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O PROCESSO POLÍTICO, JURÍDICO, BISCOITO OU BOLACHA? UMA ANÁLISE DO IMPEACHMENT

Por:   •  25/11/2018  •  10.114 Palavras (41 Páginas)  •  270 Visualizações

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Alguns pontos importantes dessa discussão aparentam ter sido secundarizados, e este artigo pretende chamar mais atenção para eles: (i) o desenvolvimento histórico do instituto do impeachment e (ii) o caráter político da Suprema Corte Federal. A importância da retomada histórica tem como fundamento uma resposta mais objetiva (ao menos em relação às outras análises), explicitando qual foi o planejamento e fins do legislador. Entretanto, as respostas no campo do direito não podem ser pautadas apenas na teleologia original das leis, o que dificultaria muito a possibilidade de normas se adaptarem ao passar do tempo sem a completa mudança do texto legal. É frutífero aqui fazer algumas perguntas subsequentes: qual seria a discrepância entre o julgamento político e o jurídico? Existe realmente entre essas formas alguma diferença significativa, considerando quem são os agentes e instituições responsáveis por elas?

Ambas as investigações deverão passar pelo sistema jurídico dos Estados Unidos da América, mas por motivos diferentes. O instituto do impeachment foi primeiro desenvolvido lá, sendo posteriormente adaptado para o Brasil: é essencial ter cuidado aqui, pois a incorporação muitas vezes é incompleta ou distorcida, seja intencionalmente ou não. Dessa forma, é mais fácil encontrar uma estrutura e motivações do instituto ao se observar sua fonte originária, ao mesmo em tempo que a identificação das disparidades na adaptação podem expôr variações consideráveis tanto nas razões quanto no funcionamento do processo. Em relação ao ponto (ii), os EUA também são o berço da chamada Political Jurisprudence, linha de pesquisas e doutrina que tenta evidenciar o que há de político nos tribunais e no judiciário como um todo. Esse campo de estudos é muito menos desenvolvido nos países cuja tradição jurídica provém majoritariamente da doutrina europeia, como é o Brasil, pois nesses lugares sempre houve maior foco nos efeitos das decisões judiciais, e não com elas são tomadas.

Assim, lembrando sempre das particularidades do Supremo Tribunal Federal (que atua também como corte constitucional) e do processo de impeachment de 2016 como algo que desencadeou certa ruptura constitucional/institucional, é possível chegar a alguns apontamentos pertinentes que não poderiam faltar ao tema. Esses apontamentos podem revelar motivos não explícitos na defesa pelo caráter jurídico ou político do julgamento, além da conveniência de todo o debate.

2 O IMPEACHMENT E SUA CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

O impeachment permanece como um dos mais interessantes, complexos e radicais mecanismos do sistema de checks and balances. Isso se deve por inúmeros motivos, sendo destacados, entre eles, o alto teor simbólico – mormente ao se tratar de impeachment de Presidente da República – o seu caráter totalmente excepcional e, principalmente, as dúvidas e incertezas sobre ele. Quanto ao último ponto, as opiniões de dois membros do Poder Legislativo sobre o tema exemplificam: Michel Temer, na Assembleia Constituinte de 1988 chegou a afirmar que o impeachment era uma peça de museu, de antiquário, não sendo utilizado em qualquer esfera governamental[4]; o Representative Robert Michael, afirmou, em 1957, que o impeachment nunca esteve na agenda da Casa [House of Representatives], e que “nós nem sequer pensamos nisso”.[5]

Define-se, aqui, impeachment como o instrumento constitucional através do qual o Poder Legislativo, utilizando a toga do Judiciário, processará e julgará altos agentes públicos por condutas reprováveis – não necessariamente criminosas – tendo como consequência o afastamento do cargo e a inabilitação para exercício de função pública durante prazo limitado. Esta definição é oriunda, além da doutrina, da experiência estadunidense e brasileira do instituto. Neste sentido, crê-se necessário um traçado histórico do impeachment a fim de poder verticalizar as características trazidas.

Na construção estadunidense da teoria dos checks and balances[6] a divisão do poder ocorre de duas maneiras: a primeira é aquela observada dentro do próprio ente federativo sendo dividido entre Legislativo, Executivo e Judiciário; a segunda, por sua vez, é uma consequência da opção pelo Federalismo, fazendo com que o poder seja repartido em dois governos distintos, os quais exercerão mútuo controle.[7]

Um instrumento de controle, em especial, gerou grandes polêmicas na Convenção Federal: a possibilidade de impeachment.[8] Poderia o Presidente da República ser afastado? Muitos problemas foram apontados, o principal consistia na alegação de que o Presidente poderia ficar refém de seus julgadores, chegando, inclusive, a se cogitar a criação de um tribunal de impeachments.[9]O membro mais velho da Convenção, Benjamin Franklin, afirmou que “quando um oficial público se torna obnóxio, ele sempre poderá ser assassinado”. Com essa brincadeira, Franklin defendeu o impeachment alegando que ele seria a melhor maneira de punir o Executivo quando cometesse uma conduta reprovável e de absolvê-lo quando fosse injustamente acusado.[10]

Procurando evitar a utilização do impeachment como forma de ameaça, dividiu-se-o em duas etapas: o momento da denúncia, a qual deverá ser recebida pela House of Representatives, para, caso aceita, dar início ao julgamento pelo Senado. Neste ponto, é de ressaltar outra característica, a qual foi também adotada pela Brasil, mesmo partindo de estruturas diferentes. Nos Estados Unidos da América, o Vice-Presidente da República também é o Presidente do Senado.[11] Diante disto, para garantir a imparcialidade do julgamento de impeachment do Presidente da República, o Chefe de Justiça dos Estados Unidos (Chief Justice ofthe United States) assume a presidência temporária, afinal, o Vice-Presidente teria interesse direto no julgamento. Nos casos de impeachment de outros cargos, a presidência do Senado continua sendo exercida pelo Vice-Presidente.[12] Destarte, o fato do chefe do Poder Judiciário assumir a presidência do processo é única e exclusivamente para garantir a imparcialidade e não a juridicidade do impeachment, o que não haveria necessidade no Brasil, mas acabou por se tornar um costume. Ratificando posição de processo político (pois oriundo do Congresso Nacional), a admissão do impeachment no sistema estadunidense é votado pela House of Representative no formato de legislação, possuindo a estrutura de artigos e seções, conquanto não haja um modelo definido.

Outro ponto de debate residiu na discussão de quais condutas seriam passíveis do processo de impeachment, afinal, ele não se confunde com o processo criminal, devendo ter como

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