O sociojurídico e o serviço social
Por: Lidieisa • 15/10/2017 • 4.900 Palavras (20 Páginas) • 381 Visualizações
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Em culturas patrimonialistas, marcadas por relações de autoritarismo e clientelismo, como é o caso da cultura brasileira, essa característica é levada a consequências drásticas. A ‘soberania do Estado’ se converte na ‘soberania das autoridades legalmente constituídas’. Abuso de poder, constantes violações de direitos e uma forte diferenciação hierárquica, de inspiração aristocrática com afirmação de privilégios, marcam as relações dos sujeitos institucionais, entre si e com a sociedade.
Assistentes sociais devem ter clareza que o Direito Positivo, por possuir um caráter de classe, impõe a defesa dos interesses da classe dominante e, portanto, seja no acesso ao complexo aparelho de justiça burguês, e mesmo nos instrumentos de convencimento de seus operadores, a lógica da defesa da classe dominante se faz presente.
Dessa maneira, é que a ‘área’ ou ‘campo’ sociojurídico apresenta, no tempo presente, uma perspectiva singular para a atuação profissional, que percebe o direito como um complexo carregado de contradições. Possibilita, então, a ação em busca de novos sentidos para as relações sociais, na direção da realidade emancipatória e diferente da pura reprodução da ordem estabelecida.
Nessa perspectiva, a dimensão técnico-operativa do serviço social não se confunde com imposições do jurídico e do normativo abstrato. Essa confusão é empiricamente observável no cotidiano do exercício profissional de assistentes sociais. Dessa maneira, não cabe a incorporação, no fazer profissional, de verdades jurídicas, expressas na ‘forma’ da lei. Mas sim as verdades histórico-ontológicas, que revelem, pela totalidade, a realidade determinada socialmente, uma vez que [...] as classes sociais só existem em relação, pela mútua mediação entre elas, a atuação do assistente social é necessariamente polarizada pelos interesses de tais classes, tendendo a ser cooptada por aqueles que têm uma posição dominante. (IAMAMOTO e CARVALHO, 1982:75).
A ‘onda punitiva’, desencadeada pelo neoliberalismo, revela para os/ as assistentes sociais uma forte contradição, a partir do seu pressuposto: para garantir os direitos de uns, é necessário violar direitos de outros. Os princípios teóricos e éticos do serviço social são claros com relação ao posicionamento diante desse pressuposto: direitos humanos devem ser afirmados universalmente. A liberdade a que o Código de Ética se refere não é aquela afirmada pelo liberalismo, pautada no individualismo, mas a que afirma a emancipação dos indivíduos sociais. Em outras palavras: a liberdade só pode existir em sua plenitude quando, socialmente, todos os indivíduos forem livres. Cabe aos/às assistentes sociais, detentores de um poder profissional conferido pelo saber teórico-prático, questionar a axiologia da lei, sua relação de classe e mais, os complexos que a determinam, que remetem o/a profissional a armadilhas singulares. O posicionamento técnico tem a potência de influir na tomada de decisão pelas figuras de autoridade, nesse contexto “nosso papel não é o de ‘decidir’, mas o de criar conhecimentos desalienantes sobre a realidade, a ser analisada para se deliberar sobre a vida das pessoas” (BORGIANNI, 2012, p. 64), com as quais estabelecemos compromissos éticos e políticos.
O estudo social é, historicamente, a maior demanda de atribuição ao/à assistente social no sociojurídico. Diversas são as concepções sobre o tema ‘estudo social’ encontradas na literatura, desde o entendimento do que é o documento em si, no qual o/a assistente social apresenta uma determinada situação social, em vista da garantia de direitos dos sujeitos envolvidos, até o entendimento mais abrangente proposto por Mioto (2001): O estudo social é o instrumento utilizado para conhecer e analisar a situação, vivida por determinados sujeitos ou grupo de sujeitos sociais, sobre a qual fomos chamados a opinar. Na verdade, ele consiste numa utilização articulada de vários outros instrumentos que nos permitem a abordagem dos sujeitos envolvidos na situação. (MIOTO, 2001, p. 153).
A tendência hoje posta à judicialização da vida e à criminalização dos pobres, fazendo necessariamente o uso da impositividade do Estado para o controle sobre a vida da população que acessa os serviços públicos, requer, por vezes, fundamentação técnica e pericial. Nesse sentido, os/as assistentes sociais são frequentemente acionados a realizarem estudo social a partir de objetivos postos pelas instituições, que tendem a produzir novas violações de direitos. Essas requisições se manifestam de diversas formas.
Conforme sinaliza Borgianni (2013), ao trazer para si as práticas institucionais sem questionamentos, os/as assistentes sociais passam a não se verem, eles mesmos, como trabalhadores, e não participam dos movimentos próprios da classe trabalhadora, de seus sindicatos, de suas entidades representativas, de seus fóruns de debates.
Os documentos produzidos pelos/as assistentes sociais nas instituições, frutos de estudo social, podem e devem servir também como uma forma de garantir direitos à população. Se o/a profissional, quando da realização do estudo social, identificar as expressões da questão social, sejam elas materiais, culturais, ideológicas, que permeiam a situação apresentada, e as referenciar nos laudos, pareceres, relatórios sociais apresentados, sobretudo no seu parecer, indicando alternativas que envolvam não apenas o indivíduo e a família, esse trabalho, ainda que institucional, possibilita o enfrentamento da questão social posta.
Construir novas perspectivas para as instituições da área ou do campo ‘sociojurídico’ só será possível, se o/a assistente social participar de debates e lutas com outros atores, dentro e fora dessas instituições.
No tocante às atribuições do serviço social no Judiciário, os dados do levantamento realizado pelo Conjunto CFESS-CRESS apontam as seguintes:
a) Perícia e acompanhamento • estudos sociais/perícia social; • atendimento e orientação ao público; • acompanhamento social (pessoas envolvidas em processos); • assessoramento ao/à magistrado/a no atendimento às partes; acompanhamento de crianças acolhidas; • desenvolvimento de atividades junto ao cadastro de adoção; • acompanhamento a visitas de pais a filhos/as, mediante pedido judicial; • preparação para adoção; emissão de pareceres para acessar, judicialmente, serviços do governo federal, como o BPC; • participação em audiências, de modo a emitir opinião técnica.
b) Execução de serviços • atuação com penas e medidas alternativas
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