

Misturada

Com minha lucidez

Vou ficar

Ficar com certeza

Maluco beleza

Eu vou ficar

Ficar com certeza

Maluco beleza

Eu vou ficar

Ficar com toda certeza

Maluco,

...

Baixar como  txt (11 Kb)   pdf (56.4 Kb)   docx (16.8 Kb)  
Continuar por mais 6 páginas »
Disponível apenas no Essays.club