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A Matemática dos Tribunais: o caso dos Collins

Por:   •  18/12/2018  •  1.950 Palavras (8 Páginas)  •  256 Visualizações

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Malcolm havia pago uma multa de $35 no dia seguinte ao assalto, uma quantia significante para a época e também quanto Juanita apurava ter em sua bolsa. Quando questionados sobre a origem do dinheiro, Janet respondeu ter usado suas economias, mas Malcolm disse ter ganho em uma casa de apostas. A divergência de suas respostas e a coincidência de valores fez com que o detetive ficasse ainda mais certo da culpa do par.

Antes da audiência preliminar, Janet fraquejou em defender-se: estava preocupada com seu marido. Malcolm era negro, desempregado e tinha histórico criminal, se fosse acusado, cumpriria muitos anos de prisão. Chamou o detetive e perguntou se, caso ela se entregasse como única culpada, o marido sairia ileso. Kinsley chamou Malcolm para participar da conversa, mas não conseguiu extrair muito mais do que já possuía. O casal decidiu que deveria pensar um pouco mais e esperar o julgamento para tomar decisões.

JULGAMENTO E SENTENÇA

O caso era fraco. A quase confissão de Janet não poderia provar nada, era uma mulher pobre e ignorante, não estava acostumada a lutar por seus direitos e acreditava que não conseguiria se safar. As maiores evidências envolviam o físico do casal, mas mesmo essas não eram inteiramente compatíveis: o cabelo de Janet era loiro claro e ela comprovadamente trajava roupas claras no fatídico dia; já Malcolm não tinha barba.

Durante o julgamento, todos os levantamentos feitos contra o casal foram debatidos pela defesa. Nada era suficiente para prendê-los, nenhuma das evidências era concreta. O casal ainda testemunhou por sua defesa, e mais uma vez negaram envolvimento no crime. Quando tudo parecia terminado, surgiu o último recurso: o promotor Ray Sinetar.

“Ocorreu a Sinetar que talvez fosse possível provar que os Collins eram o casal certo calculando a probabilidade de qualquer casal na área de Los Angeles compartilhar as mesmas características distintivas, por mais vagas que fossem: casal misto, carro amarelo, bigode e barba, rabo de cavalo louro.”

A ideia de Sinetar era utilizar a regra do produto – se dois eventos são independentes, então a probabilidade de que ambos ocorram é obtida multiplicando-se as probabilidades de cada evento acontecer sozinho – para justificar a culpabilidade do casal, tendo em vista que a probabilidade de algum outro casal de Los Angeles reunir todas aquelas mesmas características é quase 0.

Com auxílio de um matemático, Sinetar deu números aleatórios a probabilidade de um carro qualquer ser amarelo ou uma mulher ter os cabelos presos em rabo de cavalo, por exemplo. A partir desses números, chegou à conclusão de que a probabilidade de um outro casal ter as mesmas características que os Collins em toda Los Angeles era de uma em 12 milhões.

Depois de muitas horas de análise, o júri condenou o casal como culpado. A mudança da análise de provas sólidas por cálculos matemáticos causou grande choque e exposição, e um caso de roubo de bolsa ficou conhecido em todo estado, tendo artigos referentes a ele publicados em grandes veículos de notícia, como a Time.

“De certa forma, o que o júri fez naquele dia não foi determinar se o casal Collins era ou não culpado. Na verdade, o que fez foi emitir um julgamento sobre se o cálculo matemático podia ou não substituir evidências concretas.”

Janet Collins resolveu cumprir sua pena sem recorrer de sua curta sentença, já Malcolm Collins recorreu algumas vezes, nunca obtendo sucesso. Foi então que o caso chegou aos ouvidos de Laurence Tribe, assistente de juiz e pós-graduado em matemática. Tribe foi capaz de apontar todos os erros matemáticos de Sinetar dentro de sua acusação.

A primeira ressalva de Tribe foi com relação às premissas de Sinetar: atribuir laços afetivos aos criminosos – que não necessariamente eram um casal – e um penteado específico à suspeita foram as principais. Há também o fato de que foram atribuídos valores arbitrários às probabilidades utilizadas no julgamento. As premissas e números de Sinetar não se baseavam em pesquisa estatística, e por serem vagas demais não pertenceriam à um tribunal de justiça.

O mais grave entre os erros, no entanto, seria a aplicação da regra do produto a tais probabilidades específicas sem verificar a independência dos eventos. Sinetar apontou seis fatores inadequadamente calculados a partir desse erro de aplicação. A partir de novos e mais corretos cálculos, o matemático estimou que a probabilidade de existir outro casal com as mesmas características dos Collins em Los Angeles era de 40%.

Uma vez detectados, os erros de cálculo levaram à anulação da sentença e Malcolm Collins pode retornar à sua esposa, que a esse ponto já havia cumprido toda sua sentença. Laurence Tribe se tornou um dos grandes nomes do direito estadunidense após agregar a matemática na resolução de casos jurídicos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O livro analisa casos aonde a estatística mal utilizada foi responsável por julgamentos errôneos. Com uma narrativa misteriosa, a obra acompanha diversos julgamentos aonde o abuso dos números e da “aura científica” que eles agregam causaram distorções no julgamento final.

No caso escolhido, não foi diferente. Como exposto anteriormente, um casal inter-racial foi acusado de um assalto pelo simples fato de ter características em comum com os assaltantes. Para comprovar sua culpa, foi utilizado pelo promotor a matemática, mas não da forma mais correta possível.

O promotor Ray Sinetar criou uma estratégia genial para a época, mas pecou ao usar números fantasiosos em sua acusação. Ele havia criado uma sequência de probabilidades falsas, que se baseavam em suas opiniões pessoais e até mesmo preconceitos – o caso ocorreu nos anos 60 e casamentos inter-raciais nos Estados Unidos ainda eram vistos como um grande tabu.

O preconceito rodeia o caso como um todo e pode se ver presente em vários momentos da narrativa. Quando Janet quase confessa um crime que não cometeu, por exemplo, ela havia aceitado que estava fadada a passar por aquela situação pela sua condição social: era uma

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