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A EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL

Por:   •  22/6/2018  •  6.229 Palavras (25 Páginas)  •  308 Visualizações

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O uso de animais para finalidades de ensino diverge do uso em pesquisas, no sentido de que este primeiro tem por finalidade a ilustração ou execução de procedimentos, fenômenos ou habilidades já previamente sabidas, ao passo em que na pesquisa objetiva-se a busca de novos conhecimentos ou habilidades, até então – supostamente – desconhecidas (SMITH, 1992).

As instituições de ensino superior e os laboratórios de pesquisas científicas, não raramente, estão no cerne de discussões sobre os procedimentos que envolvem o uso de animais e a ausência de tratamento ético dispensado a estes seres vivos enquanto parte de experimentos.

Apesar da vasta legislação referente aos direitos dos animais no Brasil, a propósito do disposto na Carta Maior, onde restou proibida qualquer prática cruel contra animais, tais dispositivos nem sempre foram observados, principalmente pela ausência de efetiva fiscalização, além do descaso dos próprios seres ditos racionais em relação aos animais.

De mais a mais, muitos cientistas de laboratórios continuam defendendo a pratica da vivissecção por acreditarem que esse tipo de experimento seja algo imprescindível para encontrar meios de resguardar a saúde humana, mesmo que tais procedimentos sejam enquadrados nos conceitos mais obscuros do termo crueldade.

Por muito tempo se acreditou – e tal concepção ainda é adotada por muitos “especialistas” - na visão antropocêntrica, estando o homem no papel de detentor do mundo natural e único ser digno de consideração moral. Questões relativas à ausência de alma por parte dos seres não humanos eram levantadas como alicerce para a tradição de se pensar unicamente no bem-estar do homem, ignorando o sofrimento animal.

Diante de tais considerações, este trabalho aborda a questão da experimentação animal, enfocando as pesquisas científicas realizadas em animais e o tratamento jurídico que é dado às mesmas.

A partir desse diagnóstico, discute-se a efetividade da legislação pátria na proteção dos direitos dos animais, buscando responder os seguintes questionamentos: os animais estão realmente amparados pelas leis?

Partindo dessa problemática, o estudo tem como objetivos averiguar a legislação em vigor no tocante à permissão de pesquisas com animais, com enfoque na prática da vivissecção, além de analisar como a Justiça vem se portando diante de tais casos.

Para melhor explanação das ideias, o presente artigo será dividido em duas partes: a primeira parte trará um esboço doutrinário acerca da experimentação animal e da legislação pátria no tratamento e proteção dos animais. Em um segundo momento, será realizado um estudo de caso, passando-se à análise de um caso julgado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região sobre a matéria em pauta.

2 CONSIDERAÇÕES ACERCA DA EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL

A experimentação animal pode ser definida como procedimentos levados a efeito, em animais, com o objetivo de se descobrir princípio ou efeito desconhecido, pesquisar uma hipótese ou até mesmo ilustrar algo já conhecido (PAIXÃO, 2001).

O termo corriqueiramente utilizado, principalmente por defensores dos direitos dos animais, é vivissecção, que significa cortar um corpo vivo, ou seja, simboliza uma operação praticada em animais vivos para estudos de fenômenos fisiológicos. Num conceito mais amplo, tal prática acopla também os animais recém-abatidos, especificamente para propósitos científicos ou didáticos (SILVA, 2009).

A Lei Arouca, que regulamenta o inciso VII do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelecendo procedimentos para o uso científico de animais, define experimentos como “procedimentos efetuados em animais vivos, visando à elucidação de fenômenos fisiológicos ou patológicos, mediante técnicas específicas e preestabelecidas”.

Conforme ensinamento de Milaré (2007), a origem dessa prática se deu na Grécia antiga, através de Hipócrates, em 500 a.C., o qual realizava dissecações com desígnios didáticos. Na sequência histórica, seguiram as práticas de vivissecção os fisiologistas Alcmaeon (550 a.C.), Herophilus (30-250 a.C.) e Erasistratus (350-240 a. C.), sendo que as vivissecções com o intuito experimental viriam a ocorrer apenas em Roma, nos anos 130-200 a. C., através de Galeno[4].

Aristóteles, em seus escritos (384-322 a.C.) distinguia os três princípios da vida em: vegetativa (ou nutritiva), animal (ou sensitiva) e a racional (ou intelectual), havendo um finalismo intrínseco entre toda a natureza, sendo o responsável por criar a “grande cadeia dos seres”.

Em sua obra “A Política”, Aristóteles (1991) afirma que

O animal é como um escravo na sociedade, tendo como única finalidade servir ao homem é um bem útil para alimentação, matéria prima, uso diário, vestuário... Próprio do homem, com respeito aos demais animais é que só ele tem percepção do bem e do mal, do justo e do injusto e de outras qualidades semelhantes.

Seguindo essa esteira histórica, a religião cristã, através dos ensinamentos bíblicos, legitimou a exploração dos demais seres viventes, uma vez que pregava que os animais eram seres inferiores na escala da criação, sendo estes destituídos de alma e com propósito único de servir aos homens.

Como representantes dessa fase, pode-se citar teólogos como São Tomás de Aquino e Santo Agostinho, os quais afirmavam que inexistiam deveres para com os animais, uma vez que eles eram seres destituídos de raciocínio e livre arbítrio, servindo para os propósitos dos seres humanos, de acordo com a ordem natural das coisas (DIAS, 2006).

A base no antropocentrismo, contudo, deu-se no Renascentismo, onde se acreditava na superioridade humana, devendo todas as demais coisas existentes servir ao homem e em seu proveito.

René Descartes (1596-1650), considerado o pai da filosofia moderna, colaborou para eliminar os animais da esfera das preocupações morais humanas. Paixão (2005) colige, nessa toada que

Com a publicação de “Discours de laMéthode” (Discurso do Método) em 1637 (Descartes, 1987), Descartes divulga a idéia de que os animais são verdadeiras máquinas. Assim além de negar a racionalidade dos animais, ele também nega que eles tenham emoções. Atribui aos animais o conceito de autômatos, isto é, seus corpos obedeciam as leis da mecânica.

No entendimento de Descartes, o organismo animal poderia ser comparado aos relógios: de comportamento complexo, mas incapazes de raciocinar ou sentir

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