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CRIMES CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO: EXPLORAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL

Por:   •  14/5/2018  •  7.202 Palavras (29 Páginas)  •  473 Visualizações

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Dito isto, na próxima seção procede-se à exposição do primeiro momento do estudo, qual seja: a análise da exploração do trabalho infantil numa perspectiva histórica.

1 A FUNDAMENTAÇÃO HISTÓRICA

1.1 AS PÁGINAS DA ESCRAVIDÃO

A exploração da mão de obra infantil não configura nenhuma novidade. Pelo contrário, trata-se de uma realidade moldada a partir da cultura advinda do período colonial brasileiro e perpetuada até a atualidade.

Segundo Mary Del Priore1, “[...] enquanto pequeninos, filhos de senhores e escravos compartilham os mesmos espaços privados: as salas e as camarinhas. A partir dos sete anos, os primeiros iam estudar e os segundos trabalhar.” Tal situação demonstrava, portanto, que desde muito cedo, mesmo sem saber, as crianças indígenas e negras já eram exploradas em sua força de trabalho, posto que, para os filhos dos “brancos”, aqueles não passavam de meros objetos de entretenimento, conforme explicam Veronese e Custódio2 ao escreverem que “Portanto, os meninos das elites recebiam como companheiro para as brincadeiras um menino indígena (curumim) e depois um menino negro (muleque) que seria para tudo: do amigo ao cavalo de montaria.”

A percepção da fácil e lucrativa utilização da mão de obra escrava também infantil, logo foi evidenciada e sua execução amplamente efetuada pela coroa portuguesa e pelos “nobres” da colônia que por muito tempo se valeram deste artifício, tanto que, como relata Priore3,

Dos escravos desembarcados no mercado do Valongo, no Rio de Janeiro do início do século XIX, 4% eram crianças. Destas, apenas um terço sobrevivia até os dez anos. A partir dos quatro anos, muitas delas já trabalhavam com os pais ou sozinhas, pois perder-se dos seus genitores era coisa comum. Aos doze anos, o valor de mercado das crianças já tinha dobrado. E por quê? Pois considerava-se que seu adestramento já estava concluído e nas listas dos inventários já aparecem com sua designação estabelecida: Chico ‘roça’, João ‘pastor’, Ana ‘mucama’, transformados em pequenas e precoces máquinas de trabalho.

Com isso percebe-se que, nas palavras de Veronese, “A inserção precoce de crianças no trabalho era estabelecida sem maiores questionamentos sobre os prejuízos ao seu desenvolvimento. A frequente mortalidade de crianças era naturalizada numa sociedade que pouco valorizou a vida na escravidão.”4 Comprovada tal premissa pelo fato relatado mais adiante de que, sendo filho de escravos, “A partir dos quatro até os onze anos, a criança passaria a ter, de forma gradual, o tempo ocupado pelo trabalho.”5

Confirmando esta tese, escreve José Roberto de Góes6 lecionando que:

Assim é que, comparativamente ao que valia aos quatro anos de idade, por volta dos 11, chegava a valer até duas vezes mais. Aos 14 anos a freqüência de garotos desempenhando atividades, cumprindo tarefas e especializando-se em ocupações era a mesma dos escravos adultos. Os preços obedeciam a iguais movimentos.

A abolição da escravatura, conhecida como Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel em 1888, em consonância com a revolução industrial que vinha se dando em todo o mundo, em nada representou uma melhoria para os, agora, ex-escravos e, em especial para as crianças, como fica claro ao lermos que:

[...] a transição da escravidão para o trabalho livre não viria significar a abolição da exploração das crianças brasileiras no trabalho, mas substituir um sistema por outro considerado mais legítimo e adequado aos princípios norteadores da chamada modernidade industrial. O trabalho precoce continuará como instrumento de controle social das classes, surgindo, a partir daí, outras instituições fundadas em novos discursos.7

Assim, deu-se a passagem do período colonial para a república, inserindo o Brasil na modernidade sem, no entanto, dar encaminhamento para a situação da criança que continuava sendo explorada em sua força de trabalho como veremos a seguir.

1.2 O RECRUTAMENTO INFANTIL PELAS FÁBRICAS

Com o advento da modernidade preconizada pela revolução industrial, teremos, então, que:

O início da primeira experiência de industrialização no Brasil, ainda no século XIX, articulada com a suposta abolição da escravatura irá conduzir contingente significativo de crianças as fábricas, agora sob o discurso que o trabalho da criança ajuda a família.”

No século XIX, portanto, era comum o emprego de mão-de-obra infantil, sob a justificativa que somente o trabalho moldaria o caráter da criança. E assim, o sentido da infância foi realmente consumido em muitas fábricas, minas e lavouras.

Ao final do século XIX, com o início do nosso processo de industrialização, tivemos a entrada de um número significativo de imigrantes. Neste período configura-se uma nova imagem: de crianças nas fábricas. Estas crianças substituíam por um baixíssimo custo o trabalho dos escravos.

Esta situação provocava uma vitimização da infância nos acidentes de trabalho.8

Ao final do século XIX a utilização de mão de obra infantil, além de uma realidade, tratava-se de algo corriqueiro e considerado normal na sociedade, mesmo considerando as condições precárias que lhes eram dadas para o exercício efetivo de suas funções. Neste sentido, a Professora Esmeralda Moura escreve que "Em meados da década de 1870, multiplicaram-se na imprensa de São Paulo anúncios que solicitavam o trabalho de crianças e adolescentes nas fábricas, em especial, no setor têxtil.”9 Neste mesmo sentido, complementa Veronese escrevendo que:

As condições de trabalho nas quais foram submetidas essas crianças nessa época eram realmente desumanas, pois além de uma jornada estafante de trabalho muito além das capacidades físicas de um adulto, as crianças eram submetidas, já desde cedo, à convivência com locais insalubres e perigosos, que muitas vezes abreviavam a própria vida. Essas duras condições serviram como alerta para a necessidade de disciplinamento jurídico do trabalho infantil..”10

As crianças eram cada vez mais utilizadas em condições subumanas, sem qualquer garantia ou proteção contra as constantes situações de insalubridade a que eram submetidas. Tais fatores levaram à edição, em 17 de janeiro de 1891, do Decreto 1.313 que fixava em doze anos de idade a idade mínima para a admissão de crianças, embora tal decreto jamais tenha sido

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