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O Processo de Kafka à luz das Garantias Processuais

Por:   •  27/9/2018  •  3.337 Palavras (14 Páginas)  •  257 Visualizações

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Nesse primeiro momento da acusação a garantia do contraditório também foi violada, pois ao saber que é acusado, a K. é negado o direito de reagir a acusação, a alegar-se inocente, ele não pode plenamente afirmar que nada fez. É também atributo do princípio do contraditório, na fase inicial do processo, a exposição dos fatos ao qual o indivíduo é citado ou acusado, para que ele tenha ciência da situação em que se encontra e possa defender-se, dando viabilidade material ao princípio da ampla defesa, o que não se verifica no caso de Josef K.

Pode-se perceber, também, que desde o início os agentes da justiça negam-se a trabalhar de acordo com a publicidade dos atos jurídicos. Tanto os guardas quanto o inspetor em momento algum explicam com detalhes as motivações do processo e as suas implicações para K., justificando não terem eles o acesso a essas informações e não ser direito de K., pelo menos de início, buscá-las, o que faz com que ele não entenda o que ocorre e por conseguinte não saiba como agir e como se defender. A garantia da publicidade exige que o Estado deixe a disposição da população em geral e principalmente das partes as informações sobre os atos processuais e o seu andamento, salvo em disposição contrária da lei, como é disposto no artigo 5°, inciso LX da Constituição Federal, segundo o qual:

"LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;"

A garantia constitucional da publicidade dos atos serve para que o processo ocorra de forma clara perante à sociedade, o que lhe confere legitimidade, pois impede que a polícia e os Órgãos jurisdicionais conduzam o processo com arbitrariedade ou incoerência, podendo as decisões judiciais que sejam afetadas pela não-publicidade serem julgadas nulas. O publicidade dos atos serve também para que as partes interessadas tomem ciência do que lhes diz respeito e possam melhor proteger os seus interesses, o que é a maior prerrogativa de Josef K. A publicidade pode ser genérica, quando ela é aberta para toda a população, ou especial, aquela dirigida somente as partes interessadas e aos seus representantes legais.

Por fim, destaca-se na cena, por meio da fala do inspetor para Josef K., a constatação de que, durante esse processo, o acusado não goza da presunção de inocência. Primeiramente pois ele, de pronto, já foi preso por determinação da justiça, antes de qualquer procedimento e sem sequer o seu conhecimento. A presunção de inocência encontra-se positivada na Constituição Federal no artigo 5°, inciso LVII, que lê-se:

"LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”

A presunção de inocência preconiza que ninguém pode ter a sua liberdade restringida antes de ser considerado culpado por sentença judicial, com exceção nos casos em que é concedida a medida cautelar, se comprovado que está é necessária. Senhor K., no entanto, não havia sido considerado culpado ainda pelas autoridades competentes, mas já tinha a sua liberdade restringida, e não podia alegar a sua inocência, pois poderia influenciar desfavoravelmente a decisão do magistrado, que já admitia como pressuposto que, se ele tinha sido acusado, tinha feito alguma coisa para justificar isso, e, portanto, não seria tão inocente assim.

Após esse primeiro contato com a instituição da justiça que o prendeu, K. é convocado para um primeiro interrogatório, que é conduzido de forma desorganizada em uma audiência pública na presença de um juiz de instrução. Ao se pronunciar em sua defesa, antes de qualquer manifestação por parte do juiz encarregado de interrogá-lo, ele foi repetidamente interrompido pela população que assistia e comentava a sessão, o que causou revolta em K., que saiu da audiência antes de seu término.

Na semana seguinte Josef K. esperou por mais um contato da justiça convocando-o para uma audiência, mas isso não ocorreu, e durante uma semana ele recebeu apenas o silêncio, sem ter idéia de como andava o seu processo e de como ele devia proceder. Portanto, ele decide comparecer ao mesmo lugar no mesmo horário, e encontra a sala de audiências vazia, e tem que procurar as informações sobre próximas audiências por conta própria. Essa situação se passa na página 37 do livro, e nela podemos constatar a violação de mais um princípio que rege o processo, o princípio da verdade real, que é utilizado no processo penal, mas pode ser relacionado ao caso de K., por ele já estar preso e sendo julgado. O princípio da verdade real suscita que o objetivo em um processo não é punir nem inocentar, mas sim aproximar-se ao máximo da verdade real no caso, cabendo ao magistrado e à justiça prosseguir com o andamento do processo e com a investigação e constituição de provas mesmo quando há a inércia das partes. No caso de K. inverteu-se o ônus da prova, no momento em que, apesar de ter ele sido acusado, ele mesmo tem de procurar a justiça para provar a sua inocência enquanto ela é inerte, ao invés de ter a justiça que responsabilizar-se por garantir os meios para que as provas do caso sejam colhidas e averiguadas, e para que o seu processo seja contemplado e ele seja julgado inocente ou não.

No capítulo "O Verdugo" vemos novamente uma violação ao princípio constitucional do Devido Processo Legal, à medida que os dois guardas que num primeiro momento fizeram K. cativo em seu quarto e lhe apresentaram a notícia de que estava preso, após a denuncia de K. durante a sua audiência com o Juiz de Instrução de que esses homens haviam tentado apossar-se de seus bens pessoais, são punidos com um castigo corporal, efetuado por um funcionário da justiça que lhes feriu com uma vergasta. Esses homens não tiveram acesso ao devido processo legal, com um processo para apurar a sua conduta, e a partir apenas de uma denúncia, foram considerados culpados e receberam castigos cruéis. Eles também não tiveram acesso à ampla defesa, pois nem puderam se defender contra as acusações que lhes foram feitas.

Mais adiante na história, à exata 1:00 hora do filme de 1993, Josef K tem uma conversa com a empregada de um proeminente advogado que o seu tio, perplexo com o fato de que um caso criminal estava sendo movido contra o seu sobrinho, o leva para visitar, a fim de prestar assistência e dar-lhes conselhos jurídicos concernentes ao caso. K. conversa com a jovem, chamada Leni, sobre o seu caso, e ela lhe confidencia que o único jeito dele escapar desse tribunal era confessando ser culpado da acusação que lhe foi feita. Ela afirma

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